Lava Jato apura propina a senadores do PMDB
Julia Affonso / Ricardo Brandt /Mateus Coutinho / Fausto Macedo
24/02/2017
Em nova fase, operação investiga repasse de cerca de US$ 40 mi a ex-diretores da Petrobrás e a parlamentares
A força-tarefa da Lava Jato deflagrou ontem mais uma fase da operação, batizada de Blackout, para apurar o pagamento de cerca de US$ 40 milhões em propina a ex-diretores da Petrobrás e senadores do PMDB. De acordo com os investigadores, parte do dinheiro foi transferida a parlamentares por meio de contas na Suíça e também nas ilhas caribenhas de Bahamas.
O principal alvo da operação de ontem, a primeira da força-tarefa no ano, foram dois supostos operadores ligados ao PMDB, Jorge Luz e seu filho, Bruno Luz. Foram expedidos mandados de prisão preventiva contra os dois, mas, segundo a defesa dos lobistas, eles estão nos Estados Unidos e retornarão “o mais breve possível”.
Pai e filho são considerados foragidos e foram incluídos na lista vermelha da Interpol. Segundo os investigadores, Jorge e Bruno Luz atuaram em pelo menos cinco contratos da Petrobrás, como na compra de navios- sonda, aluguel de terminais e fornecimento de asfalto.
Jorge, de 73 anos, já havia sido citado como operador de propina em delações premiadas e é tratado por investigadores como “o operador dos operadores”.
Segundo a defesa, ele já prestou depoimentos por três vezes no Supremo Tribunal Federal (STF) para esclarecer fatos relacionados à Lava Jato.
O nome de Jorge apareceu em depoimentos do ex-diretor da área internacional da Petrobrás Nestor Cerveró e do lobista Fernando “Baiano” Soares.
Os dois afirmaram que Jorge Luz teria atuado no repasse de US$ 6 milhões em propinas para o senador Renan Calheiros (PMDB-AL).
Além de Renan, Baiano também citou entre os políticos com os quais Jorge Luz mantinha contato o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), o deputado Aníbal Gomes (PMDBCE) e o ex-ministro de Minas e Energia Silas Rondeau (PMDB). Já o senador cassado Delcídio Amaral (sem partido- MS), que também fez acordo de delação, afirmou em sua colaboração que Jorge Luz era um dos “principais operadores” do PMDB ao lado de Milton Lyra, lobista que foi alvo de mandado de condução coercitiva em setembro de 2016.
“São dois operadores de extrema relevância. Talvez sejam os maiores operadores da área Internacional da Petrobrás, os mais ligados ao PMDB”, afirmou o procurador da República Diogo Castor de Mattos, da força- tarefa da Lava Jato, durante entrevista coletiva na manhã de ontem, em Curitiba.
Contratos. As contas no exterior ligadas a Jorge e Bruno Luz, segundo a Procuradoria, foram abertas em nome de offshores, usadas para pagamentos de propinas, em especial em contratos da área internacional da Petrobrás.
Dois deles referem-se à compra e operação dos naviossonda Petrobrás 10.000 e Vitória 10.000. O negócio já é alvo de processos na Justiça Federal contra o ex-diretor de Internacional da estatal Jorge Zelada e contra o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Ao autorizar a prisão de pai e filho, o juiz federal Sérgio Moro apontou “o caráter serial dos crimes”.
“A intermediação reiterada de pagamento de vantagem indevida a diversos agentes públicos, pelo menos dois diretores e dois gerentes da Petrobrás, em pelo menos cinco contratos diferentes da Petrobrás, aliada à duração da prática delitiva por anos e a sofisticação das condutas delitivas, com utilização de contas secretas em nome de offshores no exterior (cinco já identificadas, sendo quatro comprovadamente utilizadas para repasses de propinas), é indicativo de atuação criminal profissional”, disse o magistrado que conduz a Lava Jato na primeira instância.
Exterior. Jorge e Bruno Luz são investigados por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Segundo o delegado da Polícia Federal Filipe Hille Pace, a suspeita é de que eles tenham se mudado para os Estados Unidos para fugir da Justiça brasileira.
“Ao que tudo indica, assim como seu filho Bruno Luz, Jorge Antonio da Silva Luz está residindo no exterior para se furtar da aplicação da lei penal brasileira”, afirmou o delegado. “Melhor análise de seus dados migratórios revelam que, desde o início da fase ostensiva da Operação Lava Jato, o investigado viajou previamente ao menos outras dez oportunidades para o Estado da Flórida, nos EUA.” Bruno Luz tem dupla cidadania.
O investigado tem passaporte português e já usou o documento, segundo registro migratório levantado pela força-tarefa da Lava Jato, em duas ocasiões para deixar o Brasil.
Avião. Como medida preventiva, Moro determinou o bloqueio de R$ 50 milhões dos dois investigados e também do empresário Apolo Santana Vieira.
O empresário, alvo da operação de ontem, é apontado como um dos donos do jatinho que se acidentou com o então candidato a presidente Eduardo Campos (PSB), em Santos, no litoral paulista, em 2014. Na queda do avião, Campos e mais seis pessoas morreram.
No caso de Apolo Vieira, o juiz da Lava Jato chegou a decretar a prisão preventiva, mas acabou revogando após o Ministério Público Federal pedir a reconsideração da medida alegando que o empresário está negociando um acordo de colaboração premiada.
‘Atuação profissional’
“O caráter serial dos crimes, com intermediação reiterada de pagamento de vantagem indevida a diversos agentes públicos, aliada à duração da prática delitiva por anos e a sofisticação das condutas delitivas, com utilização de contas secretas no exterior, é indicativo de atuação criminal profissional.”
Sérgio Moro
JUIZ FEDERAL
OPERAÇÃO BLACKOUT
● A Polícia Federal deflagrou ontem a 38ª fase da Lava Jato; alvo são os lobistas Jorge Luz e Bruno Luz, apontados como operadores do PMDB no esquema de corrupção na Petrobrás
Alvos
JORGE LUZ / BRUNO LUZ
Pai e filho estão nos Estados Unidos e tiveram seus nomes incluídos na difusão vermelha da Interpol
Ordens judiciais
2 mandados de prisão preventiva
15 mandados de busca e apreensão
Crimes
● Corrupção
● Fraude em licitações
● Evasão de divisas
● Lavagem de dinheiro
O que diz a Procuradoria da República, em Curitiba
JORGE LUZ E BRUNO LUZ TERIAM INTERMEDIADO O REPASSE DE PROPINA POR MEIO DE CONTAS DE EMPRESAS OFFSHORES NO EXTERIOR
US$ 40 milhões
PARTE DOS US$ 40 MILHÕES TERIA SIDO DESTINADA AO PMDB
Agentes políticos
FORAM IDENTIFICADOS PAGAMENTOS DOS OPERADORES NAS BAHAMAS E NA SUÍÇA
O que disseram delatores sobre o lobista
Nestor Cerveró
EX-DIRETOR DA PETROBRÁS
Fernando Baiano
LOBISTA
O QUE DISSERAM: Que o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) recebeu propina por meio de Jorge Luz referentes a um contrato de afretamento de navio-sonda. Segundo, Cerveró, Renan recebeu US$ 6 milhões
Delcídio Amaral
SENADOR CASSADO
(SEM PARTIDO-MS)
O QUE DISSE: Que Jorge Luz era um dos “principais operadores” do PMDB ao lado de Milton Lyra, que foi alvo de um mandado de condução coercitiva na Omertà, 35ª fase da Lava Jato, em setembro de 2016
O Estado de São Paulo, n. 45055, 24/02/2017. Política, p. A8.