Título: Brasil tenta salvar a COP-17
Autor: Melo, Max Milliano
Fonte: Correio Braziliense, 09/12/2011, Ciência, p. 20

No penúltimo dia da conferência da ONU sobre mudanças climáticas, o país diz aceitar metas obrigatórias de redução das emissões de gases poluentes e recebe a missão de convencer os EUA a assinar acordo contra o aquecimento global

O Brasil assumiu um papel de destaque ontem na 17ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-17), que termina hoje em Durban, na África do Sul. O país foi indicado para uma das missões mais difíceis do encontro: convencer os irredutíveis norte-americanos a se comprometerem com um acordo vinculante (com metas obrigatórias) de redução das emissões de gases de efeito estufa. Além disso, no discurso mais aguardado do dia, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, defendeu a adoção do segundo tempo do Protocolo de Kyoto — dispositivo no qual o acordo continuaria valendo até 2015, dando aos países mais tempo para elaborarem um novo documento global — com a inclusão de metas ambientais para todos os países.

Em sua fala, a ministra reafirmou a posição que o país vem defendendo desde a última conferência de mudanças climáticas, realizada no ano passado, no México. "O Brasil trabalha com afinco para a adoção de um segundo período de compromisso para o Protocolo de Kyoto e o fortalecimento da implementação da Convenção no curto, médio e longo prazo", declarou Izabella, que frisou que todos os países precisam se comprometer com a questão ambiental. "Para isso, se todos, repito, todos trabalharmos juntos, poderemos negociar o mais cedo possível um novo instrumento legalmente vinculante sobre a convenção, baseado nas recomendações da ciência e que inclua todos os países para o período imediatamente pós-2020."

Elaborado em 1997, o acordo exige que os países ricos reduzam em 52% das emissões de CO2, principal gás causador do efeito estufa, tomando como parâmetro as emissões de 1990. Não há obrigações impostas a países em desenvolvimento, como China e Brasil. O que o governo brasileiro fez, portanto, foi aceitar entrar no grupo de nações obrigadas a adotar medidas que interrompam as mudanças climáticas.

Paridade Como o documento expira em meados do ano que vem, a alternativa para que não haja um vazio regulatório sobre o tema é a sua prorrogação até 2020. O grande problema é que os Estados Unidos, que nunca ratificaram o texto, continuam resistentes a assumir um compromisso vinculante. Em Durban, os americanos defendem que só participarão do segundo tempo de Kyoto caso seus cortes de emissão sejam semelhantes aos da China, atual maior emissora de poluentes. O negociador norte-americano Todd Stern chegou a declarar durante a semana que o documento só seria adotado caso houvesse "uma verdadeira paridade legal".

China e Índia, por sua vez, impõem uma série de condições políticas e econômicas para a prorrogação do protocolo e para a negociação de um acordo mais amplo em 2020. Para os dois países, pelo fato de Estados Unidos e Europa já serem desenvolvidos, eles têm maior responsabilidade nos cortes, em comparação com as economias emergentes, que precisariam poluir mais para crescer. Além dos dois, a União Europeia defende que um novo acordo só será possível com a participação dos EUA.

Tentar reunir todos esses interesses divergentes e evitar que a conferência naufrague como suas antecessoras será uma tarefa que terá a participação mais intensa do Brasil. Com a conferência próxima do fim, a chanceler sul-africana e presidente da conferência, Maite Mashabane, convidou os negociadores brasileiros para participar da equipe de "facilitadores" de um acordo global. "Trata-se de um pequeno grupo informal que, de acordo com a própria dinâmica, realiza reuniões paralelas", conta o diplomata brasileiro Augusto Pestana, integrante da equipe que está na África do Sul.

Críticas e elogios Apesar de ter voltado a atrair para si a atenção dos negociadores, o Brasil, comumente elogiado por adotar metas voluntárias de redução das emissões, enfrenta uma situação um pouco diferente do que viveu nas últimas conferências climáticas. A aprovação do novo Código Florestal no Senado Federal na terça-feira gerou uma avalanche de críticas. Na quarta-feira, o jornal espanhol El País publicou uma reportagem na qual classificava a postura ambiental brasileira de "contraditória". Nos Estados Unidos, o Wall Street Journal destacou que a nova legislação levanta "preocupações em relação aos custos ambientais da estratégia do Brasil de empregar seus vastos recursos naturais para gerar crescimento econômico". Houve ainda uma série de protestos de organizações não governamentais à legislação brasileira durante o evento.

Em seu discurso, a ministra Izabella Teixeira minimizou a situação, lembrando que o país tem metas ambiciosas de redução do desmatamento e das queimadas. "Os esforços brasileiros de mitigação já estão apresentando resultados significativos. No combate ao desmatamento, nossa maior fonte de emissões, o objetivo é reduzir em 80% o desmatamento até 2020 em relação à média de desmatamento entre 1996 e 2005", afirmou. "Em 2011, atingimos uma redução de 66%, o menor índice de desmatamento desde que o sistema de monitoramento foi criado, em 1988. O desmatamento que, em 2004, atingiu um pico de 27 mil quilômetros quadrados, este ano, caiu para pouco mais de 6 mil", ressaltou.

O secretário executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e subsecretário-geral da ONU, Achim Steiner, defendeu a posição brasileira. "Se as pessoas querem julgar o Brasil, que o julguem pelo que ele fez: redução recorde nas emissões por desmatamento no último período de relato. O Brasil provavelmente é o maior ator de mitigação no planeta nos últimos 24 meses, excedendo as ações dos países industrializados. Esse é o ponto de partida." Steiner, que nasceu no Brasil e depois se naturalizou alemão, pediu que as discussões internacionais não sejam contaminadas por questões domésticas de cada país. "Às vezes, para mim, é desconcertante nestas conferências internacionais que debates nacionais controversos num parlamento democrático sejam interpretadas de formas diferentes em países diferentes", completou.