O Estado de São Paulo, n. 45005, 05/05/2017. Economia, p. B4

Rio tem nova liminar contra bloqueio

 
Breno Pires
Idiana Tomazelli

 

O Estado do Rio de Janeiro obteve ontem nova vitória no Supremo Tribunal Federal (STF), que estendeu a liminar que impede o bloqueio de recursos do governo fluminense para ressarcir a União devido ao calote em dívidas garantidas pelo Tesouro. A decisão da presidente da corte, ministra Cármen Lúcia, foi proferida mesmo depois de o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ter tomado a dianteira e ido pessoalmente ao Supremo apresentar seus argumentos.

Nesta quinta-feira, estava prevista uma retenção de R$ 181 milhões pela União como forma de compensação, uma vez que o Rio de Janeiro não pagou parcelas de empréstimos obtidos com o aval do Tesouro Nacional.

Quando isso ocorre, é o governo federal que banca o pagamento, mas os contratos preveem que a União tem o direito de executar contragarantias. As contragarantias são recursos, indicados pelo próprio Estado, que são bloqueados para ressarcir os cofres federais.

Os contratos que não foram honrados pelo Rio de Janeiro e cujo bloqueio foi suspenso pela extensão da liminar estão relacionados ao Programa de Melhoria de Infraestrutura Rodoviária, Urbana e da Mobilidade das Cidades do Estado do Rio de Janeiro (Pró-Cidades), ao Programa de Apoio ao Investimento dos Estados e do Distrito Federal (Proinveste) e ao Programa PAC Favelas.

A ministra Cármen Lúcia já havia suspendido na segundafeira a retenção e a transferência de R$ 193 milhões referentes a outros contratos. Ontem, ela estendeu a liminar e, como justificativa, recorreu aos mesmos argumentos da decisão anterior, que citava a “gravíssima situação financeira” do Rio.

Segundo ela, o bloqueio deixaria o Estado impossibilitado de executar “obrigações constitucionais dos direitos dos servidores públicos, de aposentados dependentes do ente estadual, dentre outras obrigações fundamentais do Estado”. O governo fluminense começou 2017 sem ter pago metade da folha de salários de novembro e sem previsão para quitar os pagamentos de dezembro e do 13.º.

Logo após a decisão da presidente do STF, o governo do Rio confirmou para esta quinta-feira o depósito da primeira parcela dos salários de novembro para os servidores que não estão na lista prioritária.

Pela liminar, o bloqueio dos recursos ficará suspenso até a nova apreciação da decisão pelo ministro relator, Ricardo Lewandowski, ou a submissão por ele da decisão ao colegiado.

No Ministério da Fazenda, o clima é de tensão com os riscos fiscais e jurídicos das medidas.

Mas a postura tem sido cautelosa, uma vez que o despacho foi feito pela própria presidente da corte. Tanta insegurança pode ainda travar novamente as análises de pedidos de garantia feitos pelos Estados, retomados no fim de 2016. O tema é tão delicado que, embora a Advocacia- Geral da União (AGU) esteja elaborando o recurso, Meirelles se encontrou com Cármen Lúcia com o objetivo, segundo ele, de fornecer informações para subsidiar decisões da Corte. O dossiê não convenceu./COLABOROU ADRIANA FERNANDES

 

Dívidas

R$ 181 mi é o valor da retenção que estava prevista para acontecer hoje nos cofres do Estado do Rio, mas que será utilizado para pagar a folha de salário dos servidores que não estão na lista prioritária

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Risco de calote de Estados com a União cresce


 

O Tribunal de Contas da União (TCU) considera que existe o risco de aumento na inadimplência dos Estados em empréstimos feitos pelos governos locais com garantias do Tesouro Nacional. Os calotes começaram diante do agravamento da crise financeira dos governos estaduais, mas a ameaça para as contas da União ficou ainda maior depois que o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu liminar ao Estado do Rio de Janeiro impedindo o governo federal de executar as contragarantias – bloqueios de valores do Estado para compensar o pagamento feito pela União.

Segundo a área técnica da corte de contas, a má situação fiscal dos Estados não tende a melhorar no curto prazo caso nenhuma medida seja tomada pelo governo federal. Com isso, há a possibilidade de os governos estaduais ficarem mais inadimplentes e de a União ter de honrar mais garantias.

Até novembro, o Tesouro precisou arcar com R$ 1,695 bilhão em dívidas não pagas tanto por Estados quanto por municípios – a maior parte delas do governo fluminense.

A decisão do Supremo abriu um precedente grave, pois outros Estados também podem recorrer ao mesmo expediente jurídico para não ter de pagar suas dívidas. Com isso, a União deixaria de receber mais contragarantias, que são previstas nos contratos assinados com os governos estaduais.

A liminar do STF foi deferida justamente em meio às investigações do TCU sobre o grande volume de garantias concedidas a Estados com maior risco de calote (como é o caso do Rio de Janeiro), conforme antecipou o Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.

Essa apuração levou o Tesouro a acelerar a revisão do sistema de concessão de garantias e de avaliação da nota de risco dos Estados, que está sendo coordenada pela secretária do órgão, Ana Paula Vescovi.

Até hoje, a área técnica do TCU vinha trabalhando nas investigações com o pressuposto de que a União não estava sendo lesada no processo, ou seja, conseguia recuperar os recursos por meio de bloqueios nas contas dos Estados.

A decisão do Supremo abriu uma porta que permite justamente a suspensão dessas retenções de valores, mesmo que o governo federal tenha efetuado o pagamento.

Outro ponto que está sendo analisado pela corte de contas é se o processo de honra de garantias pela União ocorre dentro do que os contratos assinados com os Estados preveem. A liminar do STF permite precisamente que um dos pontos do trato, a execução de contragarantias, seja ignorado. / Idiana Tomazelli Adriana Fernandes