Crescimento à vista 
João Sorima Neto 
11/02/2017
 
 
Meirelles vê alta do PIB no 1º tri. Para analistas, indicadores mostram reação da economia

Se a economia brasileira ainda não saiu completamente da recessão, pelo menos começou 2017 no que parece ser um ponto de inflexão, avaliam especialistas. E, no governo, a previsão é de retomada do crescimento econômico já neste primeiro trimestre. Em entrevista à colunista Míriam Leitão, que foi ao ar no site do GLOBO ontem, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) vai crescer entre 0,2 e 0,3% entre janeiro e março, na comparação com o fim do ano passado, depois de sete trimestres seguidos de queda. E, segundo Meirelles, no último trimestre deste ano, o país estará crescendo a um ritmo de 2%.

— Indicadores importantes, como produção de embalagens e carga de transporte rodoviário aumentaram em dezembro, assim como o consumo de energia, e a confiança de empresários e consumidores subiu em janeiro — justificou Meirelles sobre o otimismo em relação ao desempenho da atividade nesse trimestre.

AJUDA DA SAFRA E JUROS EM QUEDA

O ministro também citou o bom desempenho do setor agrícola, que será fundamental nesta retomada. O IBGE divulgou ontem a estimativa de uma safra recorde de grãos este ano, de 221,4 milhões de toneladas, o que representa um crescimento de 20,3% frente a 2016 — será a maior expansão anual desde 2003.

Para os analistas, indicadores de dezembro, como a alta na produção de veículos, já sinalizavam alguma luz na atividade econômica. E o desempenho de uma série de outros índices referentes a janeiro, como a volta da confiança dos empresários da indústria ao maior nível desde maio de 2014 e mesmo o desempenho positivo da Bolsa de Valores, que avançou 7,4% no mês, reforçam a impressão de que o pior da crise já passou. Embora o país ainda conviva com dados muito ruins, como o índice de desemprego na casa de 12% e o elevado endividamento das famílias, a avaliação de economistas, banqueiros e acadêmicos ouvidos pelo GLOBO é que a economia ganha, aos poucos, condições para engatar uma recuperação.

— Depois de três anos muito ruins, os sinais mistos apontam que chegamos a um ponto de inflexão. Ou seja, começamos a deixar a recessão para trás e a apontar para o crescimento. A diferença de outros soluços de melhora, vistos no ano passado, é que, desta vez, a taxa de juros está caindo, o que ajuda na recuperação da economia — analisa o ex-presidente do Banco Central e sócio da Consultoria Tendências, Gustavo Loyola.

José Márcio Camargo, professor de economia da PUC-Rio e sócio da Opus Consultoria, diz que é possível afirmar que a economia se estabilizou. Na prática, diz Camargo, estamos perto de começar a retomada do crescimento, o que deve ocorrer a partir de abril.

— Há muita diferença em relação ao ano passado, quando os indicadores antecedentes estavam ruins. Hoje, temos inflação em queda e, quando o desemprego parar de crescer, o que deve ocorrer em dois meses, vamos ter aumento de massa salarial real (soma do rendimento de todos os trabalhadores). É um cenário mais positivo num contexto de queda de juros — diz Camargo, que projeta uma variação do PIB próxima de zero neste primeiro trimestre, mas avançando nos trimestres seguintes para chegar a dezembro crescendo 2%, na comparação anualizada, suficiente para uma expansão média de 0,6% da economia no ano.

No início da semana, ao apresentar o balanço do Itaú, o presidente do banco, Roberto Setubal, afirmou que a economia tem perspectiva melhor para 2017, embora os indicadores mostrem que a recuperação ainda não será forte.

— Os sinais que vêm da economia ainda são muito inconsistentes. Mas já são melhores que alguns meses atrás. Para este ano, nossa projeção é de um crescimento de 1%, ainda pequeno, mas muito melhor do que os 3,5% de queda do ano passado — diz Setubal, também destacando que a queda de juros deve ajudar a impulsionar a atividade e que 2017 “pode até surpreender”.

Termômetro para a demanda na economia, a venda de papelão ondulado (usado em embalagens) subiu 3,3% em dezembro de 2016 ante novembro. Para a Associação Brasileira de Papel Ondulado (ABPO), não se trata ainda de um “ponto de inflexão”, mas ao menos não houve piora. Em relação a dezembro de 2015, entretanto, o número representou uma queda de 2,8%. Apesar disso, a expectativa da entidade é que a produção volte a ficar positiva em relação a 2016 já neste primeiro trimestre.

Outro dado animador veio das estradas. Em janeiro, o índice que mede o fluxo de veículos nas rodovias, da Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), teve crescimento de 1%. Foi o terceiro mês consecutivo de expansão, embora, no acumulado dos último 12 meses, acumule retração de 3,1%. O fluxo menor de veículos de passeio e pesados nas estradas está diretamente associado à deterioração do mercado de trabalho e à queda na produção industrial.

— Em 2017, esperamos que o índice apresente tendência favorável, embora esteja suscetível a oscilações diante da debilidade da demanda doméstica — explica Rafael Bacciotti, economista da Tendências que elabora o indicador.

Entre os sinais positivos que começaram a surgir no fim de 2016, está o dado de investimento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que subiu 3,9% em dezembro. O dado oficial só será divulgado pelo IBGE, em março, mas indicador é mais um antecedente positivo. Mesmo assim, o pesquisador do Ipea Leonardo Carvalho, responsável pelo índice, é cauteloso quanto ao desempenho do investimento este ano:

— Pode crescer, mas não será robusto. Há muita ociosidade, e, para aumentar a produção, basta que o empresário ligue uma máquina que estava parada. Quando o desemprego parar de crescer, e o empresário tiver um pouco mais de certeza que a economia está melhorando, o investimento volta de forma mais forte.

PESO DO FRACO RESULTADO DE 2016

A produção industrial, que há três anos consecutivos caindo, incluindo 2016, mostrou alguns sinais mais otimistas. Em novembro e dezembro passados, acumulou alta de 2,6%. Os dados abertos de dezembro mostraram que houve aumento no ritmo da atividade industriais em dez dos 14 locais pesquisados pelo IBGE.

Gustavo Loyola lembra que o indicador de crescimento econômico deste ano ainda será muito influenciado pelos efeitos estatísticos do fraco desempenho do ano passado. Para dar uma ideia do peso desse efeito, Loyola diz que, se a economia não crescesse nada este ano, o país terminaria 2017 com queda de cerca de 1,7% no PIB, devido ao fato de ter terminado 2016 com um nível muito baixo de atividade econômica.

— Na nossa avaliação, a economia vai ter uma expansão gradual, trimestre a trimestre, e pode chegar ao fim do ano com crescimento de 0,8%, ou até 1%. Mas, neste primeiro trimestre, ainda é difícil avaliar com precisão, pois praticamente só tivemos um mês cheio — ressalta.

O globo, n. 30504, 11/02/2017. Economia, p. 17