Especialistas preveem geração de vagas com mudanças na lei

Marcello Corrêa, João Sorima e Chico Prado

12/07/2017

 

 

Centrais sindicais criticam reforma e veem trabalhador enfraquecido

-RIO E SÃO PAULO- A reforma trabalhista aprovada no Senado tem potencial para gerar empregos, na avaliação de economistas e entidades empresariais ouvidos pelo GLOBO. O texto, porém, foi criticado por centrais sindicais.

Para o economista José Márcio Camargo, da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio, a reforma pode gerar mais vagas porque dá segurança ao empregador. Ele destaca a previsão do trabalho intermitente, que permite a contratação só por algumas horas ou dias da semana.

— Tem uma série de setores cuja própria atividade é intermitente, como construção civil e comércio. Uma vez aprovada a reforma, serão feitos contratos para esse momento. Isso significa que será possível formalizar trabalhadores que, na maior parte, são informais — afirma Camargo.

PROBLEMAS DE REGULAMENTAÇÃO

O economista Hélio Zylberstajn diz que a principal função da reforma será resolver problemas de regulamentação do mercado de trabalho, e não criar empregos, apesar dos estímulos que podem surgir nesse sentido:

— Há uma janela de inúmeras oportunidades para que uma empresa consiga, por exemplo, trabalhar as jornadas dos seus funcionários. Poder reduzir o horário de almoço vai permitir uma melhor organização de turnos, e isso pode gerar emprego se souberem usar o instrumento.

Para Luciana Freire, diretora executiva jurídica da Fiesp, o ponto mais importante é a previsão de que acordos e convenções se sobreponham à legislação trabalhista em vários pontos, como jornada de trabalho e banco de horas — o chamado acordado sobre legislado:

— É muito importante que o que for negociado entre as partes seja respeitado pelo Poder Judiciário, pelo Ministério Público do Trabalho.

Já Claudio Dedecca, professor da Unicamp e especialista em mercado de trabalho, avalia que a reforma não ataca questões importantes, como a baixa produtividade do país.

— A reforma vai viabilizar um aumento de competitividade espúrio, por meio da redução do custo do trabalho. As experiências internacionais mostram que os países que procuraram fazer reforma para reduzir custos, tiveram aumento de competitividade muito efêmero — pondera.

O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, diz que o texto é um retrocesso. Já Miguel Torres, presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos, ligada à Força Sindical, avalia que a reforma é “um golpe para os trabalhadores”.

— Restringir a organização de sindicatos no Brasil é absurdo. Nos grandes centros, os sindicatos conseguem se organizar, mas e em outras regiões ? — disse.

PRINCIPAIS MUDANÇAS
Acordado sobre legislado

COMO É: Não está previsto na CLT, mas, na prática, isso já ocorre. Algumas empresas e sindicatos chegam a acordos diferentes do que está escrito na legislação trabalhista e os homologam na Justiça. Porém, esses acordos são constantemente questionados pelo Ministério Público.

COMO FICA: O acordado entre sindicatos e empresas passa a ter força de lei para uma lista de itens, entre eles jornada, participação nos lucros e banco de horas. São exceções direitos essenciais, como salário mínimo, FGTS, férias proporcionais e décimo terceiro salário.

Imposto sindical

COMO É: O imposto sindical é obrigatório. No caso do empregado, a contribuição equivale a um dia de trabalho por ano. Já o empregador deve recolher o tributo no mês de janeiro, e seu valor é estabelecido a partir de uma alíquota proporcional ao capital social da empresa.

COMO FICA: O texto retira a obrigação de contribuir tanto para patrões como para trabalhadores.

O QUE PODE MUDAR: Uma medida provisória estuda tornar gradual o fim da obrigação ou modificar esse cálculo.

Parcelamento de férias

COMO É: Pela CLT, as férias têm de ser concedidas em um só período. Somente em casos excepcionais, o trabalhador pode dividir as férias em duas vezes, uma delas não podendo ser inferior a dez dias.

COMO FICA: O relatório permite a divisão das férias em até três períodos, com a concordância do empregado. Um deles, no entanto, não pode ser inferior a 14 dias. Os outros dois restantes têm de ter mais de cinco dias corridos, cada. O texto também veda o início das férias no período de dois dias que antecede feriado ou dia de repouso semanal remunerado.

Jornada

COMO É: A jornada diária pode ser ajustada, desde que não ultrapasse dez horas por dia, mediante acordo escrito entre empregador e funcionário, ou por acordo coletivo.

COMO FICA: Continua podendo ser ajustada, com a condição de que a compensação se dê no mesmo mês e se respeite o limite de dez horas diárias. Esse item, no entanto, poderá ser negociado entre empresas e empregados com força de lei, podendo diferir do que está na CLT. O texto também regulamenta a jornada de 12 horas de trabalho, desde que seguidas por 36 horas ininterruptas de descanso.

Intervalo intrajornada

COMO É: Para jornada diária acima de seis horas, é obrigatório intervalo para repouso ou alimentação de, no mínimo, uma hora. O descumprimento acarreta pagamento da hora cheia dobrada.

COMO FICA: Sindicatos e empresas poderão negociar intervalos de almoço menores do que uma hora. Em caso de descumprimento, o empregador pagaria dobrado pelo período restante. Por exemplo, se a definição de almoço é de uma hora, e o empregado fez 50 minutos, a empresa teria de pagar os dez minutos restantes dobrados.

O QUE PODE MUDAR: Este item deve ser vetado pelo presidente Michel Temer conforme acordo firmado com os senadores, ficando tudo como é hoje.

Regime parcial

COMO É: O regime parcial tem 25 horas e não admite horas extras. O empregado tem um regime diferenciado de férias e não pode vender parte desses dias.

COMO FICA: O contrato parcial pode ter até 30 horas, sem permissão de horas extras. O empregador também pode optar por um contrato de 26 horas, com até seis horas extras. O trabalhador sob esse regime terá o mesmo direito a férias do que os contratos por tempo determinado.

Jornada intermitente

COMO É: Não existe esse tipo de jornada na CLT. Há uma orientação do TST que reconhece o pagamento por hora em alguns casos específicos de jornada reduzida.

COMO FICA: Esse tipo de contrato permite a prestação de serviços de forma descontínua, em dias alternados ou apenas por algumas horas na semana. O trabalhador tem de ser convocado com, pelo menos, cinco dias de antecedência. A única exceção para esses casos são os aeronautas, que não podem ser contratados pelo regime intermitente de trabalho.

O QUE PODE MUDAR: Esse item deve ser modificado e terá regras abrandadas em uma medida provisória, ficando restrito a alguns setores da economia.

Terceirização

COMO É: A lei que regulamenta a terceirização foi aprovada há algumas semanas e permite que ela valha para qualquer função da empresa. Faltavam, no entanto, algumas salvaguardas para proteger o trabalhador.

COMO FICA: Há duas salvaguardas à lei da terceirização. A primeira tenta impedir a “pejotização”, com um artigo que proíbe que o trabalhador seja demitido e contratado como pessoa jurídica ou funcionário de empresa terceirizada em um período inferior a 18 meses. A outra salvaguarda garante que terceirizados tenham acesso aos mesmos benefícios — como ambulatório, refeitório e transporte — dos empregados da “empresa-mãe”.

Gestantes e lactantes

COMO É: As gestantes e lactantes devem ser afastadas de qualquer atividade insalubre, devendo exercer suas atividades em local salubre.

COMO FICA: O projeto proíbe que gestantes e lactantes trabalhem em atividades consideradas insalubres em grau máximo enquanto durar a gestação. Para atividades de grau médio ou mínimo de insalubridade, a gestante deverá ser afastada quando apresentar um atestado de saúde emitido por um médico de confiança.

O QUE PODE MUDAR: Esse item também deve ser modificado em medida provisória.

Demissão em comum acordo

COMO ERA: A CLT diz que, havendo culpa recíproca no ato que determinou a rescisão do contrato de trabalho, a Justiça reduzirá pela metade a indenização.

COMO FICA: Por esse mecanismo, a multa de 40% do FGTS é reduzida a 20%, e o aviso prévio passa a ser restrito a 15 dias. Além disso, o trabalhador tem acesso a 80% do dinheiro na conta do Fundo, mas perde o direito a receber o seguro-desemprego.

O globo, n. 30655, 12/07/2017. Economia, p. 20