Caixa 2 leva à cassação, diz procurador

Rafael Moraes Moura

21/12/2016

 

 

Para Nicolao Dino, irregularidade tem ‘relação íntima’ com abuso de poder econômico; fala se contrapõe a avaliação do presidente do TSE

 

Responsável por agir em nome do Ministério Público no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, disse ontem que o caixa 2 é uma irregularidade que tem “relação íntima” com abuso de poder econômico e eventualmente pode levar à cassação de registro ou diploma de candidatos.

“Não há dúvidas de que o caixa 2 tem uma relação íntima com abuso de poder econômico”, afirmou. A declaração de Dino vai em sentido contrário à avaliação do presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes.

Anteontem, Gilmar afirmou que o caixa 2 não significa corrupção ou propina a priori.

Para o presidente do TSE, é preciso saber a origem do dinheiro.

“O caixa 2 não revela per se (em si mesmo) a corrupção, então temos de tomar todo esse cuidado”, disse Gilmar.

Conforme revelou o Estado na edição de anteontem, a chapa da presidente cassada Dilma Rousseff e do presidente Michel Temer recebeu dinheiro de caixa 2 da Odebrecht na campanha de 2014, segundo delação da empreiteira à força-tarefa da Lava Jato. Em pelo menos um depoimento, a Odebrecht informa que fez doação ilegal.

“O caixa 2 tem efeito muito lesivo, porque faz com que a disputa seja determinada por um fator monetário. Aquele que investe mais, gasta mais, tende a ter mais sucesso, o que é uma equação ruim para a democracia em termos de legitimação.

Você cria regimes plutocráticos”, disse o vice-procurador-geral eleitoral, evitando prejulgamento sobre o processo que pode levar à cassação da chapa Dilma-Temer no TSE.

Para ele, “o abuso de poder econômico ou político, inclusive mediante caixa 2, em tese pode, sim, levar à cassação de registros, de diplomas”.

 

Apuração. Dino pediu para a Procuradoria da República no Distrito Federal analisar se o empreiteiro Otávio Marques de Azevedo, ex-presidente da Andrade Gutierrez, cometeu crime de falso testemunho ao apresentar versões divergentes em depoimentos prestados ao TSE. Conforme o Código Penal, a pena prevista para o crime é de 2 a 4 anos de prisão e multa.

Em novembro, Azevedo negou que a campanha à reeleição de Dilma e Temer tivesse recebido da empreiteira dinheiro de propina. O executivo apresentou uma nova versão e afirmou que a contribuição de R$ 1 milhão feita ao diretório do PMDB foi voluntária, sem nenhuma origem irregular. Azevedo prestou um segundo depoimento depois de ser confrontado com documentos que contradiziam o seu depoimento anterior, feito em setembro.

Procurada pela reportagem, a defesa de Azevedo informou que já prestou todos os esclarecimentos necessários ao TSE e negou que o executivo tenha praticado falso testemunho.

O vice-procurador-geral eleitoral também pediu que a Procuradoria- Geral da República (PGR) analise em que medida houve contradição nas versões apresentadas por Azevedo ao TSE e aquela que ele disse no acordo de delação. “O acordo de colaboração premiada tem várias implicações. Uma delas é dizer a verdade, colaborar com a Justiça. Se houver algum tipo de comprometimento, quebra de compromisso, ele perde os benefícios”, disse Dino.

 

Abuso

“O abuso de poder econômico ou político, inclusive mediante caixa 2, em tese pode, sim, levar à cassação de registros, de diplomas.”

Nicolao Dino

VICE-PROCURADOR-GERAL ELEITORAL

 

Café

O presidente Michel Temer fará amanhã um balanço dos seis meses de sua gestão em café da manhã com a imprensa. Um pronunciamento em cadeia de rádio e TV ainda está em estudo.

 

PONTOS-CHAVE

Contas da  chapa sob suspeita

Odebrecht

Em pelo menos uma delação foi dito que a Odebrecht fez uma doação ilegal de cerca de R$ 30 milhões paga no Brasil para a chapa que reelegeu Dilma e Temer.

 

Laudo

Laudo da força-tarefa da PF, Receita e Coaf, criada a pedido do TSE, aponta indícios de “desvio de finalidade” dos recursos da chapa Dilma-Temer.

 

Despesas

Temer teve despesas de transporte aéreo pagas pela campanha de Dilma durante as eleições de 2014, segundo prestação de contas enviada ao TSE.

 

 

O Estado de São Paulo, n. 44990, 21/12/2016. Política, p. A6.