Mulheres programam paralisação amanhã

Julia Chaib

07/03/2017

 

 

MANIFESTAÇÃO Movimentos feministas de 48 países, incluindo o Brasil, querem que dia internacional da mulher seja marcado por protestos em vez de homenagens com flores. Brasília terá atos no Museu da República e no Setor Comercial Sul

 

 

Uma mobilização capitaneada por feministas de países como Argentina e Polônia se espalhou pelo Brasil e intensificou a agenda de atos para o Dia Internacional da Mulher, celebrado amanhã, 8 de março. Convocada internacionalmente como Paro de Mujeres e International Women’s Strike — que em espanhol e em inglês significam greve internacional de mulheres —, movimentos organizam, em várias cidades do país, a Parada Brasileira de Mulheres.

A ideia é chamar as mulheres para uma paralisação das atividades em casa e no trabalho, por horas ou por todo o dia, para somarem-se nas ruas. Além de protestos, há também chamadas para tuitaços, apitaços e o uso de adereços roxos, considerada a cor do movimento feminista.

A chamada para a paralisação foi articulada na Argentina, com o movimento Ni Una a Menos (nem uma a menos), que reuniu milhares de mulheres nas ruas de Buenos Aires, no fim do ano passado. Muitas paralisaram por uma hora suas atividades. A proposta foi reforçada por feministas da Polônia, palco de uma greve de manifestantes contra um projeto de lei que barrava o aborto no país europeu, em outubro do ano passado. Depois da convocação internacional, dezenas de países aderiram aos atos, organizados de forma independente em cada lugar.

A bandeira em comum entre todos os protestos é a denúncia à onda conservadora e a perda de direitos das mulheres no mundo, além da luta pelo fim da violência dirigida contra pessoas do sexo feminino. No Brasil, de acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), 13 mulheres são assassinadas por dia, uma média de um feminicídio a cada uma hora e meia.

No Estados Unidos, palco de uma grande manifestação em 21 de janeiro contra a eleição do presidente Donald Trump, feministas fizeram um manifesto em fevereiro, convocando para uma greve geral. Por meio de carta, intelectuais feministas, como Angela Davis e Nancy Fraser, convocam para atos contra políticas neoliberais e a favor dos direitos reprodutivos. “A ideia é mobilizar mulheres, incluindo mulheres trans, e todos os que as apoiam num dia internacional de luta — um dia de greves, marchas e bloqueios de estradas, pontes e praças; abstenção do trabalho doméstico, de cuidados e sexual; boicote e denúncia de políticos e empresas misóginas, greves em instituições educacionais”, diz a carta.

 

Contra a reforma

Socióloga e assessora técnica do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Jolúzia Batista diz que “a época das flores” ficou para trás. “Esse 8 de março assume o caráter de uma mobilização mundial, então ele promete imprimir um novo momento na luta das mulheres no Brasil e no mundo”, avalia.A organização das mobilizações é independente. Em Brasília, estão agendados pelo menos dois atos: um apitaço no Setor Comercial Sul, ao meio-dia, e uma manifestação, com concentração marcada para as 14h em frente ao Museu Nacional. “O importante é que as mulheres se somem nas ruas, que paralisem suas atividades como puderem. Quem não puder parar, que vá a um ato na hora do almoço ou se vista de roxo. O importante é denunciar, porque este 8 de março tem uma pauta política. A tradição de entrega de flores ficou no passado”, diz.

No Brasil, além da luta contra a onda conservadora no mundo, estão na pauta dos protestos a crítica à reforma da Previdência, a crítica ao feminicídio e às mortes por aborto clandestino. Antes do chamamento internacional, no Brasil, já era organizada uma mobilização contra a reforma da Previdência, articulada pelo núcleo que organiza a Marcha das Margaridas, mas os atos tomaram outra proporção com a chamada internacional de adesão às mobilizações, principalmente depois da manifestação de mulheres nos Estados Unidos com a eleição de Donald Trump.  “A eleição do Trump vocaliza a onda conservadora no mundo”, avalia.

Coordenadora da ONG SOS Corpo, Silvia Camurça diz que ao menos 48 países aderiram às mobilizações. No Brasil, todos os estados têm atos agendados. Uma página no Facebook chamada Parada Brasileira de Mulheres reúne diversos protestos, sendo vários em cidades do interior. “É uma convocação independente, aberta e auto convocada. Mas aqui (no Brasil), incluímos a legalização do aborto, as ameaças que o Congresso está colocando para tirar a possibilidade de interrupção da gravidez até em caso de risco para a mãe”, explica.

Para Sílvia, o movimento tende a ter grande impacto mundial. “Esse 8 de março será marcado por uma reação das mulheres à onda de políticas neoliberais que estão assolando os governos. O primeiro motivo da paralisação é uma reação à perda de direitos das mulheres. O segundo motivo é uma reação à onda conservadora, fundamentalista e machista que cresce no mundo todo”, reforça.

 

 

Correio braziliense, n. 19642, 07/03/2017. Brasil, p. 6.