Transposição poderá ter gestão privada

Andrea Jubé e Daniel Rittner

27/01/2017

 

 

O ministro Helder Barbalho: "Preocupação é com a sustentabilidade do projeto. Sem isso, podemos até perder a outorga"

 

 

Perto de concluir a transposição do rio São Francisco, após dez anos de obras e vários descumprimentos no cronograma, o governo estuda uma parceria público-privada (PPP) para tocar a operação e a manutenção do empreendimento. A ideia por trás de uma eventual transferência do sistema para gestão privada é reduzir os custos operacionais, que têm sido objeto de discussões entre o Palácio do Planalto e governadores dos Estados beneficiados pela transposição.

Estimativas preliminares do governo apontam que o custo ficará em torno de R$ 320 milhões por ano. Uma audiência pública foi aberta pela Agência Nacional de Águas (ANA) para receber, até o dia 26 de fevereiro, contribuições sobre a metodologia de cálculo das receitas e despesas dos dois canais em fase final de construção. O projeto já tem 94,6% das obras prontas, segundo o Ministério da Integração Nacional.

De acordo com um decreto assinado em 2006, no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os quatro Estados que vão receber as águas do São Francisco deverão ressarcir a estatal Codevasf - operadora da transposição em um primeiro momento - pelos custos operacionais. Devido à crise fiscal, está praticamente descartada a possibilidade de uso de recursos orçamentários.

Os governadores Camilo Santana (CE), Paulo Câmara (PE), Ricardo Coutinho (PB) e um representante do Rio Grande do Norte estiveram anteontem na Casa Civil para analisar alternativas e chegaram a um consenso: vão enviar projetos de lei às suas assembleias legislativas para criar um "encargo tarifário" nas contas de água. O encargo já estava em um termo de compromisso firmado pelos governos estaduais na década passada e será rateado por todos os consumidores de cada Estado - e não só por aqueles diretamente beneficiados pela transposição. As projeções indicam um adicional de 8%, em média, na tarifa dos consumidores.

"A nossa preocupação é com a sustentabilidade do projeto. Sem isso, podemos até perder a outorga dos recursos hídricos", disse ao Valor o ministro Helder Barbalho. Segundo ele, caberá a cada Estado definir se adota ou não uma tarifa social para atenuar o impacto à população de baixa renda. "É importante achar um ponto de equilíbrio", acrescenta.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já foi acionado pelo ministro para fazer os estudos de viabilidade sobre uma PPP para a operação do projeto. Ele também encaminhou a proposta para o secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco, que passará a acompanhar esses estudos.

Helder avalia que o governo precisa "tomar muito cuidado para evitar o risco de ineficiência" na operação do projeto, mas ressalta a importância dos estudos para definir se a ideia de uma PPP poderá ser realmente levada adiante. "Tem que ser bom para todos os lados: consumidores, entes federados e setor privado."

A intenção do governo é entregar o Eixo Leste, com 217 quilômetros de canal, entre o final de fevereiro e o início de março. O enchimento dos reservatórios permitirá à região metropolitana de Campina Grande (PB) livrar-se da crise hídrica que enfrenta. A região Nordeste vive a pior seca dos últimos 100 anos.

No Eixo Norte, com 252 quilômetros, houve um descasamento das obras. Dois dos três trechos estão na reta final de construção, mas outro foi paralisado por causa da desistência da Mendes Júnior, empreiteira responsável pelos serviços. Uma licitação para substituí-la foi aberta e a assinatura do novo contrato está prevista para fevereiro. Isso levou, porém, a um novo atraso na conclusão do canal. Agora, a perspectiva dada pelo governo é que as águas do São Francisco cheguem ao reservatório de Jati (CE) em agosto e comecem, então, a ajudar no abastecimento da região metropolitana de Fortaleza.

Helder admite a imagem da transposição ficou desgastada com o histórico de prazos descumpridos, denúncias de sobrepreço nas obras e problemas de planejamento. Ele garante, contudo, que o projeto entrou nos trilhos e estará operando em 2017.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4183, 27/01/2017. Política, p. A3.