BC reduzirá juros para 11,25% na quarta-feira

Antonio Temóteo

10/04/2017

 

 

Quadro político conturbado e tensões mundiais farão com que autoridade monetária mantenha cautela e corte a Selic em apenas um ponto percentual. Apesar do arrefecimento da inflação, diminuição mais intensa da taxa é descartada pelo mercado

 

A profunda recessão econômica e o contínuo processo de arrefecimento da inflação permitiriam ao Banco Central (BC) cortar os juros em mais de um ponto percentual na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que começa amanhã e termina na quarta-feira, avaliam economistas. Mas, apesar das condições macroeconômicas favoráveis para acelerar a redução da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 12,25%, os mesmos especialistas avaliam que a equipe de Ilan Goldfajn será cautelosa, diante do quadro político conturbado e das tensões mundiais.
No mercado, o resultado do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de março, que cravou alta de 0,25% — abaixo do 0,28% projetado pela diretoria do BC no Relatório Trimestral de Inflação (RTI) —, reforçou o discurso de quem espera uma atuação mais agressiva da autoridade monetária para reduzir os juros. Esse desempenho levou a inflação do primeiro trimestre, de 0,96%, ao menor nível desde o início do Plano Real, em 1994.
Quem conhece a equipe de Ilan avalia que, mesmo com o ambiente favorável para cortes mais profundos na Selic, o BC será cautelosa e manterá o discurso de aceleração moderada na condução da política monetária . Na última reunião do Copom, o BC surpreendeu o mercado com corte nos juros de 0,75 ponto percentual, quando a maioria das apostas era de que a redução seria de 0,5 ponto. Apesar do quadro atual, o mercado descarta uma nova surpresa.

Preocupações
Técnicos da autoridade monetária ressaltam que as principais preocupações dos diretores do BC, no momento, são a escalada das tensões globais — com os ataques dos Estados Unidos à Síria — e o aumento da percepção de que a reforma da Previdência não deve ser aprovada no Congresso Nacional. Sem o aval dos parlamentares para mudar as normas para concessão de benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), a trajetória de crescimento da dívida pública não mudará e as contas públicas continuarão fragilizadas.
Além disso, a incursão militar norte-americana contra armas químicas desagradou a Rússia e um eventual conflito entre as duas maiores potências bélicas mundiais provocaria histeria nos mercados globais, empurrando o dólar para cima, o que pressionaria a inflação. Com isso, o BC seria obrigado a interromper o ciclo de afrouxamento monetário e até a alta de juros voltaria a ser debatida.
Com a inflação caminhando para o centro da meta, de 4,5%, a taxa de juros ainda se encontra em patamar contracionista, avalia o economista da Daycoval Investimentos, Rafael Cardoso. Para ele, promover cortes superiores a um ponto percentual na Selic favoreceria empresas e famílias que estão endividadas e teriam melhores condições para renegociar os débitos.
Cardoso defende cortes mais intensos na taxa de juros. “Os próximos meses deixarão claro para o BC que a trajetória de inflação é benigna e que a atividade econômica continuará fraca. A inflação tem caído de maneira acentuada e, com o passar do tempo, a autoridade monetária dará mais peso ao IPCA do próximo ano. E as expectativas estão ancoradas”, explica. Na opinião dele, o BC fará dois cortes seguidos de um ponto percentual e uma terceira redução nesse patamar não está descartada, diante da fraqueza da atividade econômica e da inflação comportada.

Supresas
O nível de ociosidade da atividade produtiva e as surpresas inflacionárias favoráveis justificariam um corte superior a um ponto percentual na Selic, afirma o economista-chefe do banco ABC Brasil, Luis Otávio de Souza Leal. Entretanto, ele ressalta que o que mantém o conservadorismo da autoridade monetária são as incertezas internas e externas.
Leal destaca que a equipe de Ilan Goldfajn não quer reduzir os juros agressivamente e ter de subir a taxa diante de uma surpresa negativa. “Os riscos de calda são bastante altos. O principal deles é a reforma da Previdência. Se o texto estivesse bem encaminhado no Congresso, o BC seria mais abrasivo. Mas não é isso que temos observado”, diz.
O economista-chefe do Banco Haitong, Jankiel Santos, também aposta em queda e um ponto da Selic na quarta-feira, mas ressalta que, mais importante do que o recuo da taxa para 11,25% serão os sinais que o BC dará sobre o futuro. Para ele, haverá menção aos fatores condicionantes tanto para manutenção do ritmo, quanto para alteração da magnitude dos cortes nas próximas reuniões do Copom.
Na opinião de Santos, as dificuldades recentes nas discussões para a reforma da Previdência e eventuais sinais de estabilização da economia até a reunião de 31 de maio deverão fazer com que o BC reduza o ritmo de corte de juros. “Não significa que o ciclo  de abrandamento será encerrado, já que nosso cenário contempla redução da Selic para o patamar de 9% em outubro. Porém, a queda se dará em ritmo mais lento do que o consenso de mercado”, alerta.



Estímulo
As decisões do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC) de reduzir, subir ou manter a taxa básica de juros (Selic) afetam a vida de todos os brasileiros. Quando a taxa aumenta, quem tem dívidas, por exemplo, enfrenta ainda mais dificuldades para tomar crédito. Por outro lado, os poupadores ganham mais com suas aplicações, sobretudo as de renda fixa. A Selic é um parâmetro para as outras taxas praticadas pelo mercado, influenciando a rentabilidade dos investimentos e os juros cobrados em financiamentos e empréstimos. Em tese, os juros mais baixos têm potencial para alavancar a economia, por meio do estímulo ao consumo e aos investimento.

 

 

Correio braziliense, n. 19676, 10/04/2017. Economia, p. 6.