Caça aos imigrantes

22/02/2017

 

 

ESTADOS UNIDOS » O governo Donald Trump começa o segundo mês com medidas para facilitar a deportação sumária de estrangeiros em situação irregular, mesmo que sem antecedentes criminais. Órgãos da área vão contratar mais 15 mil

 

 

Donald Trump começou o segundo mês à frente da Casa Branca cumprindo uma das promessas de campanha mais polêmicas — a de acelerar a deportação sumária de estrangeiros em situação ilegal. O Departamento de Segurança Interna (DHS, na sigla em inglês) publicou ontem duas circulares que levantam os entraves legais para a expulsão imediata de imigrantes, ainda que não exibam antecedentes criminais. Em medida complementar, o secretário da pasta, o general reformado John Kelly, determinou a contratação de 5 mil guardas de fronteira e 10 mil funcionários para a agência de controle de imigração.

“Todos aqueles em violação das leis de imigração podem ser submetidos a procedimentos de aplicação da norma, inclusive a remoção dos Estados Unidos”, diz o documento. A medida marca não apenas um rompimento com a política seguida nos últimos anos de governo do democrata Barack Obama, que emitiu ordem suspendendo as deportações. Durante a campanha presidencial de 2016, o republicano Trump defendeu a expulsão em massa dos estrangeiros com antecedentes criminais, mas deixou em aberto a possibilidade de maior leniência com os ilegais que não fossem acusados de atos criminosos nos EUA.

“Com extremamente poucas e limitadas exceções, o DHS não eximirá nenhuma classe ou categoria de estrangeiros (irregulares) da aplicação da lei”, diz o texto. Falando à imprensa sobre o assunto, em 23 de janeiro, o porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, tinha reafirmado a prioridade, nos procedimentos de deportação, para “as pessoas que fizeram mal ao nosso país”. “Os que causaram danos (aos EUA) e podem causar, assim como aqueles que têm antecedentes criminais, são o centro das nossas atenções”, frisou Spicer.

“Trump está usando o fantasma do crime para semear entre os americanos o medo em relação aos imigrantes, de modo a abrir espaços para avançar com a perseguição indiscriminada”, disse ao jornal The Washington Post Clarissa Martínez de Castro, vice-presidente da organização pró-hispânica Conselho Nacional da Raça. “Este governo está dizendo: ‘Agora, todo mundo é prioridade e o diabo que os proteja’.”

Falando ao Post sob a condição de anonimato, um funcionário do Departamento de Segurança Interna desmentiu que as diretivas do secretário sejam o anúncio de uma caça generalizada aos estrangeiros. “Nós não dispomos de pessoal nem de recursos para ir aos bairros, cercar as pessoas e colocar em massa nos ônibus”, disse a fonte. “Não temos a menor necessidade de semear o pânico nas comunidades, essa política não tem como propósito promover a deportação em massa. Essa ideia não passa de um fruto da imaginação das pessoas.”

 

Reversão

Os dois memorandos assinados por Kelly são o primeiro passo para o cumprimento da promessa de campanha de Trump de expulsar do país os imigrantes em situação irregular — aproximadamente 11 milhões, na maioria mexicanos —, não importando se tenham ou não cometido crimes violentos no país de origem ou em território americano. Até aqui, porém, o novo presidente não indicou que esteja disposto a modificar o programa Ação Diferenciada para os Chegados na Infância (Daca, na sigla em inglês), lançado por Obama para proteger da deportação jovens imigrantes em situação irregular que foram trazidos aos EUA pelos pais quando eram crianças.

A expulsão de estrangeiros atingiu em 2013 o recorde anual de 434 mil casos. Sob pressão de organizações e ativistas pró-imigrantes, o governo democrata decidiu desafiar a maioria republicana no Congresso e aprovar novas diretrizes destinadas a focalizar os esforços de repressão nos estrangeiros acusados de crimes, em especial com uso de violência. Como resultado, o total anual de deportações caiu progressivamente, até chegar a 333 mil em 2015 — o número mais baixo registrado desde 2007, ainda sob a presidência do republicano George W. Bush.

 

Novas prioridades

Diretrizes anunciadas pelo Departamento de Segurança Interna para conter a entrada de estrangeiros

 

Deportação

Expandir as deportações para imigrantes não documentados que foram acusados de crime, abusaram de benefícios públicos, cometeram falsidade ideológica ou representam risco à segurança pública. O plano permite aos agentes prender qualquer estrangeiro em situação irregular.

 

Detenções na fronteira

Fim da política de liberar os imigrantes capturados na fronteira. A partir de agora, eles serão colocados em centros de detenção até que cada caso seja resolvido pela Justiça.

 

Tráfico de crianças

Apelo às autoridades para que persigam pais que ajudarem na travessia dos filhos na fronteira dos EUA.

 

Muro fronteiriço

Permitir o planejamento da expansão das barreiras de segurança ao longo da fronteira sul dos EUA.

 

 

Correio braziliense, n. 19630, 22/02/2017. Mundo, p. 12.