O Estado de São Paulo, n. 45031, 31/01/2017. Política, p. A5

Como estabelecer os limites da transparência?
 

 

Fabiano Angélico

 

Em termos de transparência, a publicidade deve ser a regra, enquanto o sigilo deve ser a exceção. Esse princípio, consagrado internacionalmente, embute uma dificuldade prática: como estabelecer os limites da transparência? Até que ponto e em que situações concretas a restrição ao acesso à informação é mais benéfico do que deletério para o conjunto da sociedade? Nenhuma legislação no mundo consegue especificar os limites da transparência de maneira precisa. O que se busca, de forma a contornar essa dificuldade, é o estabelecimento de procedimentos ex post, deflagrados a partir de demandas por acesso a informações específicas. Alguns países, por exemplo, criaram “provas de dano e de interesse público” em suas leis de acesso à informação, de modo a estabelecer procedimentos para avaliações a partir de casos concretos.

É sob esse prisma que deve ser analisado o estabelecimento de sigilos referentes a dois casos de enorme repercussão e impacto, que desperta interesse tanto no Brasil como no exterior: as investigações do acidente que levou ao súbito desaparecimento de Teori Zavascki e os depoimentos que compõem o acordo de delação premiada de executivos da Odebrecht.

Em tese, informações relativas a investigações em andamento devem ser mantidas em sigilo. Para se obedecer ao princípio da máxima publicidade, porém, é preciso analisar a gigantesca demanda por acesso a informações em relação a esses dois casos específicos e o legítimo interesse público em torno deles – interesse, aliás, que está alinhado com a atuação dos profissionais do Estado que trabalham de maneira íntegra: salvaguardar as investigações, para garantir que elas tenham um desfecho favorável ao bem comum.

Assim, é razoável considerar mecanismos que ao mesmo tempo protejam a investigação e promovam a segurança de que os fatos estão sendo devidamente apurados. Nessa linha pode-se cogitar ao menos três propostas: a divulgação, na íntegra, de documentos relevantes, com o cuidado de se proteger informações sensíveis (com tarjas pretas, por exemplo); criação de uma dinâmica em que haja relatórios parciais com divulgação periódica (cuja periodicidade seja prédefinida), de modo que qualquer pessoa possa acompanhar de perto os desdobramentos das investigações; e a criação de uma comissão independente, que poderá acompanhar as investigações e fazer relatos públicos a respeito do andamento delas.

Há diversas evidências que há interesses poderosos buscando frear a Operação Lava Jato. Num contexto em que o valor da informação é altíssimo, o sigilo absoluto, além de proteger aqueles que querem sabotar investigações, pode levar a vazamentos seletivos, estimulando rumores e fortalecendo teorias da conspiração. A transparência poderia ajudar a separa o que é rumor e o que é baseado em fatos e evidências.

O desafio, portanto, é buscar a máxima transparência possível, de modo a garantir o adequado andamento e desfecho das investigações.

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Advogados recebem decisão com alívio

 

Fausto Macedo

 

O criminalista Theo Dias, que coordenou a maior delação premiada da Operação Lava Jato, disse ontem que a decisão da ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), de homologar a delação premiada dos 77 executivos, funcionários e ex-executivos da empreiteira Odebrecht representa um “marco”.

“A decisão do Supremo Tribunal Federal constitui importante marco de um longo e complexo processo de negociação”, disse o advogado, que não quis fazer mais comentários sobre a decisão da presidente do STF.

A homologação da delação da Odebrecht foi recebida com alívio pelos defensores da empreiteira.

Em meio a um clima de apreensão, alguns advogados temiam que a medida não fosse tomada, como ocorreu com outro delator, Léo Pinheiro, da OAS – alegando vazamentos de trechos da colaboração do empresário, o procurador-geral da República Rodrigo Janot suspendeu as negociações da OAS.

A negociação da Odebrecht se prolongou por vários meses, sob forte tensão. No dia 19 de janeiro, o desastre aéreo que matou o ministro Teori Zavascki – relator da Lava Jato no Supremo – em Paraty (RJ) jogou a delação da maior empreiteira do País em um impasse. Até o momento a Corte máxima não definiu quem será o novo relator.

Na semana passada, o procurador- geral da República, Rodrigo Janot, havia pedido à presidente do STF urgência na homologação da delação da Odebrecht.

Ontem, Cármen Lúcia validou o acordo após juízes auxiliares ouvirem, um a um, os 77 delatores.

Todos afirmaram que decidiram colaborar espontaneamente.

 

Substituo. Para outros advogados ouvidos pelo Estado a decisão de Cármen foi equivocada. Eles avaliam que a presidente do Supremo deveria aguardar a escolha do novo relator da Lava Jato no âmbito da Corte e ao substituto de Teori deveria ser submetido o pacote de acordos da Odebrecht. Segundo esses advogados, não havia motivo para “tanta pressa” para a homologação.

“A homologação como foi feita, sem designação de novo relator, é um ato ad hoc, unilateral e pouco democrático”, disse o professor, advogado e cientista político Marcus Vinícius Pessanha./ COLABORARAM FABIO SERAPIÃO e MATEUS COUTINHO

 

Linha sucessória

A presidente do STF, Cármen Lúcia, alterou a pauta de julgamento na primeira sessão do ano. Assim, amanhã, será julgada ação que discute se réus podem fazer parte da linha sucessória da Presidência da República.