Maior aliado de Eike, vice do Fla é preso 
Chico Otávio, Gian Amato, Juliana Castro e Miguel Caballero 
27/01/2017
 
 
Godinho ficou ao lado do ex-bilionário mesmo após a ruína, e ganhou fama como dirigente esportivo

Braço-direito de Eike Batista, Flávio Godinho atuou durante anos como advogado e um dos principais executivos do grupo X, mas foi ao deixar a sombra dos escritórios e ganhar notoriedade pública como vice-presidente de futebol do Flamengo que acabou preso, ontem, na Operação Eficiência. Ele é acusado de ter elaborado a operação que, segundo o Ministério Público Federal (MPF), permitiu a seu antigo chefe pagar US$ 16,5 milhões de propina a Sérgio Cabral. O dinheiro foi transferido a uma empresa dos irmãos Marcelo e Renato Chebar, que seriam operadores de Cabral, sob pretexto de intermediação na compra de uma mina de ouro.

Funcionário das empresas X desde os anos 1980, Godinho foi diretor-presidente e jurídico da EBX, e o mais fiel dos executivos que fizeram fortuna trabalhando com Eike — e acertando rescisões milionárias na hora de sair. Não foram poucos os que brigaram com o chefe, e Godinho foi exceção. Mesmo após a derrocada da holding, permaneceu ao lado do empresário, e só em 2013 deixou as empresas X. O advogado virou consultor informal do agora foragido da polícia, abriu empresa de consultoria e se dedicou à política do Flamengo.

Ele foi um dos líderes do grupo de executivos que venceu as eleições do clube em dezembro de 2012. Na mesma equipe, um velho conhecido das empresas de Eike: Rodolfo Landim, que havia deixado longa carreira na Petrobras por postos de alto comando nas empresas de Eike. Unidos no clube, eram inimigos numa milionária batalha judicial. Godinho era o advogado de Eike no processo movido por Landim, que brigara com o antigo patrão e incluiu na ação uma peça que entrou para o folclore das grandes brigas empresarias: uma promessa assinada por Eike, escrita num pedaço de papel durante um voo Londres-São Paulo em 2006, revelador do estilo do magnata: “Gostaria de convidá-lo a fazer parte da minha holding; como cavaleiro da távola do sol eterno, fiel guerreiro e escudeiro, um grade amigo! Ao invés de uma bela espada, você receberá 1% da holding + 0,5% das minhas ações da MMX”. Landim cobrava a promessa, mas a Justiça considerou em primeira e segunda instância que o bilhete não tinha valor legal.

DOLEIRO VENDEU CAVALOS DE CORRIDA

Em 2013, Godinho deixou a diretoria do Flamengo, à qual voltaria em 2015, desta vez como vice presidente de futebol. Habituou-se aos holofotes da imprensa esportiva, e mostrava-se confortável na condição de dar entrevistas como responsável pela contratação de craques para o Flamengo, como o meia Diego, em 2016.

Sua prisão ocorreu num dia infeliz para o clube. O Flamengo havia marcado a apresentação oficial de seu novo patrocinador, uma bebida energética tailandesa que teve o infortúnio de ver sua marca exposta num dia de péssimas notícias. O presidente do clube, Eduardo Bandeira de Mello, esforçou-se para tratar o tema como “assunto pessoal” de Godinho, afastado do cargo no clube.

Vizinho à sede do Flamengo, o Jockey Club Brasileiro é palco de atuação de outro personagem preso ontem. Apontado como operador financeiro do esquema de propinas, o doleiro Álvaro José Galliez Novis já havia sido preso por cinco dias em março do ano passado, na 26ª fase da Lava-Jato, denominada Xepa. Proprietário de cavalos de corrida, ele apressou-se em leiloar, depois de solto, seus 66 animais, talvez num sinal de que continuaria sendo apertado pelas investigações, o que se concretizou ontem.

AMIGO DE DUAS DÉCADAS

Segundo os delatores Marcelo e Renato Chebar, Álvaro José Novis fazia o pagamento dos valores acertados entre o Palácio Guanabara e as empreiteiras. Conhecido pelo codinome "Enrolado", ele creditou, entre setembro de 2014 e maio de 2015, R$ 12 milhões nas contas do esquema.

Outro dos presos ontem era uma das figuras mais próximas de Sérgio Cabral. Sergio de Castro Oliveira, o Serjão, foi um dos principais assessores do ex-governador em campanhas eleitorais e na presidência da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Já são mais de duas décadas de amizade entre os dois. Quando Cabral disputou a prefeitura do Rio, em 1996, foi acusado de usar servidores de seu gabinete na Alerj para fazer campanha. Um deles era Serjão, e o outro, Luiz Carlos Bezerra, preso na Operação Calicute.

Os delatores da Operação Eficiência contaram que, entre 2002 e 2003, foram procurados por Sergio Cabral, preocupados em transferir o dinheiro que tinha no Israel Discount Bank of New York. Seguindo o combinado, Serjão, cujo codinome era “Big” ou “Big Asshole”, levava mensalmente aos irmãoes Chebar, num escritório na Avenida Rio Branco, uma mochila ou pasta com dinheiro, entre US$ 50 mil e US$ 250 mil, num total que chegou a US$ 2 milhões.

O globo, n. 30489, 27/01/2017. País, p. 8