Sessões suspensas e apreensão no Congresso

Natália Lambert

18/05/2017

 

 

REPÚBLICA EM TRANSE » Divulgação da denúncia contra o presidente interrompe votações na Câmara e no Senado. Parlamentares da oposição entram com pedido de impeachment. OAB cobra esclarecimentos

 

 

 

A divulgação das denúncias contra o presidente da República, Michel Temer, de que teria incentivado o executivo da JBS Joesley Batista a comprar o silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha na prisão fez com que o Congresso Nacional encerrasse os trabalhos mais cedo, gerou debates acalorados e incentivou pedidos de impeachment por parte de deputados e senadores da oposição. PDT, PT, PCdoB, PSB, PSol e Rede divulgaram nota, na noite de ontem, exigindo a “renúncia/afastamento imediato do presidente” e eleições diretas.

Na Câmara, o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) acabou a sessão no meio da votação da Medida Provisória 755/16, que inclui novos casos de repasse de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) a estados e municípios. O líder do PSol, Glauber Braga (RJ), subiu à tribuna para falar sobre a denúncia. “Num estado democrático de direito, todos têm direito à ampla defesa e ao contraditório. Se comprovado o que está aqui colocado, fica mais do que demonstrado que este governo não tem legitimidade para continuar à frente do Brasil”, comentou.

A informação causou tumulto no plenário com manifestações da base governista e da oposição. Maia encerrou os trabalhos e rapidamente dirigiu-se ao carro para ir ao Palácio do Planalto. Falando ao telefone em todo o trajeto, limitou-se a dizer à imprensa: “Se não fosse grave, vocês não estariam tão interessados.” O líder do DEM na Câmara, o deputado Efraim Filho (PB), considera graves as denúncias e afirma que é preciso dar celeridade às investigações. “O Brasil espera respostas imediatas. Como aconteceu com a presidente Dilma, é preciso investigar o caso e qualquer infração à Constituição, configurando crimes de responsabilidade, é tarefa do Congresso dar continuidade às investigações”, comentou.

No Senado, a notícia veio à tona durante debate da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/13, que extingue o foro privilegiado para autoridades com exceção aos presidentes dos Três Poderes. O senador Lindbergh Farias (PT-RJ) pediu a palavra para ler a denúncia. Em resposta, o senador Magno Malta (PR-ES) criticou o petista. “Do que está acontecendo no Brasil, só falta eu ver chover para cima. O resto tudo eu já vi. Agora estou achando bonito, hilário o comunicado do senador Lindbergh. Não seria o sujo falando do mal lavado? E delação agora vale? Porque, para o PT, delator nunca valeu nada, delação não vale nada; agora, o delator do Temer vale”, afirmou.

O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), ainda tentou dar seguimento à sessão, mas ficou impossível diante do clima e os trabalhos foram encerrados. Na saída, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), evitou comentar as denúncias, mas previu fortes embates políticos. “É prematuro qualquer comentário, pois não conheço os áudios, não sei do que se trata, que tipo de fita é essa, que tipo de perícia. É uma denúncia de tantas que estão sendo publicadas, de delações às dezenas. Algumas delas, a maioria, o PT está descredenciando. Se é uma delação que envolve o governo, é válida. Se envolve o PT, não é válida”, criticou.

Na opinião do líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), o país precisa antecipar as eleições para a Presidência da República e para o parlamento. “Diante da gravidade do quadro e com a responsabilidade de não deixar o Brasil mergulhar no imponderável, só nos resta a renúncia do presidente Michel Temer e a mudança na Constituição. É preciso aprovar a antecipação das eleições presidencial e do Congresso Nacional”, afirmou, por meio de nota.

 

“Repugnantes”

A repercussão da denúncia ultrapassou os limites do Congresso. “São estarrecedores, repugnantes e gravíssimos os fatos noticiados por O Globo a respeito de suposta obstrução da Justiça praticada pelo presidente da República e de recebimento de dinheiro por parte dos senadores Aécio Neves e Zezé Perrella. A sociedade precisa de respostas e esclarecimentos imediatos. As cidadãs e cidadãos brasileiros não suportam mais conviver com dúvidas a respeito de seus representantes”, comentou, por meio de nota, o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Claudio Lamachia, que defende celeridade na divulgação das gravações na íntegra.

 

 

Correio braziliense, n. 19714, 18/05/2017. Poder, p. 4.