Especialistas veem Moraes ligado a STF ‘conservador’

Gilberto Amendola

12/02/2017

 

 

 

Provável ministro tem perfil mais à direita e boa interlocução política, dizem pesquisadores

 

 

Se a indicação para o Supremo Tribunal Federal do ministro licenciado da Justiça, Alexandre de Moraes, for confirmada pelo Senado, ficará reforçada na Corte uma abordagem mais política dos grandes temas, afirmam estudiosos do órgão de cúpula do Poder Judiciário. Com Moraes são esperadas também decisões mais duras em relação ao sistema carcerário e ao consumo de drogas, além de posturas mais favoráveis aos cortes de gastos públicos.

“Nas últimas décadas, ele trabalhou diretamente com um grupo político (foi secretário durante a gestão Gilberto Kassab, em São Paulo; secretário de Geraldo Alckmin, no governo do Estado, e ministro da Justiça de Michel Temer).

É preciso esperar para ver se ele vai manter o mesmo tipo de atuação no STF”, diz Rubens Glezer, coordenador do Supremo em Pauta, núcleo de estudos da Fundação Getúlio Vargas (FGV) / Direito SP.

“Ele deve ser um ministro mais à direita, mais conservador.

Tem um perfil parecido com o de Gilmar Mendes, no sentido de ter boa interlocução política e não se sentir constrangido em externar suas predileções”, afirma Ivar Hartmann, coordenador do Supremo em Números, também da FGV.

 

Multifacetado. Ainda que confirme essas expectativas, Moraes vai habitar um STF multifacetado. Para os especialistas, o perfil político do novo ministro não será suficiente para fazer com que a balança entre “progressistas” e “conservadores” se desequilibre.

“Mesmo naquilo que se imagina ser o campo conservador que Alexandre de Moraes deve frequentar existem peculiaridades. Gilmar Mendes, por exemplo, é bastante conservador em seu voto em relação à união homoafetiva, mas liberal em questões criminais”, afirma Hartmann.

Na verdade, boa parte dos ministros do Supremo vive em uma espécie de “centrão”, onde é difícil antecipar votos ou tendências.

Os dois últimos presidentes da Casa atuam, justamente, nesse meio-campo.

Ricardo Lewandowski já foi acusado de defender petistas durante o julgamento do mensalão, quando votou pela absolvição de José Dirceu e José Genoino.

Por outro lado, durante o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, o ministro negou todos os pedidos de suspensão do processo. “Ele tem um perfil menos duro em decisões criminais. É mais sensível ao direito de defesa”, diz Hartmann.

A atual presidente Cármen Lúcia também tem uma postura difícil de definir. “Ela é uma progressista em questões sociais, mas se mostra muito mais dura em relação ao foro privilegiado”, completa o coordenador do Supremo em Números.

 

Transição. Outros dois ministros também têm se mostrado difíceis de definir, mas estão em um momento de transição: Dias Toffoli (indicado por Lula) e Rosa Weber (indicada por Dilma). Toffoli, que carrega em seu currículo o fato de ter sido advogado do PT, parece estar trabalhando no sentido de anular as impressões do passado. “Em questões políticas ele tem sido conservador; em direitos sociais, progressista”, diz Hartmann. “No processo de impeachment, votou contra os interesses de Dilma Rousseff. Recentemente, tem até se alinhado ao Gilmar Mendes em algumas questões”, afirma Glezer.

Rosa Weber é um caso parecido. No início, os críticos diziam que era uma “amiga de Dilma no STF”. Hoje, segundo dados do Supremo em Números, é a ministra mais dura com os réus: concedeu habeas corpus em apenas 4% dos casos que chegaram ao seu gabinete.

Luiz Fux gosta de manter uma aura de progressista – com tendência a dar votos simbólicos.

Mas, ao mesmo tempo, é aquele que tem atuado com mais desenvoltura na defesa dos interesses do Judiciário.

Os ministros considerados mais liberais também são aqueles com participação mais forte no mundo acadêmico: Edson Fachin e Luís Roberto Barroso.

A dupla tem posturas mais liberais em relação ao direito da família, consumo de drogas e outras questões sociais.

Já os dois ministros mais antigos do Supremo têm atuações destacadas em dois diferentes campos. O decano Celso de Mello, por exemplo, é visto como um “estabilizador” da Corte.

Marco Aurélio Mello atua como uma espécie de consciência crítica dos colegas. É o componente que prima por trazer verdades inconvenientes aos debates.

Segundo levantamento do Supremo em Números, ele é o que “vota vencido” (com a minoria) o maior número de vezes: 14%, ante média de 2% dos ministros. Também concede liminares como nenhum outro ministro, na faixa de 50%, ante média de 20% a 30%.

 

Predileções

“Ele deve ser um ministro mais à direita, mais conservador. Tem um perfil parecido com o do Gilmar Mendes, no sentido de ter boa interlocução política e não se sentir constrangido em externar suas predileções.”

Ivan Hartmann

COORDENADOR DO SUPREMO EM NÚMEROS, SOBRE ALEXANDRE DE MORAES

 

OS PERFIS DA CORTE

● Para especialistas, atual composição do Supremo Tribunal Federal pode ser considerada ‘multifacetada’

 

CONSERVADOR

Alexandre de Moraes*

Atuação do indicado por Temer para o STF, por seu histórico, se aproximaria da de Gilmar Mendes

 

Gilmar Mendes

Não se constrange em manifestar opiniões políticas

 

PROGRESSISTA

Luiz Fux

Atua com desenvoltura na defesa de interesses e prerrogativas do Judiciário

 

Edson Fachin

Tem produções acadêmicas consideradas “progressistas”

 

Luís Roberto

Barroso

Acadêmico, tem atuação no tribunal considerada “progressista”

 

CENTRÃO

Cármen Lúcia

PRESIDENTE

É progressista em questões sociais, mas dura em relação a foro privilegiado

 

Rosa Weber

Concedeu habeas corpus em apenas 4% dos casos que chegaram ao seu gabinete

 

Ricardo Lewandowski

Tem perfil menos duro em decisões criminais; é sensível ao direito de defesa

 

Dias Toffoli

VICE-PRESIDENTE

Atuação indica um processo de afirmação e independência em relação ao PT

 

PROVOCADOR

Marco Aurélio Mello

Atua como consciência crítica dos colegas e ‘vota vencido’ (com a minoria)

 

CONCILIADOR

Celso de Mello

Em decisões importantes, atua como “estabilizador” nos julgamentos da Corte

 

FONTES: SUPREMO EM NÚMEROS E SUPREMO EM PAUTA

*Não integra o STF; indicado ainda será sabatinado no Senado

 

 

O QUE ELE JÁ DISSE

Indicado. Ministro licenciado da Justiça, Alexandre de Moraes foi escolhido pelo presidente Michel Temer para integrar o Supremo na vaga de Teori Zavascki

 

Eles (manifestantes que protestaram contra o impeachment de Dilma Rousseff no ano passado) agiram como (em) atos de guerrilha.”

 

Nada justifica a obrigatoriedade do contribuinte brasileiro sustentar inúmeras agremiações partidárias e seus respectivos dirigentes.”

 

Eu tenho absoluta certeza que as leis brasileiras são muito brandas.”

 

O Brasil, historicamente, prende muito, mas prende mal. O Brasil prende quantitativamente, mas não prende qualitativamente.”

 

Obviamente, o poder investigatório do Ministério Público não é sinônimo de poder sem limites ou avesso a controles.”

 

A mulher que acaba engravidando (após um estupro) deve ter total liberdade de opção para decidir se quer ou não manter (a gravidez).”

 

Os direitos humanos fundamentais não podem ser utilizados como um escudo protetivo da prática de atividades ilícitas.”

 

 

 

O Estado de São Paulo, n. 45043, 12/02/2017. Política, p. A6.