Serra embaralha jogo de partidos na Esplanada

Paulo de Tarso Lyra

23/02/2017

 

 

CRISE NA REPÚBLICA » Além de definir quem substituirá Alexandre de Moraes na Justiça, Michel Temer agora terá que escolher o substituto do tucano no Ministério das Relações Exteriores. Senador paulista pediu demissão do cargo por motivo de saúde

 

 

A dois dias do carnaval, o presidente Michel Temer tem mais um desfalque na equipe ministerial. O chanceler José Serra entregou ontem à noite uma carta pedindo exoneração do cargo, alegando problemas de saúde “de conhecimento do presidente”. Agora, Temer terá de decidir, até o carnaval, quem assumirá o Ministério das Relações Exteriores, no lugar de Serra, e o da Justiça, em substituição a Alexandre de Moraes, aprovado ontem para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal.

Até que decida pelo substituto, assume o cargo interinamente o secretário-geral do MRE, embaixador Marcos Galvão. Não se sabe, ao certo, quanto tempo a interinidade vai durar, já que, na Justiça, José Levy do Amaral está de forma provisória desde 6 de fevereiro, quando Temer decidiu indicar Moraes para o STF. E o presidente tem encontrado muita dificuldade para escolher o sucessor.

A carta de Serra foi entregue perto das 21h. “Faço-o com tristeza, mas em razão de problemas de saúde que são de conhecimento de Vossa Excelência, os quais me impedem de manter o ritmo de viagens internacionais inerentes à função de chanceler.” Além da questão das viagens, Serra afirmou que seu problema de saúde dificulta os trabalhos no dia a dia. E acrescentou que, segundo os médicos, “o tempo para restabelecimento adequado é de pelo menos quatro meses”.

O tucano agradeceu ao presidente. Apesar de ser senador pelo PSDB, o partido sempre deixou claro que a escolha de Serra para o Ministério das Relações Exteriores foi uma escolha pessoal do presidente Temer. “Para mim, foi motivo de orgulho integrar sua equipe. No Congresso, honrarei meu mandato de senador, trabalhando pela aprovação de projetos que visem à recuperação da economia, ao desenvolvimento social e à consolidação democrática do Brasil”, concluiu o agora ex-ministro.

O Correio apurou que Serra vinha se queixando de dores insuportáveis na coluna, fazendo, inclusive, tratamento em São Paulo. Em uma de suas recentes viagens internacionais, a trabalho, aproveitou para consultar com médicos estrangeiros, o que o fez consolidar a decisão. Ele reclamava constantemente a amigos da dificuldade de fazer viagens longas e participar de solenidades, algo inerente ao cargo.

O pedido de Serra para deixar o posto também traz mudanças importantes no xadrez para 2018. O agora ex-chanceler disputa internamente no PSDB, com o presidente da legenda, senador Aécio Neves (MG), e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, quem será o candidato ao Planalto para suceder Temer. Além disso, mesmo tendo sido uma escolha pessoal, não se sabe ainda se o PSDB vai pleitear a manutenção da pasta sob o comando da legenda.

 

Nomes

À questão do MRE soma-se o impasse na Justiça, pasta para a qual Temer não consegue escolher o substituto. O presidente quer um nome técnico, mas a recusa de Carlos Velloso na semana passada embolou tudo e reacendeu a pressão por uma escolha política, vinda com a chancela do PMDB.

A bancada peemedebista na Câmara já aceita se o indicado for o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). Um grupo de juristas, incluindo o procurador Rodrigo Janot, simpatiza com o nome do subchefe da Casa Civil, Gustavo Vale. Os dois têm problemas: Serraglio conta com mais apoio de Temer e de diversas legendas do que entre os próprios correligionários. “Mas é melhor ter um ministro que não gostamos do que ver a pasta ir para alguém que não é nosso”, confessou um peemedebista.

No caso de Gustavo, pesa contra ele o fato de ter chegado ao cargo por indicação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e de ter sido o responsável por assinar os pedidos à Justiça para censurar os jornais que divulgaram informações sobre a primeira-dama Marcela Temer.

E o PMDB arrumou uma encrenca à toa ontem, com base na declaração dada pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, ao Valor Econômico. Moreira afirmou que o PMDB não fechará questão na votação da reforma da Previdência. Temer ficou irritadíssimo, chamou o presidente nacional do partido, senador Romero Jucá (PMDB-RR), que foi obrigado a divulgar uma nota desmentindo o ministro da Secretaria-Geral. “Ao contrário (do que foi publicado), o partido tem discutido com a bancada federal da Câmara dos Deputados a possibilidade de fechamento de questão, assim como foi feito na votação da PEC que limita os gastos públicos”, acrescentando que a opinião de Moreira foi pessoal.

 

 

Correio braziliense, n. 19631, 23/02/2017. Política, p. 02.