Fachin move as peças

Julia Chaib e Paulo de Tarso Lyra

01/02/2017

 

 

SUCESSÃO NO STF » Ministro do Supremo se coloca à disposição para mudar da Primeira para a Segunda Turma e, com isso, poder participar de sorteio da relatoria da Lava-Jato

 

 

 

Praticamente duas semanas depois da morte do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki em um acidente aéreo, a Lava-Jato deverá ter, a partir de hoje, um novo relator. A expectativa é de que a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, defina, antes do início da sessão plenária, o nome do magistrado que conduzirá o processo. O assunto será tratado em uma reunião pela manhã. A tendência é que seja feito um sorteio na Segunda Turma, da qual Teori fazia parte. Outros quatro ministros compõem o colegiado e pode haver transferência de um magistrado de outra turma. Ao chegar a Brasília ontem, o ministro Edson Fachin se colocou à disposição para mudar de colegiado.

Segundo nota divulgada pelo gabinete do ministro, Fachin se apresentará para “possível transferência à Segunda Turma, caso não haja manifestação de interesse por parte de integrante mais antigo”. Há uma ordem de preferência para a transferência entre turmas, que respeita a dos mais antigos no colegiado. Os outros componentes devem ser consultados antes da transferência ser autorizada por Cármen Lúcia. Segundo interlocutores do Supremo, a tendência é de que não haja oposição. Nas últimas semanas, há um entendimento sendo construído entre ministros para respaldar a mudança de Fachin.

Nesse caso, o ministro participaria do sorteio na Segunda Turma, a principal tendência, que se baseia no procedimento adotado em 2009 pelo ministro Gilmar Mendes, quando morreu o colega Carlos Menezes Direito. Mendes se valeu do artigo 68 do regimento para redistribuir um processo, segundo o qual deve haver um sorteio dentro da própria turma. Há ainda a possibilidade de a ministra redistribuir o caso entre todos os ministros. A fórmula será acertada na reunião informal entre os magistrados, que ocorrerá pela manhã. Segundo o Supremo, o sorteio é feito de maneira eletrônica e aleatória, por isso, não é possível haver interferência na distribuição se esse for o caminho escolhido.

Há uma outra possibilidade, aventada em alguns gabinetes, que facilitaria um eventual acordo para que Fachin fosse escolhido o relator do processo. Neste caso, uma interpretação do regimento faria de um ministro transferido para a segunda turma o relator da Lava-Jato, porque passaria a ocupar a cadeira de Teori. A possibilidade é polêmica e encontra resistência dentro do próprio Supremo. “Não há essa previsão no regimento”, disse um técnico do STF. Outra situação possível seria ministros se declararem impedidos de relatar o processo, visto como improvável porque, nesse caso, eles também não poderiam julgar qualquer ação referente à Lava-Jato.

O ministro a ser escolhido será o responsável por tocar a investigação sobre o maior escândalo de corrupção do país no Supremo. Caberá ao sucessor de Teori dar o ritmo às investigações no Ministério Público. Na condição de plantonista durante o recesso do Judiciário, a ministra Cármen Lúcia homologou na segunda-feira as delações premiadas de 77 executivos da Odebrecht. Os depoimentos foram encaminhados à Procuradoria-Geral da República (PGR), que pedirá abertura de novos inquéritos, inclusão de informações em investigações já existentes, encaminhamento de casos a outras instâncias e propor denúncias, O processo está sob sigilo, que pode ser quebrado a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

 

Delações

O presidente Michel Temer decidiu que só indicará o novo ministro do Supremo somente após a definição do relator da Lava-Jato, para minimizar as críticas sobre uma eventual interferência. Teori pretendia homologar as delações na primeira quinzena de fevereiro, por isso Cármen decidiu validar as delações após pedido de urgência de Janot.

Hoje, a sessão que marcará o fim do recesso não será solene. Tradicionalmente, há uma cerimônia de abertura dos trabalhos, com a presença de convidados de fora do Judiciário, até mesmo com a participação do presidente da República, o que não ocorrerá. O encontro começará às 14h. Na ocasião, o decano da Corte, Celso de Mello, fará um discurso em homenagem a Zavascki. Depois, será dado início à pauta de julgamentos, que inclui a discussão sobre réus na linha sucessória do Planalto.

Quem assumir a Lava-Jato, no entanto, não herdará os outros processos de Teori. Há no gabinete dele mais de 7,5 mil ações. A análise desses casos ficará a cargo do ministro indicado por Temer. Há dois processos que interessam ao Planalto. Um deles é o recurso do PT pedindo a anulação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. O outro é se condenados em segunda instância podem ou não ser presos.

Os dois casos estavam com Teori. No caso do impeachment, o ministro já havia concedido uma liminar defendendo a legalidade do processo. Mas não havia analisado o mérito do caso e, em novembro, havia pedido informações ao ministro Ricardo Lewandovski, que conduziu o processo no Senado. Em relação à prisão de réus em segunda instância, a margem de manobra do futuro ministro é menor, já que Teori tinha dado voto favorável. Só poderá haver mudanças na fase posterior de análise dos recursos.

 

O que vem por aí

A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, deve decidir hoje o nome do novo relator da Lava-Jato

 

Composição do STF

Primeira Turma

Luís Roberto Barroso

Marco Aurélio

Luiz Fux

Rosa Weber

Edson Fachin

 

Segunda Turma

Celso de Mello

Gilmar Mendes

Dias Toffoli

Ricardo Lewandowski

 

Possibilidades para  redistribuição

1) Novo ministro

O regimento prevê que os processos deveriam ser redistribuídos para o novo ministro a ser indicado. No caso da Lava-Jato, porém, será usada outra solução prevista no regimento e com base em precedentes.

 

2) Sorteio na segunda turma

A possibilidade mais aventada é a de Cármen Lúcia promover um sorteio entre os ministros do colegiado ao qual pertencia Zavascki. A distribuição pode ser feita entre os quatro ministros que a compõem ou um ministro da Primeira Turma pode ir transferido para a Segunda e participar do sorteio. Neste caso, há uma ordem de prioridade e todos os magistrados do colegiado devem ser consultados para a troca ser efetuada.

 

3) Sorteio no plenário

Outra alternativa é Cármen Lúcia entrar em acordo com os demais ministros e promover um sorteio entre os nove ministros (ela não participaria) do Supremo.

 

4) Herança do processo

Há ainda, entre alguns ministros, um entendimento de que um magistrado transferido da Primeira para a Segunda Turma possa herdar automaticamente o processo da

Lava-Jato, por se sentar na cadeira de Zavascki, Técnicos do Supremo ouvidos pelo Correio avaliam que essa previsão não consta no regimento e, portanto, é mais difícil de ocorrer. Esta possibilidade é ventilada para o caso de Fachin mudar de turma.

 

5) Sorteio

Distribuição eletrônica, determinada pela presidente do STF

 

Cronograma do dia

Supremo retorna hoje do recesso com agenda intensa

 

» Pela manhã

Cármen Lúcia reúne-se com os ministros. Há uma expectativa de que no mesmo encontro se defina a solução a respeito da forma como se dará a escolha do relator e, caso seja essa a solução, ocorra o sorteio.

 

» 14h

Início da sessão de julgamentos.

No princípio do encontro, haverá homenagens ao ministro Teori Zavascki. O decano da Corte, Celso de Mello, fará um discurso. Em seguida, o Supremo começa a julgar as ações na pauta, entre elas a que trata de réus na linha sucessória da Presidência da República. Há chances de ser pautada também a ação que trata da viabilidade da candidatura à reeleição do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

 

AMB pressiona

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) encaminhou ontem ao presidente Michel Temer documento defendendo que um terço das vagas do Supremo Tribunal Federal (STF) seja ocupado por magistrados de carreira. A indicação de um juiz de carreira, concursado e de notório saber jurídico, é uma reivindicação antiga da associação. “O pleito da entidade é de que seja indicado um magistrado para o Supremo Tribunal Federal. Na AMB, temos mais de 14 mil juízes e eles não têm representatividade no Conselho Nacional de Justiça e no Supremo. Isso é motivo de descontentamento”, afirmou o presidente da AMB, Jayme de Oliveira.

 

 

Correio braziliense, n. 19609, 01/02/2017. Política, p. 3.