Valor econômico, v. 17, n. 4191, 08/02/2017. Brasil, p. A5

Governo fecha proposta para risco cambial

Concessões de aeroportos vão ter mecanismo para atenuar desvalorizações súbitas do real

Por: Daniel Rittner

 

O governo já tem uma proposta de proteção cambial para minimizar o risco de investidores nas próximas concessões de infraestrutura. A ideia é usar o mecanismo no leilão de quatro aeroportos - Fortaleza, Salvador, Porto Alegre e Florianópolis - marcado para o dia 16 de março.

Para facilitar a emissão de dívida em moeda forte pelas futuras concessionárias, o governo pretende mexer na contribuição variável paga anualmente ao Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC) como modo de amenizar eventuais flutuações súbitas do real.

A cobrança de outorga dos aeroportos privatizadas é cobrada de duas formas. Uma, a contribuição fixa, reflete o valor oferecido no lance vencedor da disputa. Outra, a contribuição variável, representa uma taxa de 5% da receita bruta de cada aeroporto.

A proposta de "seguro cambial" do governo envolve o acompanhamento anual de dois indicadores: a evolução do câmbio e a evolução do benchmark (que leva em conta, entre outros fatores, a inflação acumulada pelo IPCA e o risco-país). Quando a desvalorização do real ficar acima da flutuação da segunda conta, haverá aplicação de um desconto no valor devido pelas concessionárias como outorga variável, que pode chegar a zero. O percentual de desconto seria aplicado sobre o montante total dívida em dólar.

Por exemplo: a nova operadora aeroportuária toma um crédito de US$ 100 milhões no exterior, o real se desvaloriza em 20% e o benchmark evolui 7%. A diferença de 13 pontos percentuais se transforma em um desconto de US$ 13 milhões na contribuição variável. Se não conseguir gastar todo esse desconto de uma tacada só, a concessionária acumula esse crédito para o ano seguinte.

Na prática, o governo abre mão de engordar o caixa do FNAC em caso de desvalorizações abruptas do real. Concebido como forma de investir em aeroportos deficitários mantidos pela Infraero, o fundo tem sido contingenciado para diminuir o déficit primário.

Para as concessionárias que optarem pela proteção, haverá necessidade de pagamento maior da contribuição variável quando o benchmark superar a evolução do câmbio. Nesse caso, ela poderá ter que pagar ao governo até 10% da receita bruta.

O mecanismo foi desenhado pela secretaria-executiva do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e será colocado em consulta pública por um prazo de dez dias. A intenção é receber sugestões de interessados e lançar o seguro cambial antes do leilão. O aviso de abertura da consulta deverá sair até o fim desta semana.

Para o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, essa fórmula dá a "robustez necessária" à modelagem de financiamento desejada pelo governo, que prevê menos empréstimos subsidiados do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). "É um grande avanço que estamos dando, mas queremos receber sugestões", afirmou Moreira ao Valor.

"Essa solução será vista como afirmação do esforço que estamos fazendo para garantir transparência, credibilidade e concorrência", acrescentou o ministro, que continua à frente do PPI.

A proteção cambial será optativa, não obrigatória, para os ganhadores dos leilões. Uma das principais demandas dos investidores estrangeiros nos "road shows" para divulgar concessões de infraestrutura era um mecanismo capaz de atenuar oscilações de câmbio no curto prazo.

O objetivo é permitir que as empresas vencedoras possam aproveitar o ambiente internacional de juros baixos para captar recursos baratos. A nova política de financiamento do BNDES definiu que o banco financiará, no máximo, 40% das concessões de aeroportos com base na TJLP.

Por outro lado, o maior entrave para lançar debêntures de infraestrutura no mercado brasileiro são as altas taxas de juros. Hoje, o financiamento no exterior está barato e farto, mas potenciais investidores quebram a cabeça com o risco de ficar com dívida em dólar e receitas em reais. A proposta minimiza esse risco, desafoga o BNDES e cria uma alternativa às debêntures em reais.