Título: Confronto antes das urnas
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Fonte: Correio Braziliense, 27/11/2011, Mundo, p. 25

Morte de jovem manifestante deixa clima no Egito mais tenso a 48 horas das eleições parlamentares

Criança agita bandeira em meio a multidão na Praça Tahrir: para manifestantes, militares querem perpetuar política do ex-ditador Mubarak

A apenas 48 horas das primeiras eleições desde que o ditador Hosni Mubarak renunciou ao poder, o clima no Egito ficou ainda mais tenso. Um dia depois de o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, incitar o governo militar egípcio a garantir uma "transição pacífica" e declarar-se preocupado com a violência que toma conta do país nos últimos dias, um manifestante foi morto na manhã de ontem em confrontos com a polícia na capital Cairo.

O jovem de 19 anos fazia parte do grupo que passou a noite de sexta-feira acampado em frente à sede do governo, para protestar contra a nomeação do novo primeiro-ministro escolhido pelo Exército, Kamal al-Ganzuri. Na ocasião, a polícia antimotins atacava os revoltosos com bombas de gás lacrimogêneo, enquanto os manifestantes contra-atacavam com pedras e coquetéis molotov. A morte do manifestante pode representar um aumento na violência durante a votação. De acordo com testemunhas, a vítima foi atropelada por um veículo das próprias forças armadas e faleceu "devido a uma hemorragia provocada por múltiplas fraturas na pelve, provavelmente ocasionadas por um contato com um veículo pesado", segundo uma fonte médica ouvida pela agência de notícias France-Presse.

Os confrontos entre manifestantes e governo contabilizaram 41 mortos em apenas cinco dias. Porém, havia dois dias que nenhum civil morria na capital devido às manifestações. Enquanto isso, os preparativos para as eleições continuam: o governo egípcio anunciou que mais de 100 mil cidadãos que vivem no exterior — e, por isso, não tinham direito a votar durante o regime de Mubarak — já votaram nas eleições legislativas. Segundo o governo, cerca de 40 milhões de eleitores foram convocados a votar amanhã para eleger 498 membros da Assembleia Popular (câmara de deputados). Os 10 restantes serão escolhidos pelo marechal Hussein Tantawi, chefe do Conselho Supremo das Forças Armadas (CSFA) e atual presidente.

A chefe da diplomacia da União Europeia, Catherine Ashton, pediu o fim da violência por meio de um comunicado. Segundo o documento, "a violência deve cessar e o Estado de Direito deve ser mantido". Ela pediu que fosse feita uma "investigação independente" à respeito dos atos de violência e incitou as autoridades "a cumprirem a promessa de pôr fim aos processos militares para os civis".

Salvação nacional Segundo informações da agência oficial de notícias Mena, o marechal Hussein Tantawi se encontrou ontem com dois políticos apontados como favoritos pelos manifestantes pró-democracia para dirigir um governo de "salvação nacional": o ex-diretor da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) Mohammed ElBaradei e o ex-secretário-geral da Liga Árabe Amr Moussa.

Por conta dos confrontos constantes entre a polícia e manifestantes, na terça-feira, ElBaradei denunciou o que chamou de "massacre na Praça Tahir" — que continua ocupada por milhares de outros revoltos. Eles exigem a saída do CSFA, que assumiu o controle do país desde a queda de Mubarak. Para os revoltosos, a situação atual representa a perpetuação da política de repressão do ex-presidente que comandou o país à mão-de-ferro por 30 anos.

Na última sexta-feira, o CSFA nomeou Kamal al-Ganzuri, 78 anos, para ocupar o cargo de primeiro-ministro deixado por Essam Sharaf — que renunciou diante da pressão popular. Alheio aos protestos, Ganzuri espera formar seu governo "antes do fim da próxima semana" e fez um chamado para entregar pastas ministeriais a jovens.

Em resposta, jovens anti-militares anunciaram uma lista própria de nomes para o governo, propondo que ElBaradei tome a frente do governo. Na praça Tahrir, ElBaradei foi aclamado pela multidão — que diariamente se reúne para pedir a saída do marechal Tantawi. Contudo, nem todos os egípcios são contrários à atual situação: muitos pedem o retorno à estabilidade e à reativação da economia, parada desde o início do ano.

» Eleições antecipadas O governo do Iêmen convocou eleições presidenciais antecipadas para 21 de fevereiro de 2012, em aplicação do acordo que prevê a saída do presidente Ali Abdullah Saleh, segundo um decreto publicado ontem. O decreto foi assinado pelo vice-presidente Abd Rabo Mansur Hadi, a quem Saleh deve transferir o poder durante um período interino, também segundo o acordo. A eleição presidencial estava prevista inicialmente para 2013.