Valor econômico, v. 17, n. 4191, 08/02/2017. Especial, p. A14

Parlamentares pressionam governo a reabir Refis

Com apoio de empresários, mais de 300 sugestões visam mudar parcelamento das dívidas

Por: Raphael Di Cunto

 

Parlamentares e empresários se articulam no Congresso para modificar o Programa de Regularização Tributária (PRT), espécie de Refis lançado pelo governo no fim do ano, com o objetivo de ampliar o número de parcelas, diminuir o valor dos pagamentos e permitir desconto nas multas, juros e encargos financeiros de dívidas com a União.

O prazo de apresentação de emendas acabou ontem, com quase 300 sugestões à Medida Provisória (MP) 766/2017 - a demanda era tanta que uma fila com uma dezena de assessores se formou no protocolo. O relator será um deputado e o presidente da comissão, um senador, mas os nomes não estão definidos e ainda não há reunião marcada para iniciar as discussões. Mesmo que o relator não acate as emendas, partidos podem pedir a votação direto em plenário.

Pressionado pelos congressistas e empresários a encampar um programa de refinanciamento de dívidas (refis), o governo sinalizou com a reabertura do parcelamento, mas no fim atendeu aos apelos da equipe econômica e mandou uma versão mais dura, que permite utilizar os prejuízos fiscais de anos anteriores para abater a dívida, mas sem desconto na multa ou juros e com prazo mais curto, de dez anos.

Para o deputado Alfredo Kaefer (PSL-PR), autor de projeto para criar um Refis nos moldes dos realizados anteriormente, com parcelamento longo (20 anos), desconto generoso na multa e juros e sem que a empresa perca os benefícios caso atrase novos impostos, as regras propostas pelo governo não resolvem o problema dos empresários, que estão quebrados depois de três anos seguidos de crise econômica.

"Essa versão está muito ruim. Beneficiou meia dúzia de empresas grandes que têm crédito fiscal e pouca dívida, que não vão nem entrar no parcelamento, vão só usar esses créditos para abater as dívidas e zerar suas posições com a União", afirma Kaefer. "Está uma chiadeira no Brasil inteiro, do grande ao pequeno empresário, porque assim não resolve nada para os outros."

Também fizeram emendas para abrir um "verdadeiro Refis" os deputados Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), Nelson Padovani (PSDB-PR) e Luís Carlos Heinze (PP-RS). O Refis de Heinze, por exemplo, permite parcelar dívidas em até 30 anos. O abatimento nos juros e multas depende do número de parcelas, mas variaria de 100% a 20%.

Empresários contam com apoio de deputados e senadores para modificar o texto em tramitação e convencer o governo a não vetar as alterações. O Ministério da Fazenda é contra a flexibilização, dizendo que isso estimula a inadimplência e que a maioria das empresas adere ao Refis para conseguir as certidões negativas e, depois, deixa novamente de pagar os impostos. Procurada, a Receita não quis comentar as emendas.

Pressão pela reabertura do Refis a parte, a maioria das emendas apresentadas tenta modificar as regras do programa. Parlamentares de PR, PP, PSDB, PSD, PSB, PTB, entre outros, querem ampliar o prazo de parcelamento, limitado a dez anos pela MP, permitir desconto nos juros e multa e autorizar o uso dos prejuízos fiscais para abater não só as dívidas com a Receita, como está no projeto, mas também as já inscritas na dívida ativa.

Há demanda também para liberar as companhias de apresentarem garantias para renegociar a quitação de dívidas superiores a R$ 15 milhões com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e para atrelar o valor das parcelas a um percentual do faturamento da empresa. O argumento é que, se a crise continuar e a receita cair mais, será impossível manter os pagamentos sem uma redução no fluxo.

Líder do PSDB no Senado, Paulo Bauer (SC) apresentou emenda com todas essas modificações. "A ideia da equipe do ministro [da Fazenda, Henrique] Meirelles, de utilizar prejuízos que a empresa teve para amortizar débitos tributários, é inovadora e positiva. Porém, no momento de crise que estamos, é pesado para empresa pagar à vista os 20% do débito, descontando-se os prejuízos fiscais", afirmou. "Ou reduz a multa e encargos do valor ou, se não for possível, se parcele o débito em mais vezes. Do contrário acho difícil resolver o problema da inadimplência", disse.

A MP prevê que, para as dívidas com a Receita, a empresa poderá abater até 80% com o uso de prejuízos fiscais ocorridos até 2015, mas terá que quitar o restante à vista, ou descontar 76% com os créditos fiscais e parcelar o restante em 24 vezes. Não há outros benefícios para quem não tiver prejuízos a abater além de parcelar o pagamento da dívida.

Para empresários e especialistas, sem mudanças a adesão será baixa. "As empresas que tinham um grande estoque de prejuízo fiscal utilizaram dentro das leis anteriores [do Refis]. O que se tem agora é o prejuízo gerado entre 2014 e 2015, que é insuficiente", diz a advogada Edrisa Pereira, que tem prestado consultoria para associações e empresas interessadas na renegociação. Segundo ela, poucos setores serão beneficiados, entre eles as operadoras de telecomunicações.

Outro ponto que causa bastante preocupação nos empresários, e é assunto de quase uma dezena de emendas, é a proibição para que as dívidas reparceladas sejam escritas futuramente em um outro programa de financiamento que for instituído pela União. O devedor que aceitar renegociar agora não poderá aderir a um reparcelamento mais vantajoso no futuro.

Um complicador é que a adesão ao PRT acaba em 31 de maio, poucos dias antes do fim do prazo para o Congresso votar a MP - e bem antes de o presidente Michel Temer decidir se sanciona ou veta as eventuais mudanças. As empresas terão que decidir se arriscam esperar por alterações no programa ou se aderem antes para garantir o parcelamento.

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Reforma da Previdência divide população

Por: Vandson Lima e Andrea Jubé

 

A população está dividida em relação à reforma da Previdência Social, quer mais cortes de gastos na máquina pública e, descrente do quadro político atual, espera o surgimento de novas lideranças. Essas são algumas das conclusões de uma pesquisa popular encomendada pelo PMDB, à qual o Valor teve acesso em primeira mão.

Realizada por telefone entre 20 e 26 de janeiro, com 1.038 entrevistados, a sondagem mostrou que 44,3% são contrários às mudanças nas regras da aposentadoria e, igualmente, 44,3% são a favor. A proposta de reforma, encaminhada pelo governo ao Congresso Nacional em dezembro e cuja aprovação é considerada prioridade neste primeiro semestre legislativo, encontra mais apoio entre os mais jovens e escolarizados - por consequência, os que estão mais próximos da aposentadoria temem mais pelas alterações propostas.

Entre os que têm mais de 60 anos, 53,6% são contra. Já entre os mais jovens, há clara aceitação: de 16 a 24 anos, 57% são favoráveis à reforma. O Nordeste é a região mais contrária (55,1%) e o Sudeste, o mais favorável, com 55,2%. O alcance das novas regras para aposentadoria também divide a população: 48% acham que só devem valer para quem ainda não começou a trabalhar. Já o estabelecimento de idade mínima tem maior consentimento: 61,2% concordam. Mais uma vez, os mais jovens (72%) são os que mais concordam com a mudança e o estabelecimento de idade mínima. O percentual vai caindo conforme aumenta a idade do entrevistado.

No entanto, o discurso do governo encontra uma dificuldade, pois 85,2% acham que, antes de mexer nas regras da Previdência, o governo precisa cortar mais de seus próprios gastos. Ou seja, o governo precisa trabalhar no convencimento da população de que é preciso priorizar as mudanças nas regras para aposentadoria ou continuará enfrentando a crítica de que ainda não fez sua parte antes de cortar benefícios.

Neste ponto, aliás, o teste de argumento (em que o entrevistado escolhe entre uma resposta ou outra), mostra um amplo apoio a medidas de ajuste: 66,4% concordam que ainda há espaço para cortes de gastos e apenas 27,4% preferem a resposta de que já é hora de focar em medidas de estímulo à economia para o país voltar a crescer. De acordo com a pesquisa, cujo levantamento foi feito pela Datamétrica e a análise e balizamento de dados é do cientista político Rodolfo V. de M. da Costa Pinto, o brasileiro está pessimista. Somam 78% os que avaliam que no último ano o Brasil está "cada vez pior". Esse sentimento é especialmente agudo entre pessoas com nível educacional até o ensino fundamental e habitantes da região Nordeste. Para os próximos anos, percebe-se bastante ceticismo: 38% acreditam que a situação do país vai piorar, mesmo percentual dos que acham que irá melhorar. Outros 15% creem que a situação ficará igual.

Os mais pessimistas estão na faixa entre 45 e 59 anos - 81,2% acham que está cada vez pior, percentual que vai a 83,5% no Nordeste.

A corrupção (29%) é o principal problema para os brasileiros, aponta a sondagem. Porém, uma análise cuidadosa dos números, salienta o pesquisador, revela diferenças sutis de opinião: "Mulheres e habitantes das regiões Norte e Centro-Oeste veem a saúde como principal lacuna. Corrupção é um problema maior para os homens e residentes no Sudeste. Desemprego é o foco de preocupação no Nordeste e a violência no Norte", anota.

A pesquisa tem uma série de questões voltadas especificamente ao Senado - o que não é por acaso, já que o PMDB é dominante na Casa, com 21 dos 81 senadores. A cada quatro cadeiras do Senado, uma pertence ao PMDB, cuja bancada é equivalente às de PSDB e PT somados. Somam 62% os entrevistados que se dizem pouco informados sobre o Senado. Entre os muito informados 61,2% fazem avaliação negativa das atividades da Casa.

A população, no entanto, tem uma percepção bastante clara sobre quais deveriam ser as prioridades do Senado: saúde (67%), segurança e combate ao tráfico (52%), reforma da educação (45,3%) dominam as respostas. Temas caros ao governo, como ajuste fiscal (6,2%) e reforma da Previdência (9,2%) são menos lembrados.

Na avaliação das instituições, o cenário é bastante desfavorável à classe política. Os partidos políticos têm o maior índice de avaliação negativa, com 67,9%, seguido pela Câmara dos Deputados, com 57,5%. A Presidência da República tem avaliação negativa de 50,1% dos entrevistados e o Senado, 44,2%.

Com tamanha rejeição aos ocupantes dos Poderes eleitos pelo voto, é de se esperar que a população anseie por novidades. Por isso, 73,4% dos entrevistados creem que o Brasil precisa de novas lideranças políticas. Apenas 20,1% acham que o país precisa de lideranças experientes, capazes de fazer acordos para o Brasil avançar.

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Relator quer ampliar mudança trabalhista

Por De Brasília

 

Indicado relator da reforma na legislação trabalhista encaminhada pelo governo Temer, o deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) ampliará o escopo do projeto, já bastante abrangente, para incluir também regras para o teletrabalho (à distância) e jornada intermitente (que pode pagar até por hora trabalhada) na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), conforme antecipou na segunda-feira o Valor PRO, serviço de tempo real do Valor.

"A CLT é de 70 anos atrás. O mundo se modernizou e as formas de trabalho também, mas a legislação não acompanhou essa evolução e por isso causa insegurança jurídica, dificultando a criação de novos postos de trabalho", afirmou o tucano, que está em seu terceiro mandato e preside a Frente Parlamentar do Setor de Serviços. "O projeto do governo é bom, mas foi pensado mais para os empregos da indústria e hoje somos um país de serviços."

A comissão será instalada amanhã, com a eleição do presidente - ainda não definido - e Marinho como relator. A estimativa do tucano é debater por cerca de três ou quatro meses e votar o projeto na comissão e no plenário até julho. Nesse cronograma, a proposta seria votada no Senado no segundo semestre. "Vou apresentar minhas ideias, mas o texto aprovado será fruto de um entendimento de toda a comissão", afirmou Marinho.

O projeto do governo já é considerado bem amplo por centrais sindicais e entidades patronais. Permite que os acordos coletivos prevaleçam sobre a legislação em alguns pontos, como negociar a divisão de férias, ampliar para até oito meses os contratos de trabalho temporário, aumentar a jornada em tempo parcial e a punição por manter funcionários sem registro em carteira.

Contudo, segundo Marinho, há mais de 2 mil projetos em tramitação no Congresso com mudanças na legislação e que passarão por um pente fino para ver o que pode ser aproveitado pela comissão. O relator quer discutir o assunto em audiências públicas, mas defende que a proposta avance sobre o trabalho à distância ("home office") e o trabalho intermitente (quando há interrupção de jornada para se ajustar a demanda da empresa, sem um horário fixo).

O governo Temer chegou a discutir os dois pontos com representantes de trabalhadores e de empresas, mas desistiu para evitar atritos com sindicatos. Só o que tinha razoável consenso entrou no texto, mas caberá ao Congresso decidir a versão final. "A legislação hoje é insuficiente para atender todas as formas de trabalho", diz Marinho.

Por outro lado, o tucano pretende deixar de fora outro assunto caro aos empresários: a regulamentação dos contratos de mão de obra terceirizada. "Isso só atrasaria discussões que estão mais avançadas", opina. Há duas propostas com tramitação mais adiantada: uma no Senado, onde o relator Paulo Paim (PT-RS) travou as discussões; e outra na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, de 1998, em fase final de análise.

Amanhã também será instalada na Câmara outra comissão importante para o governo: a reforma da Previdência. O presidente será Carlos Marun (PMDB-MS) e o relator, Arthur Maia (PPS-BA).