Mariana Alvim
21/02/2017
A chegada de uma filha com epilepsia refratária levou a vida do deputado Rodrigo Delmasso a um destino incomum para um pastor evangélico: o ativismo pela maconha medicinal
“Na importação, uma ampola que custa US$ 40 nos EUA chega aqui a US$ 100. O Congresso precisa permitir a produção em nosso território”
Em Brasília, conciliar a carreira política com a de pastor evangélico não é tão incomum. Mas somar a esta trajetória a luta pelo acesso a medicamentos derivados da maconha é uma singularidade do paranaense Rodrigo Delmasso, 36 anos, deputado no Distrito Federal e pastor na Igreja Sara Nossa Terra. O ponto fora da curva se justifica por sua filha Manuela. Hoje com 7 anos, a menina foi diagnosticada aos 2 anos com epilepsia refratária.
Como as pessoas na igreja recebem seu ativismo pela maconha medicinal?
Eu enfrento bastante esse debate. As pessoas me abordam e dizem que isto pode ser uma porta para legalizar o uso recreativo da maconha. A gente não pode misturar as coisas: se fosse assim, o ópio estaria à venda para qualquer um, já que a morfina é oriunda dele. O debate precisa ser qualificado e amadurecido. A maconha é uma planta, seria um contrassenso não deixar que pessoas tenham acesso a esse medicamento.
Qual é a urgência do acesso a esses remédios?
Há um versículo da Bíblia em que Jesus diz: “vim para que tenham vida e a tenham em abundância”. Estes remédios dão vida em abundância para os pacientes. O principal ponto das igrejas é levar o bem-estar às pessoas, então por que não legalizar a maconha medicinal, de forma controlada? A Anvisa já faz muito bem esse controle. Imagine uma mãe que não consegue dormir direito porque o filho tem ataque epiléptico. Quando ele passa a usar o medicamento, experimenta-se um milagre. Quando minha filha tem crises, vira a noite. Revezo três horas de sono com a minha mulher.
Sua filha já utilizou remédio com canabidiol?
Já experimentamos, mas para ela não funcionou.
Qual é o diagnóstico da sua filha?
Ela tem epilepsia refratária de difícil controle, o que significa que, depois de um tempo, os medicamentos passam a não funcionar. Ela teve um diagnóstico errado, de síndrome de Patau, uma doença rara, o que nos atrapalhou. Como ela teve uma lesão no lobo temporal, hoje quase não fala e só anda com auxílio.
O senhor é a favor do uso recreativo da maconha?
Sou contra.
Qual seria a forma ideal de produzir remédios à base de maconha no Brasil?
Hoje, se um laboratório quiser produzir em solo brasileiro, não pode. Na importação, permitida pela Anvisa, uma ampola que custa US$ 40 nos Estados Unidos chega aqui a US$ 100. O Congresso precisa permitir a produção em nosso território.
E o cultivo em casa da maconha para uso medicinal?
Tenho restrições. Com o cultivo em casa, corremos os riscos da falta de controle sanitário.
O senhor pretende apresentar algum outro projeto legislativo relacionado à maconha medicinal?
Estamos estudando um projeto para que pacientes em tratamento com quimioterapia possam ter acesso a medicamentos com THC, outra substância da maconha.
O globo, n. 30514, 21/02/2017. Sociedade, p. 22