STF vai decidir o que é permitido em casos de zika 
15/01/2017
 
 
Primeira Turma entende não ser crime interromper gravidez até terceiro mês

-SÃO PAULO- O Supremo Tribunal Federal (STF) deve decidir este ano se autoriza o aborto em casos de zika, vírus que provoca a microcefalia. No fim do ano passado, ministros da Primeira Turma da Corte entenderam, durante julgamento, não ser crime a interrupção voluntária da gravidez até o terceiro mês da gestação. Não há ainda, na esfera do STF, discussão sobre autorização ou não do aborto em caso da Síndrome de Edwards.

A decisão do Supremo pode abrir uma brecha para a descriminalização do aborto até o terceiro mês de gravidez. Enquanto não há definição sobre o tema, magistrados se dividem entre o dever do Estado e o direito da mulher.

O desembargador do Rio de Janeiro Siro Darlan não autorizou um pedido de aborto por Síndrome de Edwards que chegou a ele em 2015. Ao GLOBO, Darlan justificou ter se preocupado com a saúde da mãe, que já estava no sétimo mês de gravidez. Ele afirma, no entanto, que teria tomado outra decisão “se a solicitação tivesse chegado mais cedo”.

— Sou católico praticante, e portanto sou contra o aborto. Mas entendo que o direito é à vida com dignidade. Se já há um diagnóstico médico atestando que essa criança não terá uma vida plena, tem que se ouvir a mãe em primeiro lugar. Já deferi aborto de meninas com problemas mentais, vítimas de estupro — lembra ele.

LIBERDADE DE ESCOLHA

O juiz Thiago Baldani De Filippo, de Assis, a 400 quilômetros de São Paulo, concorda, e diz que o Estado não pode exigir que uma mãe mantenha a gravidez em casos como esse. Em novembro do ano passado ele autorizou o aborto a uma mulher após diagnóstico da Síndrome de Edwards.

— O direito à vida deve prevalecer, mas nesse caso devemos ceder à liberdade de escolha da gestante. É louvável uma mulher que opta por levar adiante uma gravidez como essa, mas o Estado não deve exigir isso da pessoa

Os advogados André Reinaldo de Faria Pereira e Percília Marques Dutra Maciel representaram, ano passado, uma mãe que pleiteava o direito ao aborto após diagnóstico da Síndrome de Edwards. A Justiça não concedeu, e a criança faleceu após o nascimento.

— Podemos afirmar com convicção que, apesar de termos o nosso pedido indeferido, tivemos uma experiência única defendendo um caso como este e aprendemos a seguinte lição: no mundo jurídico muitas vezes é necessário deixar a razão (legalidade) de lado e agir com compaixão para com o próximo.

O globo, n. 30477, 15/01/2017. País, p. 10