Pouca tradição em cassar mandatos

Paulo de Tarso Lyra

03/04/2017

 

 

Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que inicia nesta semana o julgamento do processo contra a chapa Dilma-Temer, só apeou do poder três governadores nos últimos 10 anos. Especialistas acham que crise política pode mudar esse cenário

 

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que iniciará amanhã o julgamento mais importante de sua história – o pedido de cassação da chapa Dilma-Temer –  é uma corte com pouca tradição em condenar governantes. Ao longo dos últimos 10 anos, de todos os processos que chegaram à Suprema Corte Eleitoral, apenas três redundaram em cassação: Marcelo Miranda (PMDB-TO), Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) e Jackson Lago (PDT-MA). Todos esses perderam os mandatos antes de 2010. Da turma eleita em 2014, 12 governadores estão sendo processados, seja ainda em nível estadual (TREs) ou em nível nacional. No TSE, nenhuma condenação.

Uma dessas situações é a do governador do Pará, Simão Jatene (PSDB), que tem uma representação contra ele na mesma corte que poderá cassar o mandato de Temer e tornar Dilma inelegível. Na última quinta-feira, o Tribunal Regional Eleitoral cassou o mandato do tucano, bem como o do seu vice, Zequinha Marinho, por abuso de poder econômico e político. Ambos podem recorrer ao TSE, o que aumentará as demandas da Corte.

A crítica feita ao tribunal é que, mesmo nos casos em que houve decisão final pela perda de mandato, só foram prejudicados administradores de estados menos influentes do Norte e Nordeste. Nenhum governante de estados de peso, como os localizados nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, foram cassados. Tampouco representantes de estados fortes do Nordeste, como Pernambuco e Bahia.

O Tribunal, agora, terá diante de si um panorama muito mais complexo: o que estará em jogo é o mandato de um presidente da República, que herdou o cargo após um processo de impeachment da titular da chapa (Dilma Rousseff), em agosto do ano passado. Parlamentares importantes apostam que o desfecho será positivo para o governo. Pelo histórico e  pelo presente. Além de não haver uma tradição da corte de suspender mandatos, o momento seria muito diferente do vivido no ano passado, afirmou um tucano. “Diferentemente do período em que o PT estava no poder, as ruas não estão cheias, a base aliada está agrupada e os agentes econômicos apostam que o governo é capaz de tirar o país da crise”, resumiu o parlamentar do PSDB.

Outro ponto que pode pesar a favor do governo Temer é a pressão política de aliados poderosos. Parlamentares graduados lembram que até mesmo quem perdeu o mandato em anos anteriores foi derrotado por ser adversário de inimigos poderosos. Foi o caso do ex-governador do Maranhão, Jackson Lago – cassado em 2009 e morto dois anos depois. Ao ser cassado, o TSE decidiu por empossar, imediatamente, a segunda colocada nas eleições de 2006, a peemedebista Roseana Sarney.

Durante o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa — algoz do PT no processo do mensalão — criticou a composição do TSE. “O TSE é um órgão cuja composição não ajuda”, disse Barbosa, mencionando a presença na instituição de membros que também exercem simultaneamente a atividade advocatícia. Para o ex-magistrado, o TSE tem se mostrado capaz de tirar do poder no máximo governadores de estados menores, mas não um presidente da república.

O próprio impeachment pode mudar isso. “A descrença da população pode ajudar. Em outros tempos, um processo como esse, contra o Temer, jamais chegaria ao plenário”, afirmou ao Correio o diretor do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), juiz Márlon Reis.

Um tribunal que pouco condena
Entre 2006 e 2010, apenas três governadores foram cassados
- Marcelo Miranda (PMDB-TO)
Junho de 2009, por abuso do poder econômico

- Cássio Cunha Lima (PSDB-PB)
Novembro de 2008, sob a acusação de ter distribuído 35 mil cheques a cidadãos carentes durante a campanha eleitoral de 2006, por meio de programa assistencial da Fundação Ação Comunitária (FAC)

- Jackson Lago (PDT-MA)
Abril de 2009, por abuso de poder político

De 2014 para cá, processos contra 12 governadores estão em andamento. Alguns ainda estão em tramitação nos respectivos TREs. 
Até o momento, nenhuma sem condenação
Confúcio Moura (PMDB-RR) – concluído
Pedro Taques (PDT-MT) - concluído


Ainda estão em tramitação
José Melo (PROS-AM)
Waldez Goés (PDT-AP)
Marconi Perillo (PSDB-GO)
Wellington Dias (PT-PI)
Marcelo Miranda (PMDB-TO)
Reinaldo Azambuja (PSDB-MS)
Simão Jatene (PSDB-PA) – condenado no TRE, recurso ao TSE
Ricardo Coutinho (PSB-PB)
Camilo Santana (PT-CE)
Beto Richa (PSDB-PR)
Fernando Pimentel (PT-MG)

 

 

Correio braziliense, n. 19669, 03/04/2017. Política, p. 2.