O Estado de São Paulo, n. 45012, 12/01/2017. Política, p. A5

Advogados criticam súmulas de tribunal

 
Fábio Fabrini
Fausto Macedo

 

Advogados de alvos da Lava Jato criticam as súmulas aprovadas pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região. Afirmam que a decisão fere a legislação e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e, por isso, dão margem a questionamentos na Justiça.

Para o criminalista José Roberto Batochio, que representa o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, além dos ex-ministros Guido Mantega e Antonio Palocci, o TRF4 está interpretando a lei “contra a letra da lei” ao prever as prorrogações sucessivas de interceptações telefônicas.  “A lei diz que são 15 dias, prorrogáveis por mais 15. Então, por que ir além dela?”, questiona. “Quem legisla sobre direito processual penal no Brasil ainda é o Congresso. E me parece que (a súmula) vai contra o entendimento majoritário do STF.”

O advogado Pedro Ivo Velloso, um dos responsáveis pela defesa do ex-presidente da Câmara

Eduardo Cunha (PMDB-RJ), diz que a “súmula dos grampos” é “absolutamente ilegal”. “A jurisprudência atual do Supremo é no sentido de que a renovação só pode acontecer se houver complexidade nos fatos investigados e se o pedido for baseado em elementos concretos novos, colhidos no período anterior (da interceptação telefônica)”, afirma.

‘Genérico’. Em relação à súmula que trata de denúncia anônima, Velloso alega que, embora não seja errado, o entendimento é muito genérico ao não caracterizar o que seria um indício suficiente para a abertura de uma investigação.

“Não pode ser só o indício a justificar, tem de haver uma investigação (prévia) para confirmar a denúncia. Quando o denunciante não se expõe, é necessário ter muito mais reserva. Senão, o risco é de instrumentalização da atividade policial por interesses escusos.”

O advogado Antônio Claudio Mariz de Oliveira, que defende um ex-executivo da Camargo Corrêa, avalia que as duas súmulas do TRF4, “além de não apresentarem caráter vinculante, são de duvidosa validade quanto ao seu conteúdo, pois representam mais um movimento punitivo que despreza as garantias individuais”. “A complementação de outro indício não apaga a ilegalidade da denúncia anônima, pois fica num campo meramente subjetivo de avaliação do que é indício”, afirma. “Essa súmula é mais um fator de instabilidade e de insegurança jurídica”, diz.

O criminalista Roberto Podval, que defende o ex-ministro José Dirceu, afirma ver “um grande retrocesso”. “As sucessivas renovações do grampo contrariam a legislação. E as denúncias anônimas vão criar uma situação de acusações desenfreadas e, muitas vezes, com interesses pouco louváveis. Caminhamos para um País ainda mais policialesco, ninguém ganha com isso”, diz Podval.

 

'Nada jurídico’

“A súmula que trata da denúncia anônima está contrariando orientação pacífica dos nossos tribunais no sentido de que denúncia anônima é um nada jurídico”

Antônio Claudio Mariz de Oliveira

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Juíza manda petista provar falta de recursos

 
Julia Affonso
Ricardo Brandt

 

A juíza federal Gabriela Hardt, substituta de Sérgio Moro, que está em férias, na 13.ª Vara Federal de Curitiba, mandou a defesa do ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira “comprovar a ausência de recursos hábeis” para pagar a fiança de R$ 1 milhão imposta por Moro para soltar o petista da prisão. Ferreira foi detido preventivamente na Operação Abismo, 31.ª fase da Lava Jato, deflagrada em julho de 2016.

O valor da fiança foi estipulado pelo magistrado em 16 de dezembro. Desde então, a defesa de Ferreira entrou com pedidos de reconsideração para que a Justiça aliviasse o pagamento de R$ 1 milhão, alegando que o ex-tesoureiro está “desempregado e com dívidas”.

A juíza havia pedido que os defensores do petista indicassem um imóvel para cobrir o valor da fiança. Os advogados informaram que o ex-tesoureiro não tinha um imóvel para dar como garantia. Em 29 de dezembro, a defesa reclamou da situação de Ferreira. Plantão. Na segunda-feira, a magistrada afirmou que, “entre os dias 20 de dezembro de 2016 a 6 de janeiro de 2017, a Justiça Federal do Paraná funcionou sob regime de plantão durante o qual esta magistrada não estava designada para atuar”. “Caberia, portanto, ao próprio advogado submeter a questão de pronto ao Juízo plantonista caso pretendesse a análise imediata do pleito formulado”, anotou Gabriela Hardt. “Em que pese o tempo decorrido desde a fixação da fiança, o fato é que cabe à defesa comprovar a ausência de recursos hábeis a garanti-la.”

Gabriela afirmou ainda que “a fiança é imprescindível para garantir a presença do acusado no processo e na execução da pena no caso de condenação, devendo somente ser dispensada quando a situação econômica do preso for comprovadamente precária, o que não é o caso”.

“A verdade é que a real situação econômica do acusado ainda não foi totalmente esclarecida”, anotou a juíza. Gabriela Hardt apontou para uma aquisição de carta de crédito de consórcio no valor de R$ 100 mil em 23 de janeiro de 2007. Segundo a magistrada, foram pagos R$ 123.905,15 até 31 de dezembro de 2014, “restando, em 31 de dezembro de 2015, 13 parcelas a serem pagas”. “Não há informações a respeito de eventual contemplação do acusado no consórcio. Duas são as hipóteses possíveis, em tese. Não houve ainda contemplação e o valor existente pode ser penhorado para garantir a fiança imposta. Ou houve contemplação e o valor da carta de crédito foi utilizado possivelmente para aquisição ou reforma de um imóvel”, observou.