Levantamento aponta 322 ações de censura prévia

15/02/2017

 

 

Projeto da Abraji mapeou retirada de conteúdo desde 2012; maioria das ações ocorre em períodos eleitorais

-SÃO PAULO- Levantamento do projeto Control-X, tocado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) que monitora pedidos de retirada de conteúdo da internet envolvendo autoridades públicas, identificou 322 casos de pedido de censura prévia no Brasil nos últimos cinco anos. Os números mostram que o expediente adotado pela primeira-dama Marcela Temer não é exceção. Do total de pedidos de censura prévia mapeados pela Justiça, 73 casos foram deferidos pela Justiça.

Ações de censura prévia são processos onde as partes pedem à Justiça que um jornalista/blogueiro ou empresa de mídia se abstenha de publicar no futuro determinado conteúdo. Na última sexta-feira, a Justiça de Brasília, em resposta a uma ação do Palácio do Planalto, censurou reportagem produzida pelo O GLOBO sobre uma troca de mensagens entre a primeira-dama, Marcela Temer, e um hacker, que tentava extorquir dinheiro dela.

A decisão do juiz Hilmar Castelo Branco Raposo de proibir a publicação de qualquer reportagem sobre o tema foi proferida no mesmo dia de publicação de texto sobre o assunto no site do jornal. O GLOBO foi notificado dois dias depois e retirou o material do ar. Matéria da “Folha de S. Paulo" sobre o mesmo tema foi atingida pela decisão.

O mapeamento de retirada de conteúdo da internet é realizado desde 2012. De acordo com os dados, a maior parte dos casos com pedido de censura prévia ocorreu em anos eleitorais. Nas eleições de 2012, foram apresentados 46 pedidos, dos quais 10 foram deferidos. Em 2014 e 2016, o volume saltou para 102 e 116, respectivamente. Em 2014, 26 foram deferidos, em 2016, 24.

EXEMPLOS DE DECISÕES

Entre os casos estão exemplos de investigados na Operação Zelotes que obtiveram decisão impedindo a publicação de reportagens mencionando seus nomes e também de delegados da LavaJato impedindo o jornalista Marcelo Auler de publicar reportagens críticas à operação. Nos dois casos, os pedidos de censura previa foram deferidos pela Justiça.

Para o professor de Direito da FGV, Alexandre Pacheco, apesar da necessidade de ajuda na diferenciação de matérias verídicas das inventadas no contexto “da pós-verdade", a livre circulação de informações e a liberdade de expressão “é o que permite um debate mais amplo em sociedade democrática, para que cidadãos formem opiniões por si mesmos".

— Em um ambiente que funciona desta maneira, a gente publica tudo. Se lá na frente, alguma informação gerar dano a alguém, a gente pune posteriormente — sugere Pacheco. Nas eleições do ano passado, o Control-X identificou pelo país um total de 606 processos judiciais para retirar informações do ar, envolvendo 342 veículos diferentes de mídia (algumas ações tinham como alvo mais de uma empresa).

O globo, n. 30508, 15/02/2017. País, p. 7