O Estado de São Paulo, n. 44986, 17/12/2016. Política, p. A4

CERVEJARIA PAGOU POLÍTICOS, DIZ DELAÇÃO DA ODEBRECHT

Lava Jato. Ex-executivos da empreiteira afirmam que repassaram R$ 100 milhões do ‘departamento da propina’ para conta do Grupo Petrópolis em banco no exterior
Por: Beatriz Bulla / Fabio Serapião

 

Beatriz Bulla

Fabio Serapião / BRASÍLIA

 

Ex-executivos da Odebrecht afirmam no acordo de colaboração premiada com a Procuradoria-Geral da República que utilizaram empresas dos donos do Grupo Petrópolis, fabricante da cerveja Itaipava, para distribuir dinheiro a políticos por meio de doações eleitorais e entregas de dinheiro vivo. Segundo os delatores, os repasses para contas da cervejaria saíram do Setor de Operações Estruturadas, o chamado departamento da propina, e somaram cerca de R$ 100 milhões.

Durante as investigações, a Operação Lava Jato já havia identificado que executivos ligados à Odebrecht e ao Grupo Petrópolis eram sócios no banco Meinl Bank Antígua, utilizado pela empreiteira para operar contas no exterior usadas para pagar propina.

A existência do banco e a sociedade com Vanuê Faria, sobrinho do controlador do grupo, Walter Faria, foi revelada pelo Estado em junho deste ano.

Entre os que participaram das negociações e entregaram informações sobre o esquema estão Benedicto Júnior, o BJ, ex-presidente da Odebrecht Infraestrutura e Luiz Eduardo Soares, o Luizinho, funcionário do Setor de Operações Estruturadas.

Durante as negociações, Luizinho prometeu contar como a Odebrecht injetou os R$ 100 milhões em uma conta operada pelo contador do Grupo Petrópolis em Antígua, além de construir fábricas para a cervejaria.

A contrapartida do grupo era fornecer dinheiro no Brasil que seria repassado a campanhas eleitorais e pagamento de propina para agentes públicos.

No caso das doações, depois de compensada com pagamentos no exterior, o Grupo Petrópolis utilizava algumas de suas empresas para efetuar os repasses para campanha de políticos por ordem da Odebrecht. Ao menos duas empresas, segundo Luizinho, a Praiamar e a Leyros Caxias, teriam sido utilizadas para escoar o dinheiro do departamento de propina para campanhas nas eleições de 2010 e 2012.

 

Planilhas. Os delatores prometeram entregar aos investigadores planilhas das contribuições feitas pelo Grupo Petrópolis e os documentos relacionados ao controle da movimentação entre as contas das empresas. Segundo informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 2010 a Leyroz doou cerca de R$ 4,3 milhões para políticos do PT, PMDB, PP, PSDB, PV, DEM, PTC, PSB, PSDC e PSOL. Nas eleições de 2012, a empresa repassou outros R$ 560 mil para candidatos do PSB e PMDB. Por sua vez, a Praiamar, em 2010, doou R$ 1,1 milhão para os mesmos partidos destinatários dos valores da Leyroz. Em 2012, foram mais R$ 1,5 milhão para PSB, PMDB, PPS e PCdoB.

Entre os políticos que receberam doações por ordem da Odebrecht estão alguns que já apareceram em outras delações, como Aécio Neves (PSDB-MG), que recebeu R$ 120 mil em 2010, Ciro Nogueira (PP-PI), com R$ 200 mil, o tucano Arthur Virgílio (R$ 100 mil), o deputado do PSB do Piauí, Heráclito Fortes (R$ 100 mil), o tucano Jutahy Magalhães (30 mil).

Para os pagamentos em espécie, segundo Luizinho, a Odebrecht acionava o operador Álvaro José Novis, alvo da Lava Jato, para distribuir o dinheiro fornecido pelo Grupo Petrópolis.

Os investigadores já haviam encontrado indícios da relação entre o Grupo Petrópolis e a Odebrecht na 23ª fase de 279 políticos de 22 partidos. Com Benedicto Júnior, a Polícia Federal apreendeu uma planilha na qual “Itaipava” está anotada à mão ao lado de um repasse de R$ 500 mil para Luís Fernando Pezão (PMDB), atual governador do Rio de Janeiro. Essa mesma doação para Pezão está relacionada, no topo da coluna dos valores, a “Parceito IT”.

Há ainda na planilha doações registradas para a campanha eleitoral de 2012. O total chega a R$ 5,8 milhões. Em outro quadro, sem data definida, o “parceiro” aparece como responsável por doações de R$ 30 milhões a 13 partidos, entre eles PT, PMDB e PSDB.

 

Defesa. Políticos que receberam doações de empresas do Grupo Petrópolis e já foram citados em propostas de delação da Odebrecht informaram que o dinheiro foi registrado perante a Justiça Eleitoral. Virgílio e Magalhães confirmaram que doações da Praiamar foram colaborações da Odebrecht para as campanhas eleitorais. A assessoria de Aécio também afirma que as doações feitas à campanha eleitoral ocorreram na forma legal e estão demonstradas nos documentos públicos registrados pelo PSDB junto ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG), em 2010.

O criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que defende Nogueira, afirmou que não irá se manifestar sobre as delações pois “tem certeza que os acordos serão anulados em razão de ilegalidades”. Procurado, Heráclito não respondeu até a conclusão desta edição.

Por meio de sua assessoria, o Grupo Petrópolis disse “desconhecer as informações da suposta delação, que não tem amparo na realidade”. Afirma também que Vanuê Faria não é membro do Grupo.

A Odebrecht, por meio de nota, informou que “não se manifesta sobre o tema, mas reafirma seu compromisso de colaborar com a Justiça”. “A empresa está implantando as melhores práticas de compliance, baseadas na ética, transparência e integridade.”

 

INVESTIGAÇÃO

 

● Odebrecht usou empresas do Grupo Petrópolis para doações e distribuição de valores em espécie a políticos, segundo delação

 

Odebrecht

Dinheiro saiu do Setor de Operações Estruturadas da empreiteira, apontado como “departamento de propina”

 

Repassou

R$ 100 milhões para...

 

Grupo Petrópolis

Dinheiro foi transferido para conta Legacy, operada pelo contador do grupo no Antígua Overseas Bank

 

Doações oficiais

 

Praiamar Leyros Caxias

Empresas do grupo Petrópolis usadas para escoar o dinheiro do “departamento de propina”a políticos

 

Entrega de dinheiro em espécie

Odebrecht acionava o operador Álvaro José Galliez Novis para distribuir o dinheiro fornecido pelo

Grupo Petrópolis

 

Políticos

Segundo delatores da empreiteira, destino de parte do dinheiro foram campanhas das eleições de 2010 e 2012