Mercosul negocia abertura para açúcar

Eliane Oliveira 

04/02/2017

 

 

Em visita de Macri, Brasil e Argentina discutirão também autopeças

Brasil e Argentina estão prestes a quebrar um tabu que já dura mais de 20 anos. Os dois países começarão a discutir o ingresso do açúcar na união aduaneira. Hoje, o produto brasileiro não entra no mercado argentino, embora os vizinhos o importem de outros países, entre os quais a Colômbia. O anúncio da retomada das negociações será feito na terça-feira, durante visita de Estado do presidente Maurício Macri a Brasília.

— O açúcar foi totalmente excluído do Mercosul. O tratamento dado ao Brasil é pior do que para um terceiro mercado (país que não faz parte do Mercosul). Tanto é que a Argentina importa açúcar de outros países, mas não da gente — disse o subsecretário-geral para América Latina e Caribe do Itamaraty, Paulo Estivallet de Mesquita, acrescentando que o etanol brasileiro também não entra na Argentina.

Apesar da disposição dos dois principais sócios do Mercosul no sentido de limpar o excesso de barreiras no comércio dentro do bloco, um tema espinhoso fará parte da agenda do encontro entre Macri e o presidente Michel Temer: o novo regime de autopeças argentino, que prevê créditos tributários de 4% a 15% a montadoras que dão preferência a peças nacionais. Ou seja, 30% da composição do veículo devem ser de autopeças produzidas na Argentina.

Segundo Estivallet, a questão é prioritária para o governo brasileiro.

— Isso nos causa preocupação, pelo fato de que há aspectos nesse regime que não nos parecem compatíveis com as normas da Organização Mundial do Comércio (OMC). Esse tema também está em pauta, com prioridade — afirmou o diplomata.

MAIOR SINTONIA POLÍTICA

Segundo Estivallet, há uma coincidência de posições entre os presidentes Macri e Temer, no sentido de se eliminar as barreiras no Mercosul que impedem o livre comércio. Ele citou como exemplo o setor automotivo, que também não é parte integrante do comércio livre dentro do bloco.

Existe, atualmente, um acordo automotivo entre Brasil e Argentina, com limitações no comércio de veículos isentos do Imposto de Importação. O que não fizer parte dessa cota é tributado com alíquota de 35%.

Especialista em negociações internacionais da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Fabrízio Panzini acredita que será difícil, a curto prazo, um acordo entre Brasil e Argentina para eliminar barreiras. Porém, ele destaca que a economia argentina está voltando a crescer e, com isso, a redução de entraves às importações de produtos brasileiros pode ser esperada.

— A Argentina tem demonstrado bastante apetite e interesse num alinhamento com o Brasil, para aumentar os acordos de livre comércio do Mercosul (também formado por Paraguai e Uruguai) com outros mercados — disse o especialista.

De acordo com Panzini, também deve ser lembrada a vontade política para se promover avanços no Mercosul, hoje sem a Venezuela. Para ele, Macri tem dado sinais de que as relações com o Brasil e o restante do bloco são prioritárias.

— É nisso que a gente aposta. Até porque, do nosso lado, houve uma reaproximação. A CNI e a UIA (União da Indústria Argentina) estão formando um conselho empresarial Brasil-Argentina — completou.

Atualmente, a Argentina ocupa a presidência pro tempore do Mercosul. Esse status será repassado ao Brasil em meados deste ano.

O globo, n. 30497, 04/02/2017. Economia, p. 18