A bancada do frigorífico

Alessandra Azevedo

20/05/2017

 

 

Pelos cálculos de Ricardo Saud,diretor da JBS, o grupo empresarial teria repassado cerca de R$600 milhões a candidatos de 28 partidos. Do total de recursos,apenas 2,5% seriam repasses legais,o restante era propina em troca de contrapartidas

 

 

O grupo JBS repassou quase R$ 600 milhões a 1.829 candidatos de 28 partidos diferentes nas eleições de 2014, afirmou Ricardo Saud, diretor da empresa, em delação feita em 10 de maio e divulgada ontem pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Teriam sido beneficiados candidatos a deputados, senadores, governadores e presidente da República. Do valor total repassado aos candidatos, quase tudo seria propina, ressaltou. Apenas R$ 15 milhões, no máximo, teriam sido repasses legais, segundo os cálculos do empresário. “O resto tudo é propina, tudo tem ato de ofício, tudo tem promessa, tudo tem alguma coisa”, ressaltou.

Esses políticos receberam propina direta ou indiretamente, garantiu Saud, que contou ter feito o levantamento por conta própria. “Eu falo direta ou indiretamente pelo seguinte: é muito difícil o cara não estar sabendo que o PT comprou o partido X ou deixou de comprar o partido Y, que o Aécio comprou o partido X ou deixou de comprar o partido Y. Se ele recebeu esse dinheiro, ele sabe, de um jeito ou de outro, que foi de propina”, afirmou. Segundo Saud, “essas pessoas estão cientes disso”.

Somados os valores repassados, os que mais receberam dinheiro da JBS na campanha foram políticos do PT, com R$ 141 milhões, do PSDB, com R$ 55 milhões, e do PMDB, com R$ 40 milhões. Dos candidatos beneficiados ilegalmente, 390 foram eleitos. Um deles, na versão de Saud, foi o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), que atualmente preside o Senado Federal e é o segundo na linha de sucessão caso o presidente Michel Temer seja destituído do cargo. Em nota, Eunício negou a versão do diretor de que teria recebido R$ 3,6 milhões de doações eleitorais do grupo e garantiu que os valores recebidos em 2014 foram todos declarados à Justiça Eleitoral.

Mas, na versão do diretor, um em cada três senadores e deputados federais eleitos teriam sido favorecidos com algum tipo de propina na campanha. Mais especificamente, 28 dos 81 senadores e 167 dos 513 deputados que hoje ocupam cadeiras no Congresso Nacional foram citados na delação. Entre os deputados estaduais, 179, de 23 estados diferentes, teriam usado ajuda de propina da JBS, ou 16,9% dos 1.059 atualmente em atividade.

A delação envolveu muitos nomes de peso, mas nem partidos pequenos foram poupados. Segundo Saud, até os que foram criados recentemente, como PROS e PEN, estavam envolvidos diretamente no esquema. Apesar de ter citado valores milionários, o diretor da JBS também relatou repasses menores, como de R$ 16 mil a candidatos a deputados estaduais.

Contrapartida
Além de propinas eleitorais, Saud disse que a JBS fazia pagamentos fora de campanha para agentes públicos, tanto na forma de mensalinhos, como o que seria repassado ao ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), quanto “episódicos”. Em troca do dinheiro, a JBS pretendia obter facilidade para aprovar leis ou “obter outros de ato de ofício” que estivessem ao alcance dos políticos beneficiados.

Saud afirmou ainda que buscava, com o dinheiro, evitar atrair a antipatia deles, “que pode ser muito danosa quando se trata de grupo empresarial tão capilarizado como a JF”. O método de pagamento, segundo o diretor, era sempre determinado pelo político que recebia o valor, podendo ser por meio de doação oficial, pagamento de notas fiscais avulsas ou até entrega de dinheiro em espécie.

Sob controle da JBS
A JBS repassou, nas eleições de 2014

R$ 600 milhões
a 1.829 candidatos, de 28 partidos

Foram eleitos:

16 dos 27 governadores

28 dos 81 senadores

167 dos 513 deputados federais

179 dos 1.059 deputados estaduais

Perda de benefícios

A direção da Câmara cortou benefícios do deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), afastado do cargo por decisão do Supremo. A Casa deve decidir na próxima semana se vai suspender também o salário de R$ 33.763,00 e se haverá convocação do suplente. Loures, que desembarcou ontem em São Paulo vindo de Nova York, perdeu o direito à cota para exercício da atividade parlamentar de R$ 38.871,86. O chamado “cotão” é destinado ao pagamento de despesas como passagens aéreas, telefonia, serviços postais, manutenção de escritórios, alimentação, hospedagem, despesas com locomoção, consultoria técnica, segurança e participação em eventos ligados à atividade parlamentar.  O peemedebista também deixará de receber os R$ 4.253,00 de auxílio-moradia.

 

 

Correio braziliense, n. 19716, 20/05/2017. Política, p. 2.