Nova legislação tira o Brasil do atraso

Simone Kafruni e Mirelle Bernardino

16/04/2017

 

 

Lei que amplia terceirização coloca o país em linha com outras nações que adotam regras semelhantes. Para especialistas, impacto mais imediato na geração de empregos virá das alterações nas normas de contratação temporária

 

 

A terceirização é uma prática comum há anos no Brasil. Porém, não tinha regulamentação e era julgada com base na Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que permitia a terceirização apenas das atividades-meio, o que gerava insegurança jurídica para os empregadores e incerteza sobre a garantia de direitos para os trabalhadores. A Lei 13.429/2017, que trata dos trabalho terceirizado e do  temporário, sancionada pelo presidente Michel Temer em 31 de março, pretende dar um fim à polêmica ao possibilitar a terceirização em todas as áreas. Além disso, em meio à crise, ela tem o objetivo de gerar efeitos econômicos positivos, como a criação de empregos e o aumento da competitividade e produtividade nas empresas.A repercussão na economia, no entanto, deve ser mais imediata por conta das alterações nas regras do trabalho temporário, também tratadas na lei, do que, efetivamente, pela tentativa de regulamentar a prestação de serviços terceirizados, apostam especialistas. Sobre a terceirização, especificamente, muitos a consideram vaga, o que pode ensejar uma multiplicidade de interpretações. Por isso, ela ainda não traria a segurança jurídica necessária para impulsionar investimentos e gerar emprego.O próprio presidente Michel Temer, após a sanção, admitiu que, se preciso, o governo criaria salvaguardas para proteger direitos trabalhistas. “Aliás, a lei não trata exatamente da terceirização Em primeiro lugar, trata do trabalho temporário”, disse Temer.Nos Congresso, a falta de especificidades da lei provocou a ressurreição do Projeto de Lei Complementar 30/2015. Originariamente Projeto de Lei 4.330/2004, da Câmara dos Deputados, o PLC, que trata exclusivamente da terceirização, estava parado no Senado. Relatada pelo senador Paulo Paim (PT-RS), a proposta ganhou celeridade após a sanção da Lei 13.429 e deu entrada, em 3 de abril, na Comissão de Assuntos Econômicos da Casa. Não sem gerar mais controvérsia.

 

Opção

Apesar de a polêmica sobre terceirização persistir, as mudanças no trabalho temporário promovidas pela Lei 13.429 são positivas e devem surtir efeito quase imediato no mercado de trabalho, na opinião de Ermínio Lima Neto, vice-presidente da Central Brasileira do Setor de Serviços (Cebrasse). “O trabalho temporário é a melhor opção para gerar vagas imediatamente, sobretudo em tempos de crise”, avalia.Para o especialista, a extensão do prazo de contratos temporários de 180 para 270 dias atende necessidades urgentes, como a substituição de trabalhadores que estão em gozo do auxílio-maternidade ou do auxílio-doença, que são períodos longos. “Além do mais, permite ao empreendedor uma avaliação melhor do investimento. Ele pode contratar e, se o negócio não der certo, dispensar os temporários. Isso porque 180 dias é pouco tempo para uma empresa saber se vai ter sucesso. Se tiver, a efetivação, nesses casos, é de quase 100%”, explica.Émerson Casali, diretor da CBPI Produtividade Institucional e especialista em relações de trabalho, avalia que a lei reduz a insegurança na contratação de temporários. “Antes, a utilização dessa mão de obra estava muito limitada à substituição de pessoal ou ao acréscimo extraordinário do serviço”, assinala. Em um cenário de incerteza sobre a economia, é uma opção para o empresário ter tempo para entender se a demanda adicional se consolida e justifica contratações. “Ela evita a informalidade. Além disso, os índices de aproveitamento superam 50%.”

 

Lacuna

No caso da terceirização, porém, a Lei 13.429 deixa uma lacuna sobre atividade-meio ou fim e empurra novamente a decisão para a Justiça do Trabalho, no entender de Welton Guerra, advogado trabalhista do escritório Miguel Neto Advogados. “Há décadas, a Justiça entende que só é possível a terceirização na atividade-meio. Esse é o grande ponto controverso. Como advogado, interpreto que ela não possibilita a terceirização irrestrita”, diz.Guerra afirma que não houve mudanças bruscas. “A lei traz um pouco mais de segurança para o trabalhador, porque a empresa prestadora de serviços tem que ter capital social compatível com o número de empregados, e a tomadora passa a ser responsável pelo ambiente de trabalho”, exemplifica.

A grande vantagem da lei está em tirar algumas empresas de uma zona cinzenta, pondera o advogado Fábio Chong, do escritório L.O. Baptista. “Mas a ideia de que a lei vai gerar emprego é equivocada. O que cria postos é o crescimento econômico. Na minha opinião, a lei define que todas as atividades podem ser terceirizadas. Mas nem todas serão. Cabe ao empresário decidir em quais áreas a terceirização vai garantir maior produtividade”, diz. Na administração pública, afirma Chong, o modelo implica um desafio maior pela força do funcionalismo. “Há menor vontade política de terceirizar no setor público”, afirma.

 

 

Correio braziliense, n. 19682, 16/04/2017. Economia, p. 8.