Justiça pede alerta vermelho da Interpol 
Juliana Castro, Chico Otavio, Marco Grillo e Graça Magalhães 
27/01/2017
 
 
Eike Batista, que já foi o sétimo mais rico do mundo, é acusado de pagar propinas e integrar esquema de corrupção de Sérgio Cabral

A Justiça afirma que Eike simulou um contrato para pagar US$ 16,5 milhões em propina a Cabral

-RIO E BERLIM- Sétimo homem mais rico do mundo em 2012, segundo a Forbes, o empresário Eike Batista viu a fortuna e o poder derreterem e, ontem, deu mais um passo na derrocada pessoal e empresarial: é alvo de um mandado de prisão preventiva, considerado foragido e pode entrar na lista de procurados da Interpol — a Justiça já determinou a inclusão, já que Eike está fora do país. Ele é acusado de corrupção e lavagem de dinheiro.

De acordo com o juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, Eike pagou, em 2011, US$ 16,5 milhões (R$ 52,4 milhões) em propinas ao ex-governador Sérgio Cabral. A quantia foi repassada via intermediários, por meio de um contrato de fachada que tinha como objeto a compra e venda de uma mina de ouro pelo grupo empresarial liderado por Eike.

A operação foi narrada ao Ministério Público Federal pelos doleiros Marcelo Chebar e Renato Chebar, que firmaram acordos de delação premiada. Os investigadores ainda apuram quais benefícios Eike recebeu em troca. Procurada, a defesa não se manifestou sobre o caso.

Um contrato de fachada foi firmado entre as empresas Arcádia Associados, de Renato, e Centennial Asset Mining Fund, de Eike. O suposto serviço prestado pela Arcádia foi a intermediação de uma transação entre a Centennial e uma terceira empresa, a Ventana. Como o negócio girava em torno de US$ 1,3 bilhão, os US$ 16,5 milhões seriam justificados como um percentual de mercado para a intermediação.

Cabral indicou que o valor fosse usado na compra de ações da Petrobras, Vale e Ambev. A titularidade das ações foi transferida da conta Golden Rock, mantida por Eike no TAG Bank, um banco no Panamá, para uma conta do doleiro no banco Winterbotham, no Uruguai.

Em 2015, após uma busca e apreensão em um endereço de Eike em São Paulo, um documento identificando a transação foi apreendido. Segundo o depoimento dos doleiros, uma reunião aconteceu, e os advogados Ary Bergher e Raphael Mattos, além do executivo Flávio Godinho, preso ontem, tranquilizaram os doleiros afirmando que a quantia paga corresponderia a uma taxa normal de mercado para esse tipo de negociação.

A investigação sobre o esquema de corrupção, que segundo o MPF era comandado por Cabral, já havia identificado um repasse de R$ 1 milhão da EBX, de Eike, ao escritório de advocacia de Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador. Em depoimento, o empresário afirmou que o pagamento foi feito a pedido da Caixa Econômica, contratada por Eike para captar recursos para um fundo de investimento. À Justiça, a Caixa negou ter indicado o escritório de Adriana Ancelmo. Segundo Bretas, as alegações de Eike “caem por terra” após a manifestação da Caixa. No mesmo depoimento, o empresário negou ter pago propina a Cabral.

PROTEÇÃO PELA LEI DA ALEMANHA

Na terça-feira, Eike embarcou para Nova York. Segundo a Polícia Federal, o empresário viajou com os dois passaportes: o brasileiro e o alemão. A assessoria de Eike informou que ele “vai se apresentar às autoridades". Como tem cidadania alemã, ele poderia permanecer na Alemanha mesmo em caso de delitos graves, como homicídio ou tráfico de drogas. Na hipótese de o envolvimento ser comprovado, ele continua protegido se a lei do país que o procura o ameace com uma penalidade maior do que na Alemanha, ou se as condições carcerárias sejam piores que as prisões do país.

Caso se apresente no Brasil, Eike vai para uma cadeia a ser definida pela Secretaria estadual de Administração Penitenciária (Seap). O encaminhamento nos presídios do Rio costuma obedecer a três critérios: o tipo de regime determinado para o acusado; se ele pertence a alguma facção do crime organizado; e o nível de escolaridade. Em biografia escrita pelo jornalista Roberto D´Ávila,, Eike conta que não concluiu o curso de Engenharia.

Duas prisões abrigam detentos com o mesmo perfil do empresário: sem formação superior, presos provisoriamente e sem ligação com facções: Ary Franco, em Água Santa, e Evaristo de Moraes, em São Cristóvão, ambos superlotados. A escolha também leva em conta o risco à segurança. Luiz Carlos Bezerra, ligado a Cabral, tem um perfil semelhante, mas está preso na José Frederico Marques, em Bangu, uma penitenciária para a triagem.

 

O globo, n. 30489, 27/01/2017. País, p. 6