Valor econômico, v. 17, n. 4188, 03/02/2017. Empresas, p. B1

Petrobras acusa Braskem de omitir dados em acordo com Justiça dos EUA

Petroleira diz que prejuízo com venda da nafta soma US$ 1 bi entre 2009 e 2014

Por: Juliano Basile

 

A Petrobras, sócia do grupo Odebrecht na Braskem, decidiu contestar os termos do acordo que a empresa petroquímica fechou com o governo americano, envolvendo sua participação no esquema de corrupção investigado pela Operação Lava-Jato. A estatal alega que sofreu prejuízo de US$ 1 bilhão (cerca de R$ 3,1 bilhões) e não de US$ 94 milhões, como informou a Braskem ao Departamento de Justiça (DOJ, na sigla em inglês) dos Estados Unidos, em contrato de fornecimento de nafta, matéria-prima da indústria petroquímica.

O contrato, que vigorou de março de 2009 a fevereiro 2014, foi assinado em julho de 2009. O DOJ, com base em delações feitas por executivos da Petrobras, revelou que a Odebrecht, por meio de seu Departamento de Operações Estruturadas - criado pela empreiteira para centralizar o pagamento de propinas -, pagou US$ 12 milhões em comissões para conseguir um contrato vantajoso para a Braskem. A propina teria sido paga em bancos internacionais.

Conforme o estatal, a Braskem não teria prestado esclarecimentos suficientes para indicar o real prejuízo que houve nas negociações do contrato de fornecimento de nafta no referido período.

Contrato foi assinado em julho de 2009 e a propina paga em bancos internacionais, mas o DoJ não revelou nomes

A divergência de informações pode levar o DoJ a rever os termos do acordo que foi anunciado em 23 de dezembro, pelo qual a Braskem se comprometeu a pagar US$ 957 milhões a autoridades no Brasil (Ministério Público Federal), nos Estados Unidos e na Suíça. A multa da Odebrecht ficou em US$ 2,6 bilhões, considerando a soma das parcelas a serem pagas em 23 anos mais a correção pela inflação projetada para o período. Ao todo, o acordo somou US$ 3,5 bilhões.

A estatal, apurou o Valor, também vai recorrer contra o pagamento de valores pela Braskem, já que é sua acionista e discorda dos termos do acordo firmado coma as autoridades americanas.

Segundo os documentos do DoJ, a Braskem admitiu participação num esquema de propina e revelou ter pago US$ 250 milhões através de um sistema secreto de depósitos ilícitos da Odebrecht. "Usando o sistema da Odebrecht, a Braskem autorizou o pagamento de propinas para políticos e partidos no Brasil, assim como para membros da Petrobras", informou o DoJ. Em troca, a Braskem recebeu vários benefícios, como condições mais favoráveis para adquirir produtos e termos melhores em contratos com a estatal, além de legislações menos onerosas e programas do governo que reduziram obrigações tributárias dela no Brasil.

O acordo da Braskem foi considerado parcial pelo DoJ, o que deu direito a uma redução menor do que a Odebrecht no valor a ser pago às autoridades dos três países. Enquanto o desconto da Odebrecht sobre a multa esperada ao fim do processo foi de 25%, a petroquímica obteve apenas 15%. Motivo: a Braskem não apresentou voluntariamente as informações ao Departamento.

Com as informações novas que está recebendo, o DoJ pode reavaliar o acordo. No limite, o departamento americano poderia cancelá-lo, caso constate que recebeu informações enganosas, mas essa hipótese ainda não está sendo considerada. Apesar de terem sido divulgados em conjunto, os acordos de Braskem e Odebrecht são totalmente separados.

Um dos pontos a serem rediscutidos é justamente a negociação sobre o preço do nafta - matéria-prima para a fabricação de plásticos pela petroquímica - que ocorreu entre meados de 2008 e o início de 2009. Na época, ela defendeu uma fórmula de cálculo baseada em padrões internacionais.

A proposta foi rejeitada e a Braskem pediu a variação dessa fórmula. Segundo o DoJ, houve o pagamento de propina para se obter a fórmula que fosse mais favorável à empresa e que tivesse aval inclusive do Conselho de Administração da estatal na época. O contrato foi assinado em julho de 2009 e a propina paga em bancos internacionais, mas o DoJ não informou os nomes dos recebedores.

A consequência disso é que a estatal teve que vender nafta a 92% do preço internacional. Na época de assinatura do contrato e mesmo após o início da Operação Lava-Jato (março de 2014), a Petrobras defendeu os termos que foram assinados com a Braskem, em julho de 2009. A partir do início de uma nova administração, em maio de 2016, houve uma reavaliação a respeito dos prejuízos com o contrato. A cotação correta do nafta, segundo estimativas atualizadas, seria de 97,5% do preço internacional. Porém, com a cotação mais baixa num contrato que vigorou por anos, as perdas da estatal teriam sido de quase US$ 1 bilhão.

Ao longo das investigações da Operação Lava-Jato, a Braskem negou, no Brasil, que o contrato de fornecimento de nafta gerou prejuízos à Petrobras. Em julho de 2015, a empresa informou à Polícia Federal que, se a estatal teve perdas com o contrato, isso decorreu da decisão de utilizar a nafta contratada pela indústria petroquímica para elevar a produção de gasolina e, com isso, atender ao aumento de consumo no Brasil pelo congelamento dos preços desse combustível como política de contenção da inflação do governo da então presidente Dilma Rousseff.

Agora, o debate sobre os prejuízos com esse contrato chegou aos EUA e vão ser avaliados dentro do maior acordo já assinado nos 146 anos de história do DoJ.

A Braskem informou, em nota, que "fechou acordo global com as autoridades americanas, brasileiras e suíças no dia 21 de dezembro de 2016, concluindo a negociação para a resolução das alegações na Operação Lava Jato. O acordo com o DoJ já foi homologado pela Justiça dos EUA no último dia 26 de janeiro, o que encerra o processo perante aquelas autoridades."