Governo aciona Forças Armadas para atuar em crise dos presídios.

Andrea Jubé

18/01/2017

 

 

No gesto mais ousado até agora no enfrentamento da crise do sistema penitenciário, o presidente Michel Temer colocou ontem as Forças Armadas à disposição dos governadores para reforçar a segurança dos estabelecimentos penais. Decreto publicado hoje no "Diário Oficial da União" autoriza a atuação dos militares nas dependências dos presídios para garantia da lei e da ordem.

Temer discutia a legalidade dessa medida havia alguns dias com ministros e amigos juristas. Na segunda-feira, determinou que o ministro da Defesa, Raul Jungmann, consultasse os comandantes das Forças Armadas sobre a iniciativa, que acabou sendo divulgada ontem, após reunião do presidente com a cúpula de inteligência do governo.

Alguns governadores solicitaram reforço da Força Nacional de Segurança, mas os limites constitucionais de atuação desse contingente impedem que atuem dentro dos presídios.

"É fato que a crise ganhou contornos nacionais, o que exige ação extraordinária do governo federal", justificou Temer, por meio do porta-voz presidencial. "Essa operação visa a restaurar a normalidade e os padrões básicos de segurança", completou.

Do início do ano até hoje, houve rebeliões em presídios de Manaus (AM), Boa Vista (RR) e Natal (RN), culminando na morte violenta de 134 detentos.

De acordo com o decreto presidencial, as Forças Armadas atuarão nas dependências das prisões para detectar a presença de armas, aparelhos celulares, drogas ou outros itens proibidos em poder dos detentos. O custo das operações não foi divulgado, mas virá de recursos federais.

"Os presídios deixarão de ser os escritórios do crime, o 'home office' dos criminosos", disse o ministro da Defesa, Raul Jungmann. Atualmente, há 350 mil militares na ativa. Jungmann esclareceu que estarão disponíveis militares das três Forças, e citou fuzileiros, a infantaria e paraquedistas, por exemplo.

As varreduras serão periódicas e de surpresa. A requisição do reforço militar, contudo, dependerá da concordância expressa do governador, já que a segurança pública é atribuição primordial dos Estados, conforme previsto na Constituição Federal. A presença das Forças Armadas será temporária, não permanente. A segurança das prisões continua sendo atribuição dos Estados.

"No intervalo entre uma e outra varredura, a responsabilidade será dos agentes penitenciários e da força de segurança dos Estados", explicou o ministro. O reforço militar representa o entendimento do presidente de que a crise carcerária é uma "questão nacional", e que "os Estados sozinhos não dão conta deste problema".

Jungmann acrescentou que as operações serão coordenadas pelas Forças Armadas, mas os militares não terão contato direto com o presos, nem no momento da varredura. "Vamos fazer nas instalações administrativas, os presos vão passar por raio X, por 'scanners', haverá bloqueio prévio dos celulares e da comunicação".

Além desta iniciativa, Temer determinou maior integração dos órgãos de inteligência do governo, nos moldes praticados durante os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. O objetivo é viabilizar "intensa troca de informações" entre os setores de inteligência dos Estados e do governo federal sobre o combate ao crime organizado.

Também será criado um comitê de integração na área de inteligência formado pelos ministérios da Justiça, da Defesa e do Gabinete de Segurança Institucional.

Temer discutirá a crise, agora, com os governadores de cada região, a começar pela região Norte. O anúncio do reforço militar foi feito logo após reunião comandada ontem por Temer com os ministros da Justiça, Alexandre de Moraes, da Defesa, Raul Jungmann, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Sérgio Etchegoyen, e a cúpula dos órgãos de inteligência do governo: os comandantes das Forças Armadas e dirigentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o secretário Nacional de Segurança Pública, da Receita Federal, do Coaf, da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4176, 18/01/2017. Política, p. A8.