Investigação nas mãos de Janot

Julia Chaib

31/01/2017

 

 

OPERAÇÃO LAVA-JATO » Suspense sobre o que disseram delatores da Odebrecht continua. Presidente da Corte não permitiu que material fosse divulgado e procurador-Geral da República preferiu não falar sobre as confissões que devem atingir cúpula do PMDB

 

Quase dois meses após a assinatura dos acordos, a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, homologou as delações premiadas de 77 executivos da Odebrecht. Os depoimentos, mantidos sob sigilo, foram remetidos ainda ontem à Procuradoria-Geral da República (PGR), que dará prosseguimento às próximas etapas da investigação.

Cármen participou de reuniões e se debruçou sobre as delações ao longo do último fim de semana. A ministra as homologou na condição de plantonista do recesso do judiciário, antes da escolha do novo relator, o que deverá ocorrer nesta semana. A Lava-Jato estava sob relatoria do ministro Teori Zavascki, que morreu no último dia 19 em acidente aéreo. A intenção do ministro, que trabalhava durante o recesso, era de validar as delações até a primeira quinzena de fevereiro.

A decisão de Cármen ocorreu depois de um pedido encaminhado ao STF pelo procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, na última semana, pedindo urgência nas homologações. Segundo o regimento interno, o presidente pode decidir questões urgentes. Um dos receios, com a morte de Zavascki, era justamente que o processo fosse atrasado. Os trabalhos chegaram a ser suspensos após a morte do ministro, mas, na última semana, Cármen determinou a retomada das atividades.

A etapa anterior à validação foi concluída na sexta-feira, quando a equipe de Zavascki finalizou as audiências com os depoentes para confirmar o teor das delações e para saber se elas foram prestadas por livre e espontânea vontade. Uma vez homologadas, o que foi feito pela ministra Cármen Lúcia, foram encaminhadas à PGR, que determinará o encaminhamento das investigações e poderá pedir abertura de novos inquéritos, diligências e até oferecer denúncias.

Ontem, o procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, reuniu-se com Cármen para buscar pessoalmente os documentos, mas evitou tecer comentários sobre a delação. Janot disse que "não é hora" de falar a respeito. O procurador também não informou se pedirá a quebra do sigilo dos depoimentos. Nesta etapa, a Justiça só pode autorizar o fim do segredo se houver um pedido da PGR.

As delações atingem em cheio a cúpula do PMDB e podem até duplicar o tamanho da Lava-Jato. Ontem, Temer, que é citado nas delações, elogiou a decisão de Cármen. "Acho que a presidente Cármen Lúcia, que até tinha preanunciado sua decisão para hoje ou amanhã, fez o que deveria fazer. E nesse sentido fez corretamente", disse. O presidente ainda disse esperar que não haja vazamentos. Os depoimentos de executivos da Odebrecht incriminam tanto atores principais do governo do PT, quanto do governo do presidente Michel Temer e líderes do PMDB no Congresso.

A condução do processo no Supremo ficará a cargo do próximo relator. Cármen deverá definir até amanhã, quando o Judiciário volta do recesso, a forma que fará a escolha. A tendência é que haja um sorteio na segunda turma, da qual Zavascki fazia parte, para determinar o novo responsável pelo processo. Compõem o colegiado Celso de Mello, Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowiski. Um ministro da primeira turma também pode ser transferido para a segunda. Há a expectativa de que Edson Fachin o faça.

 

Pauta

Ontem, a presidente definiu a pauta de julgamentos da primeira sessão do ano. Cármen retirou os oito processos sob relatoria de Zavascki e incluiu outros. Está prevista a ação que discute se réus podem fazer parte da linha sucessória da presidência da República, cujo julgamento foi interrompido em novembro do ano passado, após pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Até então, seis ministros, inclusive Zavascki, já haviam votado para que réus não façam parte da linha sucessória do presidente da República. Em dezembro, quando o Supremo teve que analisar a liminar de Marco Aurelio, que afastou Renan Calheiros da Presidência do Senado, Celso de Mello antecipou que mudará o voto no julgamento do mérito, para decidir manter a pessoa no cargo e apenas retirá-la da linha sucessória.

 

O futuro da delação bombástica

Após homologação pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, as delações de 77 executivos da Odebrecht foram encaminhadas à Procuradoria-geral da República (PGR). Confira os próximos passos:

 

Procuradores analisam o conteúdo das delações e podem propor:

» abertura de novos inquéritos

» inclusão de informações em inquéritos existentes

» envio de casos sem foro privilegiado para a primeiras instâncias

» oferecer denúncias

» pedir novas diligências: ouvir testemunhas, determinar busca e apreensão, bloquear contas bancárias

» pedir prisão preventiva ou temporária em casos extremos

» pedir arquivamento

 

Sigilo

» Ao validar os depoimentos, a presidente do STF manteve em segredo o teor das delações. Agora, a queda do sigilo, integralmente ou de partes, pode ser determinada pela Justiça a pedido da PGR até que o processo retorne ao Supremo.

 

 

Correio braziliense, n. 19608, 31/01/2017. Política, p. 4.