O Estado de São Paulo, n. 45031, 31/01/2017. Política, p. A7

Eike volta ao País e se entrega à Polícia Federal

 

Constança Rezende
Mariana Durão
Fernanda Nunes

 

O empresário Eike Batista foi preso na manhã de ontem no Aeroporto Internacional do Rio, após passar cinco dias em Nova York. Ele estava nos EUA quando foi deflagrada a Operação Eficiência, na quinta- feira. No desdobramento da Lava Jato, Eike teve a prisão preventiva decretada, sob suspeita de pagar US$ 16,5 milhões em propina ao ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).

Considerado foragido da Justiça brasileira desde quinta-feira passada, Eike dispensou a sala vip a que tinha direito, por ter comprado passagem na classe executiva, e circulou entre os passageiros. Sem largar o celular, deu entrevistas e conversou com pessoas que o abordaram sobre a economia brasileira e a política americana.

O empresário seguiu em um camburão da Polícia Federal para o presídio Ary Franco, na zona norte do Rio. Posteriormente, foi transferido para Bangu (mais informações na pág. 8).

“Em nenhum momento ele transpareceu estar nervoso ou preocupado. Ou é um excelente ator ou está muito seguro de que não vai acontecer nada”, afirmou o músico e jornalista Mauro Senise, que estava no mesmo voo da American Airlines que o empresário.

No saguão, Eike foi parado para tirar selfies. De um senhor, ouviu elogios pelos investimentos no Brasil. “Mas eu não queria estar na sua pele”, afirmou.

Somente um homem fez um protesto: “E aí? Vai tomar catuaba selvagem com teu colega Cabral?”, disse o passageiro, referindo- se a bebida à base de plantas que promete efeitos afrodisíacos.

Eike riu, constrangido.

No avião, o empresário tomou dois copos de leite e dormiu as nove horas de voo, segundo relatos. Quando o avião pousou no Rio, às 9h54, veio o aviso: “Hoje o comandante tem um pedido especial: por favor, permaneçam sentados por mais alguns minutos”. Um comissário então acompanhou Eike até a saída do avião, onde dois agentes da PF o aguardavam. O ex-bilionário saiu, sob silêncio.

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Antes do voo, empresário fala em colaborar

 

À espera do voo que o traria para o Brasil e para o cárcere, Eike Batista sinalizou, ainda no Aeroporto John Fitzgerald Kennedy, em Nova York, que não pretende ser apenas espectador do processo jurídico e político em que se envolveu. Suas declarações mostraram que o empresário, aparentemente, não descarta seguir o caminho de outros acusados e colaborar com a Justiça.

“Vou mostrar como é que são as coisas. Simples assim”, avisou.

Segundo ele, a Operação Lava Jato está passando o Brasil a limpo “de uma maneira fantástica”.

“Eu digo que o Brasil que está nascendo agora vai ser diferente, tá certo? Porque você vai pedir suas licenças (para obras), vai passar pelos procedimentos normais, transparentes, e se você for melhor você ganhou e acabou a história, né?”, afirmou, em entrevista à TV Globo.

O empresário disse apoiar a Lava Jato, ainda que ela lhe custe a liberdade. “Se foram cometidos erros, você tem que pagar pelos erros que fez. É assim, né?” Mas ao ser questionado se havia cometido erros, respondeu: “Acho que não”. Também negou ter medo de voltar. “Estou à disposição da Justiça, como um brasileiro cumprindo o meu dever. Estou voltando, essa é a minha obrigação.”

 

Relações. O discurso de Eike ganha coerência à luz da teia de relações que o empresário teceu nos anos em que encarnou o personagem “bilionário de sucesso”, sobretudo no segundo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2007-2010) e no primeiro governo Dilma Rousseff (2011-2014). Nesse período, Eike misturou atitudes de empresário arrojado, que fazia investimentos como o Porto do Açu, com posições de benfeitor público, capaz, por exemplo, de doar dinheiro para as Unidades de Polícia Pacificadora (UPP).

Com iniciativas desse gênero, Eike garantiu por algum tempo a imagem de ricaço bem-sucedido, amigo de políticos e símbolo do novo Brasil. Demonstrava especial proximidade do então governador fluminense, Sérgio Cabral (PMDB), mas também de Lula e de Dilma, por meio de atos como o apoio à campanha do Rio para sediar os Jogos Olímpicos.

Nessa empreitada, por exemplo, Eike doou R$ 23 milhões para a campanha brasileira pelos Jogos e emprestou um jatinho para levar Cabral a Copenhague, na Dinamarca, para a reunião do Comitê Olímpico Internacional.

Agradava, assim aos políticos que lhe eram próximos, cujas campanhas também apoiava financeiramente, com doações oficiais.

 

‘À disposição’

“Vou mostrar como é que são as coisas. Simples assim.”

 

“Estou à disposição da Justiça, como um brasileiro cumprindo o meu dever.”

Eike Batista