A voz dos jovens sobre o ensino médio

Caio Callegari/ Carolina Fernandes/ Priscilla Kesley

18/05/2017

 

 

O Brasil tem 1,5 milhão de jovens de 15 a 17 anos fora da escola, sendo que a grande maioria já passou pelo sistema educacional, mas o abandonou — só no primeiro ano do ensino médio, essa taxa é de 9%. Dos estudantes que chegam até o 3º ano, só 28% apresentam o desempenho adequado em língua portuguesa e apenas 7%, em matemática.

Embora alguns indicadores da etapa final da educação básica venham melhorando, como as taxas de aprovação, essa evolução ainda é muito lenta — em 2015, apenas 58,5% dos jovens de 19 anos tinham concluído o ensino médio. Estamos, portanto, bastante distantes de garantir o direito a uma educação de qualidade e à cidadania para a juventude brasileira.

O que fazer para mudar esse quadro? Nos últimos anos, o governo federal tem apostado em algumas iniciativas — a mais recente é a reforma do ensino médio. Apesar de as alterações na etapa apontarem na direção de uma escola mais atrativa, o processo de elaboração deixou de lado um passo fundamental: o diálogo com a comunidade escolar, especialmente com os jovens.

Ouvir deles o que deve ser feito para melhorar as condições de ensino e de aprendizagem e a atração do ambiente escolar é essencial para o sucesso das políticas educacionais. Entre setembro e outubro de 2016, pesquisa com representatividade nacional ouviu os jovens brasileiros de 15 a 19 anos que estavam cursando ou já tinham concluído o ensino médio.

Iniciativa do movimento Todos Pela Educação com o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do Itaú BBA, a pesquisa Repensar o Ensino Médio identificou os atributos considerados mais importantes e menos satisfatórios da escola para os jovens: a garantia de segurança (menos violência, brigas e bullying), a atenção às pessoas com deficiência (mais acessibilidade), a melhora da infraestrutura escolar e professores mais assíduos. São aspectos básicos para que qualquer escola possa tratar seus alunos com dignidade.

Contudo, parecem não corresponder à realidade do Brasil. Segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 17,5% dos jovens brasileiros de 15 anos dizem sofrer bullying. E a violência ocorre em diferentes segmentos. Em 2015, 75% dos professores do 9º ano disseram ter presenciado agressões entre alunos; 57% relataram agressões entre alunos e professores ou funcionários; e 11% foram diretamente ameaçados por alunos, de acordo com dados do Ministério da Educação (MEC).

Uma cultura de paz nas escolas, capaz de tecer relações amistosas e construtivas entre alunos, professores, funcionários e gestores, é condição essencial tanto para a aprendizagem cognitiva quanto para a cidadã. Igualmente importante para o bem-estar e o desenvolvimento da comunidade escolar, a infraestrutura também deixa a desejar. Dados do Censo Escolar 2016 (MEC), organizados pelo Observatório do Plano Nacional de Educação (PNE), mostram que apenas 24% das escolas públicas de ensino médio têm infraestrutura escolar considerada adequada pelo plano. Na Região Norte do país, a situação é ainda pior: só 4%.

Além disso, 75% das escolas públicas que atendem alunos com deficiências não têm dependências e vias adequadas para mobilidade reduzida. Portanto, uma verdadeira reforma, que se proponha a transformar a escola, física e pedagogicamente, parte, antes, de mais nada da garantia desses aspectos elementares.

Outra dimensão apontada como relevante pelos jovens é a oportunidade de terem formação mais conectada com o mundo do trabalho. Segundo a pesquisa, 76% dos estudantes trocariam um terço das disciplinas comuns por matérias voltadas ao desenvolvimento profissional, caso a jornada escolar fosse ampliada. Os dados indicam ainda a necessidade de democratizar o acesso e valorizar uma trajetória escolar que inclua a formação profissionalizante.

Os resultados da pesquisa indicam caminhos que vêm sendo há algum tempo construídos e convergem com outros estudos e com os debates realizados para a formulação do PNE.

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Correio braziliense, n. 19714, 18/05/2017. Opinião, p. 13.