Valor econômico, v. 17, n. 4190, 07/02/2017. Política, p. A10

Temer indica Alexandre de Moraes para vaga no STF

Justiça deve ficar com o PMDB; nome mais cotado é o de Antônio Claudio Mariz de Oliveira

Por: Andrea Jubé, Maíra Magro e Fabio Murakawa

 

Com a indicação do ministro da Justiça e Segurança Pública, Alexandre de Moraes, para compor o Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Michel Temer coloca alguém de sua confiança e ligado ao PSDB na vaga do ministro Teori Zavascki, morto em acidente aéreo no mês passado. Simultaneamente, Temer abre caminho para emplacar um representante do PMDB no Ministério da Justiça, pasta à qual responde a Polícia Federal, que conduz a Operação Lava-Jato. Se for aprovado pelo Senado, Moraes será o revisor dos processos relativos à investigação no plenário da Corte.

O nome mais forte para assumir o Ministério da Justiça é o do advogado Antônio Claudio Mariz de Oliveira, amigo de Temer há décadas. O presidente refere-se a ele como o "maior criminalista do país". Crítico do que considera "excessos" na Lava-Jato, foi o primeiro nome cogitado por Temer para assumir a Justiça, mas recebeu duras críticas na ocasião por suas opiniões sobre a operação.

A cúpula tucana sugeriu o nome do ex-governador de Minas Gerais, senador Antonio Anastasia (PSDB), para o comando da Justiça, mas auxiliares de Temer ressaltam que "não há compromisso político" para que o ministério continue com os tucanos, que acabaram de assumir a Secretaria de Governo.

Para assumir o STF, Moraes tem de ser sabatinado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, e ter o nome aprovado pelo colegiado e pelo plenário. A sabatina foi agendada para 22 de fevereiro.

Como revisor dos processos da Lava-Jato levados ao plenário, passarão por Moraes as ações que envolvem as chefias dos Poderes, como os presidentes da Câmara, do Senado e da República. Todos os atuais chefes dos Poderes Legislativo e Executivo foram citados em delações na Lava-Jato, inclusive o próprio Michel Temer.

Temer hesitava em indicá-lo, desde o início, mas sentiu-se à vontade sem o peso da escolha do relator da Lava-Jato, que coube ao Supremo. Havia o receio de melindrar a presidente do STF, Cármen Lúcia, com uma escolha política. Mesmo assim, Temer optou pelo tucano. Como é a indicação mais recente depois do relator da Lava-Jato, Luiz Edson Fachin, Moraes será o revisor dos processos da investigação.

O nome do tucano foi recebido com reserva por diversos juízes, para quem a indicação foi meramente política, e não técnica. A presidente do STF, Cármen Lúcia, foi consultada, e respondeu que não tinha candidato, mas teria manifestado restrições a alguns dos nomes provenientes do Superior Tribunal de Justiça, segundo interlocutores.

Temer decidiu indicar o tucano para o STF neste fim de semana, após uma última conversa com o ministro da Suprema Corte Gilmar Mendes. Nas últimas duas semanas, Temer também discutiu a escolha com amigos juristas e com os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e José Sarney.

Após a conversa com Temer, Gilmar telefonou, no domingo à noite, para o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ives Gandra Martins Filho, para comunicá-lo que a escolha recaiu sobre Moraes.

Até o fim da semana, além de Ives Gandra Filho, figuravam entre os mais cotados para a vaga os nomes de dois ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que era a Corte de origem de Teori: o corregedor-geral Mauro Campbell Marques, o fluminense Luis Felipe Salomão e José Otávio de Noronha.

Temer já havia informado a cúpula pemedebista que estava inclinado a indicar Moraes. Em conversas reservadas, obteve do presidente do Congresso, Eunício Oliveira (PMDB-CE), e do líder do governo no Congresso, Romero Jucá (PMDB-RR), o compromisso de imprimir agilidade ao processo no Senado.

Havia restrições ao tucano da parte do ex-presidente do Senado e atual líder do PMDB, senador Renan Calheiros (AL), que protagonizou um bate-boca com o ministro. Em outubro, quando a Polícia Federal, sob o comando de Moraes, realizou uma operação de busca e apreensão em gabinetes e residências dos senadores, no âmbito da Lava-Jato, Renan disse que o ministro se comportava como um "chefete de polícia". Na semana passada, contudo, Renan recuou e fez elogios públicos sobre o notável saber jurídico de Moraes.

Por meio do porta-voz presidencial, Temer justificou a escolha alegando que as "sólidas credenciais acadêmicas e profissionais o qualificam para as elevadas responsabilidades de ministro do Supremo".

O Ministério da Justiça anunciou que Moraes vai se licenciar do cargo até a sabatina. O secretário-executivo, José Levi, responderá pela pasta, temporariamente. Filiado ao PSDB, ele também terá de se desligar formalmente da legenda para assumir o posto.

A escolha gerou forte reação entre senadores considerados "independentes" e da oposição. "Todos [nós políticos] estamos sob suspeita", disse o senador Cristovam Buarque (PPS-DF), referindo-se ao avanço da Lava-Jato. "[O novo ministro] não pode ser ninguém ligado a nós", criticou.

O senador Roberto Requião (PMDB-PR) considerou a escolha feita por Temer um "acinte, um escárnio". E a senadora Gleisi Hoffmann, do PT do Paraná, disse que a indicação "não surpreende". Para ela, Temer está querendo promover uma "partidarização do Supremo".

Presidente nacional do PSDB, o senador Aécio Neves (MG) elogiou a indicação: "Alexandre de Moraes é um dos mais respeitados constitucionalistas de sua geração. Sua ampla experiência no serviço público permitirá que ele exerça as funções de ministro do Supremo Tribunal Federal com a responsabilidade e o rigor que sempre orientaram suas ações até aqui."

_______________________________________________________________________________________________________

Íntimo do mundo político, advogado é a antítese do perfil 'sóbrio' de Teori

Por: Murillo Camarotto

 

A escolha de Alexandre de Moraes para o Supremo Tribunal Federal (STF) marca o desfecho de uma carreira recheada de relações políticas e busca por um cargo público de envergadura. Desde que seu nome passou a frequentar o noticiário, há 20 anos, o advogado paulistano aparece com frequência entre os cotados para a disputa de cargos eletivos importantes. Ironicamente, ocupará um posto que não depende das urnas.

Hoje com 49 anos, Moraes iniciou a carreira como promotor no Ministério Público de São Paulo, função na qual teve destaque durante um escândalo de corrupção envolvendo a compra de frango pela prefeitura da capital paulista, caso que ficou conhecido como "Frangogate". A partir dali, construiu uma trajetória dividida entre os mundos jurídico, acadêmico e, principalmente, político, quase sempre com posições que podem ser consideradas conservadoras.

Além de ocupar cargos importantes na prefeitura, no governo de São Paulo e, mais recentemente, no governo federal, Alexandre de Moraes atuou como advogado de vários políticos, entre os quais o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, hoje preso por corrupção. Foi filiado ao PFL (atual DEM), ao PMDB e atualmente está no PSDB.

O primeiro posto de maior destaque foi a Secretaria de Justiça de São Paulo, que ele comandou durante a primeira passagem de Geraldo Alckmin pelo governo paulista. Na época com 33 anos, ele e o ex-deputado Gabriel Chalita integravam a ala jovem do governo.

Já naquela ocasião, foi considerado favorito para ser candidato a vice-prefeito de São Paulo na chapa do hoje ministro José Serra. Na reta final do processo, acabou preterido por Gilberto Kassab, que também é seu colega no ministério do presidente MichelTemer.

A inclusão da segurança pública na biografia de Moraes começou a ser escrita naquele mesmo ano, quando Alckmin lhe entregou o comando Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor (Febem). Desde de então, a determinação de Moraes em endurecer as punições a menores infratores passou a ser outra marca forte de sua trajetória.

O trabalho na área foi interrompido após uma indicação para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2005. Com o governo petista em crise, Moraes acabou vencendo a disputa com o candidato indicado pelo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Moraes voltou para São Paulo dois anos mais tarde, convidado pelo então prefeito Kassab para comandar a cobiçada secretaria municipal de transportes. Nesse período, ficou encurralado entre dois aliados, já que Kassab e Alckmin foram adversários nas eleições municipais de 2008. O trabalho na secretaria foi interrompido em junho de 2010, sob críticas da base aliada do prefeito de São Paulo.

Nos quatro anos seguintes, Moraes se dedicou à advocacia e às aulas na USP. Além de Cunha, defendeu o atual secretário de Habitação do governo paulista, Rodrigo Garcia, que teve o nome envolvido no escândalo do cartel dos trens.

Moraes voltou à ribalta em janeiro de 2015, como secretário de segurança de Alckmin. A passagem foi marcada por polêmicas, entre as quais a ocupação de escolas públicas por estudantes. Nesse período, se filiou ao PSDB e foi cotado para disputar a Prefeitura de São Paulo. Foi mais uma vez preterido, desta vez por João Doria.

Com o impeachment de Dilma Rousseff, teve o nome sondado para a AGU, mas foi para o Ministério da Justiça. Além de criar um mal-estar com a Procuradoria-Geral da República, cometeu gafes, como o anúncio de um possível atentado terrorista na Olimpíada e o vazamento de uma fase da Lava-Jato.

Também foi criticado ao defender que conversas entre advogados e clientes presos fossem gravadas. Moraes indicou o filho de um ex-sócio para uma secretaria no ministério e disse que quer erradicar a maconha do continente.

Prestes a ser realizado, o desejo de ingressar no STF não é recente. Ao tomar posse na Academia Paulista de Letras Jurídicas, em 2012, disse que disputaria uma vaga. O plano original de Temer, de indicar alguém com o perfil de Teori Zavascki - em especial a discrição - foi deixado de lado com Moraes.