Governo recua para tentar aprovar reforma

Alessandra Azevedo, Julia Chaib e Marlene Gomes

07/04/2017

 

 

Com aval de Temer, relator da proposta que muda as aposentadorias fará cinco modificações no texto original do Executivo. Regras de transição serão mais suaves, mas idade mínima de 65 anos será mantida. União deixará de economizar R$ 115 bilhões

 

A reforma da Previdência será alterada em pelo menos cinco pontos em relação à proposta original enviada pelo Executivo ao Congresso: regra de transição, aposentadoria rural, Benefício de Prestação Continuada (BPC), pensões e previdência de professores e policiais, confirmou ontem o relator da matéria na Câmara, deputado Arthur Maia (PPS-BA). Com as mudanças, a economia gerada pelaa reforma será reduzida em 17% na próxima década, segundo a Casa Civil. Isso corresponde a R$ 115,3 bilhões dos R$ 678 bilhões esperados inicialmente pelo governo.
As mudanças, que serão consolidadas no relatório que será apresentado por Maia em 18 de abril, compreendem “a situação do homem e da mulher do campo, que, pelas adversidades que enfrentam na área rural, precisam de condições diferenciadas”, reconheceu o presidente Michel Temer. O presidente garantiu, ainda, que as pessoas com deficiência “terão um olhar especial” do governo. “Seria inadequado que eles não tivessem o que têm hoje”, justificou.
Apesar de assumir a necessidade de atualização do texto, o relator não deixou claro quais serão as mudanças, na prática. Ele sinalizou como poderá ficar a regra de transição, que, no texto original, prevê que homens com mais de 50 anos e mulheres acima de 45 paguem um pedágio de 50% sobre o tempo que falta para a aposentadoria. Todos os nascidos antes dessa linha de corte seriam afetados. Segundo Maia, há duas possibilidades em estudo: “Uma seria a combinação entre idade mínima e tempo de contribuição. A outra proposta poderia ser estabelecermos uma idade mínima como regra de transição, e dizer, por exemplo, que ninguém pode se aposentar com menos de 55 anos, 57 anos”, disse.

Emendas
Maia também não definiu quais serão as mudanças em relação ao BPC, devido a idosos e deficientes de baixa renda. Mas, em reunião com a liderança do PSDB, na última quarta-feira, ele teria garantido que o vínculo com o salário mínimo será mantido para os portadores de deficiência. “Para idosos, ele ainda pensa em manter idade de 70 e não ter vinculação ao salário mínimo. Também cogitou colocar 65 com meio salário mínimo e ir aumentando até 70 anos”, disse o deputado Eduardo Barbosa (PSDB-MG).
No encontro com o PSDB, o relator também teria dito que acolherá duas emendas do partido: uma que proíbe benefícios com renda inferior a um salário mínimo e outra que garante regras especiais para aposentadoria por invalidez. Ainda há dúvidas em relação ao acúmulo de pensão com aposentadoria, possibilidade que é vetada no texto original. Segundo Barbosa, Maia sugeriu permitir o acúmulo se a soma dos valores resultar em até dois salários mínimos. “Isso não contempla muita gente. Nós defendemos que o limite seja o teto do regime geral”, criticou o tucano.
A idade mínima de 65 anos, no entanto, continua sendo intocável, de acordo com o relator. “O que se pede é que haja uma flexibilização da mulher, que não é um ponto que pretendemos incluir no nosso relatório”, disse.

Pressão
As alterações foram feitas após pressão de parlamentares e a constatação do governo de que a proposta não passaria se não fosse revisada. “Não vou tapar o sol com a peneira: com o texto proposto, sem mudanças, teríamos dificuldade de aprovação”, reconheceu o presidente da comissão especial, Carlos Marun (PMDB-MS).
A decisão de ceder em pontos polêmicos deve melhorar o apoio à reforma, “tanto no Congresso quanto entre a sociedade”, disse o líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (DEM-PB). Os ajustes, na opinião dele, são necessários e ocorreriam “agora ou no momento da discussão do parecer”. “O governo vai fazer a reforma possível, dentro da capacidade. Se não dá para dar o grande salto agora, que se dê um passo à frente.”
Mesmo com as mudanças anunciadas ontem, Benedito Souza, 52 anos, empregado de uma empresa de serviços gerais, continua preocupado com a possibilidade de não se encaixar nas futuras regras. Em janeiro, ele fez uma simulação em uma agência do INSS e descobriu que, naquela data, faltavam três anos e 10 meses para se aposentar, tempo que considerou razoável. Agora, torce para não ser afetado pela reforma. “O governo deveria manter as leis para quem falta apenas 20% do tempo que ainda deveria trabalhar”, sugeriu.
A PEC também foi um alerta para o autônomo Leandro Rosa, 41, que só teve carteira assinada durante um ano e meio e nunca teve a preocupação de contribuir ao INSS durante o tempo em que foi vendedor ambulante. No ano passado, ele começou a prestar atenção às notícias sobre a reforma da Previdência. Há quatro meses, passou a contribuir como autônomo. “Faltou orientação, mas comecei a ficar preocupado. Quando a gente é mais jovem, não pensa muito.”


Presidente do Postalis critica TCU
Citado no acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) que apontou irregularidades em investimentos do Postalis, o fundo de pensão dos Correios, o presidente da entidade, André Luís Carvalho da Motta e Silva, se disse perplexo. Ele afirmou que não foi citado no relatório da CPI dos fundos de pensão nem autuado pela Superintendência de Previdência Complementar (Previc). “Causa–me estranheza o fato de a pessoa que mais diligenciou ações no sentido de proteger o patrimônio dos planos e corrigir problemas relacionados à atuação do Mellon, explodindo a árvore de fundos, provisionando todos os ativos inadimplentes e movendo ações contra o banco, esteja sendo acusada de negligência em relação à fiscalização”, declarou.

 

 

Correio braziliense, n. 19673, 07/04/2017. Economia, p. 7.