PF expõe ligações entre Geddel e Cunha

Antonio Temóteo, Denise Rothenburg e Julia Chaib

14/01/2017

 

 

Operação da Polícia Federal apura a participação do ex-ministro em esquema de propina na Caixa Econômica Federal. Tucanos pressionam para trocar toda a equipe da Secretaria de Governo, que era ocupada pelo peemedebista até deixar a Esplanada

 

Menos de 72 horas depois de o presidente do PSDB, Aécio Neves, ter praticamente acertado com o presidente Michel Temer que pouca coisa mudaria com o ingresso do partido na Secretaria de Governo, a investigação que expõe o ex-ministro Geddel Vieira Lima como suspeito de integrar um esquema de propina na Caixa Econômica Federal chega para obrigar uma revisão desse pedaço da conversa. Parlamentares tucanos pressionam para uma mudança total na equipe do ex-ministro. Atualmente, todos os servidores continuam trabalhando diuturnamente nas mesmas funções que ocupavam antes da saída de Geddel, em 25 de novembro do ano passado.

São os funcionários indicados por Geddel que fazem o acompanhamento da liberação de emendas, ocupação de cargos na Esplanada e, ainda, votações de interesse do Poder Executivo. Quando surge um problema que não se sentem seguros em resolver, eles procuram o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, que hoje, na prática, responde pelas duas pastas.

O PMDB resiste em entregar esses cargos. Não queriam sequer deixar a Secretaria de Governo com o PSDB. Mas, os tucanos pediram e Temer, disposto a não perder votos no Congresso nem brigar com a base, prometeu o lugar para o aliado. A promessa foi feita no ano passado, assim que a permanência de Geddel ficou insustentável.

Ontem, no Planalto, a sensação era de alívio pelo fato de Geddel estar fora do Planalto nesse momento. Porém, para o público interno, há uma impressão de que o cargo dele não está vago, uma vez que o ex-ministro ainda tem certa influência. A partir de fevereiro, quando Antonio Imbassahy tomar posse, esse poder será reduzido, uma vez que não se sabe o que virá nas delações em série que saem do forno da Lava-Jato e seus desdobramentos, caso da Operação Cui Bono (que significa a quem beneficia?), de ontem, que teve Geddel como alvo.

Essa operação é um desdobramento da Operação Catilinárias, deflagrada em dezembro de 2015. Os alvos naquela época foram o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e o empresário Lucio Funaro, suposto operador do parlamentar. Os investigadores encontraram na casa de Cunha no Rio de Janeiro (RJ) um aparelho celular, modelo Blackberry. No aparelho, havia diversas mensagens trocadas com Geddel, que à época era vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal, no governo Dilma.

O ex-ministro da Secretaria de Governo, Cunha, Fábio Cleto, ex-vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias, e Marcos Roberto Vasconcelos, ex-vice-presidente de Gestão de Ativos de Terceiros da Caixa, segundo o Ministério Público e a Polícia Federal, são suspeitos de oferecer vantagens a diversas empresas para liberação de financiamentos do banco público em troca de propina.

Inicialmente, as investigações seguiram mediante autorização do Supremo Tribunal Federal (STF), porque Geddel era ministro e tinha foro privilegiado. Com a demissão, após envolvimento em um caso de tráfico de influência para liberar a construção de um prédio em Salvador no qual tinha um apartamento, o processo foi remetido à 10ª Vara Federal, para o juiz Vallisney de Souza Oliveira.

Modus operandi

Foi o magistrado que autorizou as buscas e apreensões em dois endereços de Geddel em Salvador (BA), na casa de Vasconcelos em Maringá (PR), no apartamento do empregado da Caixa José Henrique Marques da Cruz em Brasília (DF), suposto integrante do esquema, e na sede do banco público no Distrito Federal. Além disso, a residência do presidente do conselho de administração da Mafrig, Marcos Antonio Molina dos Santos, em São Paulo (SP), foi alvo de buscas porque a companhia seria uma das beneficiárias dos recursos em troca de propina.

O juiz determinou ainda a quebra do sigilo fiscal, bancário, telefônico e postal dos envolvidos. Conforme a PF e o MPF, o grupo é uma “organização criminosa” que usava de suas posições na instituição financeira e no parlamento para oferecer vantagens indevidas a empresários e companhias interessadas em financiamentos da Caixa. Os investigadores detalharam que as empresas envolvidas repassavam parte dos recursos liberados para Lucio Funaro, operador de Cunha, que distribuía os valores aos envolvidos no esquema. O procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes, responsável pelo caso, suspeita que o PMDB, partido de Cunha e Geddel, também pode ter se beneficiado dos recursos ilícitos. Isso porque, numa das mensagens trocadas entre Cunha e Funaro, o operador escreveu: “Jf Geddel creditando hoje. Esse cara acha que tenho uma impressora”. A polícia suspeita que seja uma reclamação de Funaro sobre Geddel em relação à holding J&F.

Além da holding J&F, da família Batista que controla a JBS, estão entre as empresas citadas o Grupo Constantino, que é sócio das BR Vias e da Oeste Sul Empreendimentos Imobiliários. São investigadas ainda a Big Frango, a Digibrás Indústrias do Brasil, a empresa do setor elétrico Inepar, o grupo Bertin.

Quem também aparece nas mensagens descobertas pelos investigadores é o presidente do Partido Social Cristão (PSC), pastor Everaldo. Ele teria pedido a Cunha liberação de recurso para um de seus sócios e para o partido. O vereador Rodrigo Drable da Costa (PMDB-RJ) e o ex-prefeito de Barra Mansa (RJ) José Renato Bruno Carvalho surgem em trocas de mensagem com Cunha solicitando liberação de recursos.

Em nota, o PSC informou não ter recebido nenhuma informação sobre a Operação Cui Bono. O advogado de Geddel, Gamil Föppel, classificou a operação da PF e do MPF como “malfadada”, que seria decorrente de ações e meras suposições não comprovadas. Föppel ainda comentou que não há qualquer fato ou elemento que possa representar corrupção ou lavagem de dinheiro, porque tais atos jamais teriam sido praticados pelo ex-ministro.

A estrutura

Confira a composição da Secretaria de Governo, praticamente inalterada desde que o ex-ministro Geddel Vieira
Lima saiu no fim de novembro. O Planalto quer manter os nomes da pasta, mas o PSDB deve demandá-los

» Chefe de Gabinete
Carlos Henrique Menezes Sobral

» Secretaria-executiva
Ivani dos Santos

» Secretaria Nacional 
de Articulação Social
Henrique Villa da Costa Ferreira

» Subchefia de Assuntos Parlamentares
Mariangela Fialek
» Subchefia de Assuntos Federativos
Vago (Leonardo Américo, homem de confiança 
de Geddel, pediu demissão em novembro, 
após ser citado em operação da PF)

» Secretaria de Administração
Antonio Carlos Paiva Futuro

» Secretaria de Controle Interno
Edson Leonardo Sá Teles
» Escritório Especial em Altamira
Elizângela Trzeciak

» Secretaria Especial de Micro 
e Pequenas Empresas
José Ricardo de Freitas Martins da Veiga

» Secretaria Nacional de Juventude
Francisco de Assis Costa Filho (entrou 
no lugar de Bruno Júlio, exonerado no 
início da semana, após declarações polêmicas 
sobre as tragédias nos presídios)

 

 

Correio braziliense, n. 19591, 14/01/2017. Brasil, p. 2.