O Estado de São Paulo, n. 45013, 13/01/2017. Política, p. A4

Por Lava Jato, Janot avalia disputar terceiro mandato

 

Beatriz Bulla
 

Chefe do Ministério Público Federal desde o início da Operação Lava Jato, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, avalia a possibilidade de disputar um novo mandato de dois anos à frente da instituição. Janot já foi reconduzido ao cargo, em 2015, para a gestão que se encerra em setembro.

A disputa por um terceiro mandato seria inédita no grupo dos chamados “tuiuiús” – procuradores da República que lutaram para que a categoria fosse ouvida na escolha do chefe da instituição e fizeram oposição ao ex-procurador-geral Geraldo Brindeiro, nomeado por quatro vezes pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

Janot é considerado o “último dos tuiuiús”. O grupo chegou ao posto mais alto do Ministério Público com a escolha e indicação de Cláudio Fonteles em 2003. Desde então, os presidentes da República mantiveram a tradição de nomear o mais votado pela categoria.

Em um acordo implícito, procuradores-gerais tentavam formar seus “sucessores naturais” para o cargo. Agora, a avaliação de procuradores da República ligados à Lava Jato é de que há poucas opções para dar continuidade ao trabalho do atual chefe do Ministério Público Federal. Na Procuradoria-Geral da República, a avaliação é de que Janot tem força para ficar mais uma vez em primeiro lugar na lista tríplice.

Defensores da permanência do atual procurador-geral no cargo justificam que um terceiro mandato deve existir em casos excepcionais, para manter o ritmo de uma investigação. O fundamento é de que o ápice do trabalho da Procuradoria-Geral da República na Lava Jato foi alcançado agora, com a delação de 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht, sobre a qual o grupo de Janot tem se debruçado.

Denúncias. Se Janot permanecer por mais dois anos, terá a chance de concluir as denúncias contra políticos citados por delatores da empreiteira. Após a homologação das delações pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, a Procuradoria-Geral da República deve pedir a abertura de inquéritos contra nomes suspeitos. Só depois da fase inicial de investigação, o procurador-geral oferece possíveis denúncias. No mensalão, a fase de investigação e denúncia ficou a cargo do ex-procurador-geral da República Antônio Fernando de Souza. Seu sucessor, Roberto Gurgel, assumiu a fase do julgamento e Janot entrou na análise de recursos e execução de penas.

Em conversa com jornalistas em novembro, Janot foi questionado sobre a sucessão. Em tom bem-humorado, indicou que era cedo para deixar o cargo. Interlocutores do atual procurador-geral dizem que ele não externou sua decisão final e consideram o debate precipitado. As candidaturas deverão ser apresentadas a partir de abril. De acordo com o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho, não há impedimento legal para uma nova recondução de Janot.

Nomes. A ANPR organiza a votação para formar a lista tríplice e encaminha o resultado à Presidência da República. Segundo Robalinho, o presidente Michel Temer sempre teve um bom diálogo com o Ministério Público e se comprometeu a escolher um dos nomes eleitos pela categoria. “As forças políticas, em geral, apoiam de maneira sólida a lista tríplice”, disse Robalinho. Devem fazer parte da disputa nomes conhecidos na carreira: Nicolao Dino, Ela Wiecko, Mario Bonsaglia, Raquel Dodge, Carlos Frederico e Sandra Cureau.

Dino é vice-procurador-geral eleitoral de Janot e tido como o nome que teria o apoio do atual procurador-geral. O problema em sua indicação é político, já que o procurador é irmão de Flávio Dino (PC do B), governador do Maranhão e opositor do PMDB. Peemedebistas no Senado já deram sinais de que o nome de Dino para o cargo de procurador-geral da República, responsável por conduzir a investigação contra parte da bancada do partido no âmbito da Lava Jato, enfrentaria resistência.

Outra opção do grupo de Janot seria o seu atual vice, José Bonifácio de Andrada. Mas procuradores ouvidos avaliam que ele só disputaria com o aval de Janot. Bonifácio teve cargo em Minas Gerais durante o governo do senador Aécio Neves (PSDB) e foi advogado-geral da União no governo FHC.

Ela Wiecko foi vice-procuradora-geral de Janot e é bem cotada internamente. A avaliação é de que Ela reúne votos de um grupo descontente com o Ministério Público atual, considerado de perfil punitivista. Quando era vice de Janot, Ela participou de ato, em Portugal, contra o governo Temer – o que é visto como entrave à sua indicação. O procurador Mario Bonsaglia também é considerado um candidato forte, porém sem traquejo político para o cargo.

 

Primeiro colocado

Desde 2003, os presidentes da República conduzem ao cargo o nome mais votado na lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República. A tradição foi iniciada com Lula.

 

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Mandato do procurador-geral da República é de dois anos e titular pode ser reconduzido ao cargo sem limite de indicações

 

 

Como funciona a indicação

1 - Lista tríplice

Desde 2001, a Associação Nacional dos Procuradores da República promove uma votação interna. Após a eleição, a entidade envia ao presidente da República a lista com os três primeiros colocados. O chefe do Executivo não é obrigado a seguir a lista

 

2 - CCJ

A indicação do Executivo é submetida ao Senado, que tem atribuição constitucional para apreciar a nomeação. O indicado passa por sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O colegiado vota e dá parecer favorável ou contrário à indicação

 

3 - Plenário do Senado

Nome aprovado ou rejeitado na CCJ segue para o plenário do Senado, que dá a última palavra.

Indicado precisa do apoio de pelo menos 41 senadores – Casa é composta por 81 parlamentares – para assumir o cargo. A votação é secreta

 

No caso de rejeição, presidente da República tem de indicar novo nome, que pode ou não ser da lista tríplice da ANPR. Rito no Senado se repete até a aprovação do escolhido pelo plenário da Casa

 

 

Rodrigo Janot

ATUAL PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA

Entre as atribuições do PGR está a condução de investigações criminais de autoridades, como deputados, senadores, ministros de Estado, presidente e vice-presidente da República

 

Quem já ocupou o cargo

Sepúlveda Pertence

1985-1989

Governo Sarney

 

Aristides Junqueira

1989-1995

Governos Collor/ Itamar Franco

 

Geraldo Brindeiro

1995-2003

Governo Fernando Henrique Cardoso

 

Cláudio Fonteles

2003-2005

Governo Lula

 

Antonio Fernando de Souza

2005-2009

Governo Lula

 

Roberto Gurgel

2009-2013

Governo Dilma