Gilmar quer debater delação no plenário

Paulo de Tarso Lyra

27/05/2017

 

 

Ministro defende que o rito da homologação da colaboração de Joesley Batista seja avaliada pelo pleno da Corte. A depender do resultado entre os integrantes do STF, os termos do acordo do empresário poderiam até mesmo ser revistos

 

Em meio às polêmicas sobre o conteúdo das gravações entregues pelo empresário Joesley Batista ao Ministério Público Federal e o teor do acordo fechado pelos empresários da JBS para obter a delação premiada, o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, adicionou mais um ingrediente no caldeirão. Ele defendeu, ontem, que o rito de homologação da delação deve ser discutido pelo plenário do STF. E que, a depender do resultado, os termos poderiam ser revistos.
Mendes não discorda do fato de o ministro Edson Fachin ter homologado o acordo de delação, embora haja questionamentos de que esse processo deveria ter sido sorteado. Os defensores desta tese, inclusive parlamentares da base aliada, alegam que as denúncias feitas pelos irmãos Wesley e Joesley Batista não têm relação com a Lava-Jato. Logo, não deveriam ser distribuídas diretamente a Fachin.
Mesmo sem contestar esse ponto, Mendes afirmou que é necessário que o pleno — seja no âmbito da Segunda Turma da qual ele e Fachin fazem parte seja no colegiado da Casa —, referende os termos do acordo. O ministro disse que chegou a conversar sobre essa possibilidade com o antigo relator da Lava-Jato, Teori Zavascki, morto em janeiro deste ano em um acidente aéreo. “O que a lei diz? Que o juiz é quem homologa. Mas o juiz aqui não é o relator. Quando se trata de tribunal, é o próprio órgão. Ele pode até fazer a homologação prévia, mas sujeita a referendo”, defendeu.
A gravidade do conteúdo da delação, na visão de Gilmar, reforça ainda mais a necessidade de uma análise posterior feita pelo plenário da Corte. “A mim me parece que, nesse caso, como envolve o presidente da República, certamente vamos ter que discutir o tema no próprio plenário. O caso do Sérgio Machado (ex-presidente da Transpetro e delator) já tinha provocado muita especulação e nessa época nós discutimos essa temática com essa perspectiva”, afirmou.
Segundo ele, o próprio relator da Lava-Jato, ministro Edson Fachin, poderá levar uma questão de ordem para ser decidida pelos demais colegas. Segundo apurou o Correio, outros ministros não têm o mesmo entendimento de Gilmar. Concordam com o fato de que cabe a Fachin esse movimento — ele, inclusive, agiu desta maneira em relação ao pedido de habeas corpus de Antonio Palocci.
Além disso, o entendimento jurídico é de que, qualquer mudança nos termos do acordo, deve vir de um pedido feito pelo Ministério Público, por uma das partes ou pelo juiz — no caso ministro — que homologou a delação. E que isso ocorre quando há provas inconsistentes ou lacunas nos depoimentos prestados ou documentos entregues pelos delatores. Mas a pressão por uma revisão dos termos da delação aumenta porque, após denunciar o esquema que envolve Temer e pessoas ligadas a ele, Joesley e a família foram para Nova York.

Senado
Fachin também enfrenta outro questionamento. Durante o processo de sabatina que enfrentou no Senado, em 2015, ele teria sido ajudado, nas conversas com os senadores, por Ricardo Saud, um dos executivos e delatores da J&F, responsável por entregar as malas da Friboi. Segundo interlocutores do ministro, Saud não estava na linha de frente das articulações, embora, em situações como essas, sempre aparecem pessoas propondo ajuda. A hipótese mais provável é de que o hoje delator tenha ajudado a vencer as resistências que Fachin enfrentava junto à bancada de senadores ligada ao agronegócio, devido à então proximidade ao Movimento dos Trabalhadores Sem-terra (MST).


"O que a lei diz? Que o juiz é quem homologa. Mas o juiz aqui não é o relator. Quando se trata de tribunal, é o próprio órgão. Ele pode até fazer a homologação prévia, mas sujeita a referendo”
Gilmar Mendes, ministro do STF

 

 

Correio braziliense, n. 19723, 27/05/2017. Política, p. 2.