Jamil Chade
Na primeira manifestação sobre o mérito de uma investigação envolvendo o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a Justiça da Suíça afirmou que existem “indicações concretas” e suspeitas “óbvias” e “suficientes” de que o deputado cassado esteve envolvido em um esquema de “corrupção”. Para o Tribunal Penal Federal da Suíça, pela posição que ocupava no Congresso, o peemedebista tinha a “capacidade de influenciar” a decisão sobre negócios da Petrobrás no Benin, na África, em maio de 2011.
Cunha é réu na Justiça brasileira acusado de receber propina de contrato de exploração de petróleo no país africano e usar contas na Suíça para lavar o dinheiro. A ação tramita na 13.ª Vara Criminal Federal em Curitiba, sob responsabilidade do juiz Sério Moro.
As conclusões das autoridades suíças estão em decisão na qual o Tribunal Penal Federal nega desbloquear contas de pessoas e empresas envolvidas na operação – a corte, no entanto, não revela o autor do pedido.
Liberados nesta semana, os papéis datam de novembro de 2016 e podem também servir ao processo no Brasil.
Na decisão de manter congelados os recursos no país, o tribunal suíço relata ainda como o negócio da Petrobrás no Benin irrigou uma conta controlada por Cunha. À época, o peemedebista era deputado. A estatal brasileira pagou US$ 34,5 milhões (R$ 111 milhões, na cotação de ontem), em maio de 2011, pela exploração de uma área no país africano, conhecida como Bloco 4.
Segundo as autoridades suíças, após o negócio, foi transferido cerca de US$ 1,3 milhão (o equivalente a R$ 4,2 milhões) para uma conta no país atribuída a Cunha. O documento também afirma que, diferentemente do que diz o peemedebista, ele é o beneficiário direto dos ativos. Cunha foi cassado em setembro do ano passado por mentir à CPI da Petrobrás ao dizer não possuir contas no exterior.
Em sua defesa, afirmou que os valores na Suíça estavam depositados em um trust.
‘Provas’. “O beneficiário era N, o ex-presidente da Câmara dos Deputados”, afirmou o tribunal penal. O documento não cita o nome do deputado cassado e o descreve apenas pela letra N. O Estado apurou que a sigla se refere de fato a Cunha.
Para não liberar o dinheiro bloqueado, o tribunal suíço avalia que existem “provas suficientes de que os fundos podem estar nas contas penhoradas no banco E, em conexão com o assunto sob investigação”. O nome do banco não foi revelado e apenas marcado com a letra E.
A Justiça suíça ainda aponta que a Petrobrás teria pago um valor inflacionado pelo negócio para incluir a corrupção.
Colaboração. Em outubro de 2016, dados foram enviados pelo Ministério Público da Suíça para a força-tarefa da Lava Jato.
Naquele momento, as provas colhidas indicavam que R$ 23,2 milhões irrigaram as contas vinculadas a Cunha na Suíça.
Os depósitos atribuídos ao ex-presidente da Câmara continuam bloqueados no país europeu e o dinheiro apenas será repatriado ao Brasil caso Cunha seja condenado. Outra opção para o retorno do dinheiro seria um acordo de delação em que ele aceite devolver os recursos.
Além do processo relacionado ao contrato da Petrobrás no Benin, o deputado cassado, preso desde outubro, ainda responde a mais duas ações penais. Em uma delas, também na Lava Jato, é acusado de receber propina para “facilitar e viabilizar” a contratação de navios-sonda.
Na outra, que tramita na Justiça Federal em Brasília, é acusado de cobrar propina de empresas que pleiteavam recursos do fundo de investimento do FGTS. O esquema foi delatado pelo ex-vice- presidente da Caixa Fábio Cleto, ex-aliado de Cunha.
Procurada ontem, a defesa do ex-presidente da Câmara informou que não se manifestaria.
PEEMEDEBISTA NA MIRA
Ex-presidente da Câmara e deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) é réu em três ações penais – duas delas relativas ao esquema de corrupção na Petrobrás investigado na Lava Jato
FI-FGTS ACUSAÇÃO:
Segundo a Procuradoria-Geral da República, Cunha cobrou propina de empresas para liberar investimentos do FGTS. O esquema foi delatado pelo ex-dirigente da Caixa Fábio Cleto.
Cunha virou réu em outubro do ano passado em ação penal sem relação com a Lava Jato
CRIMES:
Corrupção
Lavagem de dinheiro
Prevaricação e violação de sigilo funcional
ACUSAÇÃO:
Segundo a Procuradoria-Geral da República, Cunha recebeu, entre 2006 e 2012, US$ 5 milhões para “facilitar e viabilizar” a contratação de dois navios-sonda pela Petrobrás, construídos pelo estaleiro sul-coreano Samsung Heavy Industries. Cunha virou réu em março do ano passado
CRIMES:
Corrupção passiva
Lavagem de dinheiro Contas na Suíça e negócio na África
ACUSAÇÃO:
Segundo a Procuradoria, Cunha movimentou propina em contas secretas na Suíça.
Ele teria recebido US$ 1,3 milhão, fruto da compra de campo de petróleo no Benin pela Petrobrás. Cunha virou réu em junho do ano passado
CRIMES:
Corrupção passiva
Lavagem de dinheiro
Evasão de divisas
Declaração falsa em documento eleitoral
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Considerado “homem-bomba” pelo governo Michel Temer, o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) recebeu no fim do ano visitas do advogado Renato Oliveira Ramos, que, por sua vez, repassou “impressões” das conversas a Gustavo Rocha, responsável pela Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil, órgão que assessora ministros e o próprio presidente.
A avaliação de antigos aliados do peemedebista é de que as visitas visaram a mapear a disposição do ex-presidente da Câmara em fechar acordo de delação premiada com a força-tarefa da Lava Jato e se ele poderia implicar o Palácio do Planalto. Desde sua detenção, Cunha se reuniu com Ramos, que, por ser advogado, tinha acesso livre à carceragem da Polícia Federal em Curitiba (mais informações na página ao lado).
O deputado cassado foi preso preventivamente há quase três meses acusado de receber propina de contrato de exploração de petróleo no Benin e usar contas na Suíça para lavar o dinheiro.
Ele tem demonstrado confiança de que sua situação se resolverá até abril, quando acredita que o juiz Sérgio Moro possa dar a sentença. Até lá, não pretende iniciar acordo de delação.
Ramos admitiu ter ido pelo menos duas vezes a Curitiba conversar com Cunha, sendo a primeira visita “de cortesia” e a segunda para tratar de um mandado de segurança que pode ser impetrado neste mês no Supremo Tribunal Federal contra a cassação do mandato pelo plenário da Câmara. Ele disse que “comentou” com Rocha que esteve em Curitiba e relatou a situação do ex-presidente da Câmara.
“Ficou no limite do comentário”, afirmou. Já o subchefe da Casa Civil disse que tem falado com Ramos por telefone, mas alegou não se lembrar desse relato sobre Cunha. “Esse assunto não me diz respeito.” Ex-auxiliares de Cunha que cuidaram do processo de cassação, contudo, declararam que jamais foi discutida a apresentação do mandado de segurança ao STF, citado por Ramos para justificar sua ida a Curitiba. Antigos aliados do peemedebista acreditam que são nulas as chances de sucesso do recurso. Ramos e Rocha são amigos de infância e ex-sócios em um escritório de advocacia. Ambos tiveram uma relação próxima com o deputado cassado.