O Estado de São Paulo, n. 45019, 19/01/2017. Política, p. A4

Forças-tarefa vai retomar 20 delações após Odebrecht

                                                                                                                                                                                                                                                       
Ricardo Brandt
Fausto Macedo
Fábio Serapião

 

A conclusão do acordo de colaboração da Odebrecht vai reabrir as tratativas para cerca de 20 delações premiadas de investigados na Operação Lava Jato. A lista inclui executivos de empreiteiras, ex-agentes públicos, lobistas e operadores financeiros acusados de corrupção na Petrobrás.

As negociações foram suspensas no fim de 2016 para aguardar a confirmação do acordo com a Odebrecht – que tem 77 delatores e ainda precisa ser homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Um dos motivos que levaram à paralisação é o volume de informações que executivos e ex-executivos da empreiteira devem fornecer sobre crimes envolvendo autoridades e que podem ser usadas para nortear futuros acordos.

A quantidade de delatores relacionados à Odebrecht também fez com que a força-tarefa concentrasse esforços nos mais de 900 depoimentos do grupo.

Entre os candidatos a delatores estão o ex-diretor da Petrobrás Renato Duque, o ex-marqueteiro do PT João Santana, o lobista Adir Assad, além de executivos das empreiteiras Mendes Júnior, Galvão Engenharia, Delta e EIT. Com cláusula de sigilo obrigatório para as tratativas, as defesas dos investigados não comentam os acordos.

Todos na lista iniciaram conversas com o Ministério Público Federal, por meio de advogados, em busca de uma redução de pena nos processos sob responsabilidade do juiz federal Sérgio Moro – que julga os casos de alvos sem foro privilegiado. Algumas se arrastam, sem definição, há quase um ano.

Em quase três anos de investigações, a força-tarefa em Curitiba fechou 71 acordos de delação e sete de leniência (espécie de colaboração premiada de empresas). Há outras 24 homologadas pelo Supremo.

‘Efeito Odebrecht’. Procuradores da Lava Jato em Curitiba e Brasília ouvidos pela reportagem afirmaram que as negociações de novas delações sofrerão uma espécie de “efeito Odebrecht”.

As revelações feitas por executivos do grupo devem levar mais empresas, negócios, políticos e operadores financeiros para o foco das apurações.

Um dos fatores é o elevado volume de provas guardado no Setor de Operações Estruturadas, o chamado “departamento da propina” da Odebrecht. Pela lei, em busca de uma redução de pena, os candidatos a delator têm de confessar crimes e apresentar fatos desconhecidos dos investigadores, além de provas sobre o que dizem.

Em alguns casos nos quais as negociações podem ser retomadas, as tratativas foram encerradas justamente por falta de informação ou provas relevantes, afirmou em reservado um dos investigadores. Foi o que aconteceu, por exemplo, com as tratativas para um acordo com as empreiteiras OAS e Engevix.

Núcleo político. Com a homologação da delação da Odebrecht, a força-tarefa espera também que aumente a procura por acordos por integrantes do núcleo político da organização acusada de corrupção na Petrobrás.

Até agora, apenas duas delações são de políticos: a do senador cassado Delcídio Amaral (sem partido-MS) e a do ex-presidente da Transpetro e ex-deputado Sérgio Machado.

Outro político que fez acordo com a Lava Jato é o ex-deputado federal Pedro Corrêa, ex-líder do PP, condenado no mensalão, em 2012, e pelo juiz Sérgio Moro, no caso Petrobrás, em 2016. Sua delação, no entanto, aguarda homologação no STF, que pediu mais provas e uma redução nos depoimentos.

Os advogados de Renato Duque, Adir Assad e João Santana não quiseram comentar, por envolver assunto sob sigilo. A defesa da EIT também não se manifestou. Os representantes da Galvão, Delta e Mendes Júnior não foram localizados.

 

À ESPERA

Tratativas de acordos de delação premiada que estavam suspensas serão retomadas pela força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba após a conclusão do processo da Odebrecht
 
 
 

QUEM É

João Santana, publicitário

SITUAÇÃO

Réu na Lava Jato, responde pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Preso em fevereiro de 2016, foi solto 6 meses depois.

INVESTIGAÇÃO

- ‘Acarajé’

Responsável pelas campanhas de Lula e Dilma, Santana teve a prisão decretada na 23ª fase da Lava Jato, em fevereiro de 2016. Mônica Moura, sua mulher e sócia, também foi alvo de mandado de prisão. Acarajé apurou pagamentos feitos pela Odebrecht a Santana no exterior.

- Tratativas

Santana negocia um acordo na Lava Jato desde julho do ano passado. As delações da Odebrecht, que pagou o marqueteiro no Brasil e no exterior, devem aumentar as exigências em relação a uma eventual colaboração do marqueteiro.

 

QUEM É

Renato Duque, ex-diretor da Petrobrás

SITUAÇÃO

Já foi condenado a 50 anos, 11 meses e 10 dias de prisão, em três ações penais da Operação Lava Jato. Está preso desde 16 de março de 2015.

INVESTIGAÇÃO

- ‘Juízo final’ e ‘Que país é esse?’

Ex-diretor de Serviços da Petrobrás, Duque foi preso duas vezes, na 7ª fase da Lava Jato, em novembro de 2014 e, na 10ª, em março de 2015. Braço direito de Duque, Pedro Barusco disse que o PT arrecadou, em 10 anos, R$ 100 milhões em propinas, via área de Serviços.

- Tratativas

O ex-diretor de Serviços da Petrobrás tenta, pela terceira vez, fechar um acordo de colaboração premiada com a força- tarefa. Agora, com o “efeito Odebrecht”, Duque é apontado como o representante do PT no esquema na estatal.

 

 

QUEM É

Adir Assad, empresário

SITUAÇÃO

Já foi condenado a 9 anos e 10 meses de prisão em uma ação penal da Operação Lava Jato. Está detido desde 19 de agosto do ano passado.

INVESTIGAÇÃO

- ‘Que país é esse?’ e ‘Dragão’

Empresário foi alvo de duas fases da Lava Jato. A Operação Dragão, em novembro, mirou em operadores que atuavam para a Odebrecht – Assad foi apontado como um dos responsáveis por pagamentos do Setor de Operações Estruturadas, o “departamento da propina” da empresa.

- Tratativas

O conteúdo de eventual delação do empresário poderia expandir as apurações para além da Petrobrás. Assad, segundo investigações, controlava uma rede de empresas de fachada que teria movimentado mais de R$ 1 bilhão em propinas.

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Juiz aponta farsa e nega transferência de Valério


Leonardo Augusto

 

Marcos Valério Fernandes de Souza, que cumpre pena de 37 anos de prisão na Penitenciária Nelson Hungria, em Contagem (MG), é suspeito de prestar informação falsa à Justiça ao pedir transferência para outra unidade prisional de Minas – a Associação de Proteção e Assistência ao Condenado (Apac), da cidade de Lagoa da Prata.

No pedido de transferência feito ao Supremo Tribunal Federal (STF), Valério informou que sua mãe e sua companheira moravam na cidade. A informação foi revelada pelo jornal O Globo. A solicitação foi aceita pelo ministro Luís Roberto Barroso em 19 de dezembro, sob a condição de que a decisão final caberia ao juiz da comarca local.

A Apac prevê assistência espiritual e orientação para atividades artísticas e o controle sobre os presos é mais ameno do que o das penitenciárias do Estado.

Ao negar a transferência, o juiz Aloysio Libano de Paula Junior disse que constatou, por visita própria e com o envio de um oficial de justiça, que no endereço informado não viviam parentes de Valério.

A Procuradoria-Geral da República informou que, se for confirmada suspeita de falsidade ideológica, poderá haver impacto na pena que Valério cumpre. A investigação será feita pela comarca de Lagoa da Prata.

A defesa argumentou no pedido de transferência que Valério vinha sofrendo ameaças na penitenciária e que o ambiente do presídio prejudica a delação que ele negocia com a Procuradoria- Geral da República. Procurado, o advogado de Valério, Jean Robert Kobayashi, não respondeu aos contatos.