Começa sepultamento das vítimas da rebelião

05/01/2017

 

 

VIOLÊNCIA » Dos 56 presos assassinados, em Manaus, no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) e outros quatro na unidade de Puraquequara, 39 foram identificados pelo IML, que liberou 14 corpos para as famílias enterrarem seus mortos

 

Os sepultamentos das vítimas do massacre no Complexo Penitenciário Anísio Jobim (Compaj) começaram na manhã de ontem. Sob uma leve chuva, as cerimônias de seis detentos que tiveram os corpos liberados foram realizadas no Cemitério Nossa Senhora Aparecida, no bairro Tarumã, zona oeste da capital amazonense.

O Instituto Médico Legal (IML) liberou 14 corpos para a retirada pelas famílias e outros 39 já haviam sido identificados. No total, 56 presos foram assassinados no Compaj entre o domingo, 1º, e a segunda-feira, 2, e outros quatro na unidade de Puraquequara, também em Manaus.

Entre os sepultados nesta quarta, estavam Magaiwer Vieira Rodrigues, Paulo Henrique dos Santos Lagos e Arthur Gomes Peres Junior. Familiares e amigos se despediram silenciosamente dos entes em cerimônias que não demoraram mais que 30 minutos e deixaram o cemitério sem contato com a imprensa.

De acordo com o diretor do Departamento de Polícia Técnico-científica Jefferson Mendes, 30 dos 39 identificados até o momento sofreram decapitação. Algumas vítimas também foram esquartejadas e outras carbonizadas. Ele informou ainda que os procedimentos de identificação mais complicados deverão ser das vítimas que foram carbonizadas durante a rebelião. "Nossos peritos são preparados para atuar nesse tipo de ação. Mesmo assim é algo chocante, porque nunca viram a forma como se apresentam os corpos agora", disse.

No total, 38 peritos se revezam no serviço de necropsia e liberação dos cadáveres. Mendes disse não ter encontrado até o momento marcas de tiros nas vítimas. Imagens gravadas pelos próprios detentos rivais, no momento do ataque, mostram um grupo portando armas de fogo.

O que ajuda a explicar a demora no trabalho, contaram os peritos, é que nenhuma vítima foi poupada de perder alguma parte do corpo. Os relativamente menos afetados perderam um membro; os mais, foram esquartejados, com os órgãos retirados e acabaram carbonizados. Na cidade, as imagens sangrentas se espalharam pelos celulares com rapidez e dominaram as conversas cotidianas.

Segundo o diretor, o primeiro passo tomado pela perícia foi a tentativa de identificação por impressão digital, tendo seguido para arcada dentária. Nas vítimas carbonizadas, ele não descartou o uso de exames de DNA para conseguir liberar o corpo. Essa etapa pode durar de quatro dias a um mês, dependendo da qualidade do material coletado, explicou.

A rebelião que resultou nas mortes foi atribuída a uma ação do grupo Família do Norte (FDN), ligado ao Comando Vermelho (CV), do Rio de Janeiro, contra membros do Primeiro Comando da Capital (PCC), com liderança em São Paulo.

Na terça-feira, o ministro da Justiça e Cidadania, Alexandre de Moraes, afirmou, em entrevista à Rádio Estadão, que "dos 56 mortos no massacre, menos da metade tinha ligação com alguma facção ou organização criminosa".

Os ataques, que duraram 15 horas, resultaram na maior matança em prisões do país, após o Massacre do Carandiru, que deixou 111 mortos em 1992. Relatório produzido pelo Ministério da Justiça, por meio do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), já apontava, em dezembro de 2015, que os presos se "autogovernam" nos presídios amazonenses e que a ação da administração penitenciária no Estado é "bastante limitada e "omissa diante da atuação de facções criminosas". O documento menciona forte disputa entre facções.

 

Conflitos em dois presídios

Na Paraíba, dois presos morreram e outros dois ficaram feridos após briga durante o banho de sol no presídio de Patos, distante 300 km de João Pessoa. O secretário de Administração Penitenciária da Paraíba, Wagner Dorta, descartou uma rebelião na penitenciária. A arma usada na briga pode ter sido roubada dos agentes penitenciários. Uma operação pente-fino foi realizada ontem dentro do presídio para apreender celulares e armas. "Descartamos uma rebelião e ligação com facções de outros estados,  como em Manaus. Foi um caso pontual e não tem relação com conflitos externos. Abrimos investigação para apurar a procedência da arma, se foi roubada  mesmo de um dos agentes”, disse o secretário. Já em Mato Grosso do Sul, um drone possivelmente levando armas pousou no pátio da Penitenciária Estadual de Dourados, em Mato Grosso do Sul, e causou um motim entre os presos, na terça-feira. Temendo um possível ataque do Primeiro Comando da Capital (PCC), dezenas de presos do pavilhão 1, onde ficam aliados do Comando Vermelho (CV), quebraram as grades de 60 celas e se reuniram no pátio da penitenciária. O pavilhão 2, para onde teria sido levada a carga do drone, abriga filiados ao PCC.

 

 

Correio braziliense, n. 19582, 05/01/2017. Brasil, p. 6.