Valor econômico, v. 17, n. 4196, 15/02/2017. Política, p. A6

Projeto de reforma da previdência de militares deve ficar para 2º semestre

Por: Raphael Di Cunto / Edna Simão

 

Cresce no governo o entendimento de que é melhor encaminhar o projeto de lei que altera as regras de aposentadoria e pensões das Forças Armadas só quando o Congresso aprovar a proposta de emenda à Constituição (PEC) da Reforma da Previdência. Se essa articulação, que tem apoio de deputados e ministros, prevalecer, o envio do texto com mudanças na Previdência dos militares deverá ocorrer apenas no segundo semestre.

O anúncio, até então, era que as negociações terminariam no fim de janeiro ou início de fevereiro. Mas parlamentares e ministros responsáveis pelas conversas têm avaliado que tratar dos dois projetos ao mesmo tempo atrapalhará na aprovação da PEC no Congresso, que exige muito mais apoio parlamentar.

Segundo um interlocutor do governo, o adiamento servirá para reduzir as resistências. "Os dois lados vão ficar insatisfeitos com o projeto", afirma essa fonte. Os militares porque terão um endurecimento nos critérios para aposentadoria, com idade mínima - o que eles não querem. E o resto da população porque as regras para os militares não serão tão duras quanto as do regime geral.

A bancada da bala, composta por vários partidos, é uma das mais ativas na discussão. Dos 64 integrantes da comissão especial da Câmara, oito são representantes de policiais, Exército e bombeiros e se movimentam para deixar as corporações de fora das novas normas. Para atender essas categorias já está em estudo uma regra especial para que as atividades que envolvem risco à vida, como policiais que atuam em atividades de segurança, tenham um tratamento diferenciado.

Soma-se a isso a crise de segurança pública no Espírito Santo, que o Executivo federal não quer replicada nos demais Estados em meio aos debates da PEC da Previdência, quando haverá grande tensão. O relator na Câmara, Arthur Maia (PPS-BA), já avisou no dia de abertura dos trabalhos que não aceitará nenhuma emenda visando incluir Forças Armadas, policiais e bombeiros militares na proposta analisada.

Por enquanto, a expectativa no governo é que a reforma para a população em geral seja aprovada no Congresso ainda no primeiro semestre, mas já se admite internamente que essa tramitação seja finalizada em agosto ou setembro. Se a articulação política do governo sustentar a ideia de tratar um assunto de cada vez, as Forças Armadas ganharão tempo para negociar um tratamento diferenciado - ou até evitarem a reforma dos benefícios.

Um dos vice-líderes do governo na Câmara, Darcísio Perondi (PMDB-RS) defendeu ontem que a proposta de alteração nas regras para os militares seja encaminhada "o mais rápido possível", mas disse que tudo depende de negociações políticas. "Eu defendo que seja em 30 dias, que mande o mais rápido possível a lei ordinária", disse. Questionado sobre se o governo realmente trabalha com esse prazo, o pemedebista falou que não poderia afirmar isso com segurança. "É o governo que define em cima das suas negociações", contou.

O ministro da Defesa, Raul Jungmann - que é deputado pelo mesmo partido do relator da Previdência, o PPS-, tem defendido que os militares precisam ter, como já acontece em boa parte dos países, um regime diferenciado de aposentadoria. O argumento é que, ao contrário de outros trabalhadores, eles não podem se sindicalizar e fazer greve, não têm Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e, mesmo quando entram na reserva, podem ser convocados para trabalhar, como ocorreu na Olimpíada do Rio de Janeiro.

Quando encaminhou a PEC ao Congresso, em dezembro, o governo Temer foi alvo de inúmeras críticas por deixar de fora os militares, cujo déficit com aposentadorias e pensões é expressivo. O rombo da previdência dos servidores públicos federais, inclusive militares, somou R$ 77,1 bilhões no ano passado - R$ 34 bilhões apenas dos militares. As Forças Armadas, porém, só consideram como déficit a despesa com pensões, em torno de R$ 13 bilhões.

O ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, afirmou recentemente que os militares serão atingidos pela reforma que estabelece o novo regime geral com idade mínima de aposentadoria de 65 anos, mas haverá especificidades inerentes à categoria. No geral, teriam que obedecer, por exemplo, o teto do novo regime de previdência, ou seja, o valor máximo de aposentadoria do INSS, que atualmente é de R$ 5.531,31, deixando de passar para a reserva com o benefício equivalente ao salário dos militares da ativa.

Entre as propostas em estudo estão o aumento do tempo de serviço do militar de 30 para 35 anos, a idade mínima para passarem para a reserva e a cobrança de uma alíquota de 11% de contribuição para os pensionistas, que hoje são isentos. Também pode haver aumento no percentual descontado dos salários para contribuir com a previdência.

_______________________________________________________________________________________________________

Relator propõe só um mês de debates até o parecer

Por: Raphael Di Cunto / Edna Simão

 

Articulado pelo governo, o calendário apresentado pelo relator da reforma da Previdência Social na Câmara, deputado Arthur Maia (PPS-BA), prevê apenas um mês de debates antes da apresentação do parecer que será analisado pela comissão especial. Pelo cronograma inicial, o relatório seria divulgado dia 16 de março.

Se essa data fosse mantida, o governo teria condições de iniciar a discussão e votar a proposta na comissão especial já no dia 20 de março - calendário bastante enxuto, mas que, como o Executivo demonstrou na proposta de emenda à Constituição (PEC) do Novo Regime Fiscal, factível.

A oposição e parte da base governista reclamaram do cronograma "engessado" e do pouco espaço para realização de audiências públicas, o que fez o relator decidir excluir as datas do plano de trabalho. Mas Maia e o presidente da comissão, Carlos Marun (PMDB-MS), disseram que o prazo só deve ser adiado "em um ou dois dias", para comportar mais uma ou duas audiências públicas sugeridas.

"Na minha cabeça ainda é esta data [16 de março]. Pode mudar para mais um dia ou dois, se acrescentarmos mais audiências públicas, mas não mais do que isso", afirmou Maia, que prevê, porém, um prazo "razoável" entre a apresentação do relatório e a votação. A ideia é ouvir cerca de 40 pessoas em cerca de dez audiências públicas e um seminário internacional.

Deputados da oposição protestaram que o calendário dava menos de um mês para os debates de uma matéria tão complexa. "Acredito que nenhum parlamentar quer deliberar sobre aquilo que atingirá 200 milhões de brasileiros, além daqueles que vão nascer, de forma açodada e sem informações precisas", afirmou Arlindo Chinaglia (PT-SP).

Para oposicionistas, a exclusão das datas do plano de trabalho foi uma derrota do governo, tese rebatida pelo presidente da comissão. "Quisemos ser democráticos. O governo aprovou o que quis e que não quis nem entrou em pauta", afirmou. Requerimentos do PT e do PCdoB para que fossem instituídas sub-relatorias e realizadas audiências nos Estados foram derrotados.

A comissão começa hoje os debates com audiência pública do secretário da Previdência, Marcelo Caetano. Em uma palestra para jornalistas ontem, ele defendeu que, se a reforma não for aprovada, os gastos com pagamento de aposentadoria e pensões chegarão a 80% da despesa primária do país em dez anos. Com as mudanças, o percentual será reduzido para 66%. Atualmente, a Previdência consome a metade da despesa primária.

Ainda na linha de mostrar a gravidade da situação das contas da previdência, o assessor especial do Ministério do Planejamento, Arnaldo Lima, acrescentou que, sem o Novo Regime Fiscal e a aprovação da Reforma da Previdência Social, a relação dívida bruta/PIB chegaria a 98,6% em 2019. Por outro lado, se for cumprida a PEC do teto de gasto e realizada a reforma, essa relação se estabilizaria em 78,7%. "É uma agenda pró-crescimento", disse. Com as reformas, afirmou, o país economizará R$ 156 bilhões com juros, o que permitirá queda da taxa de juro real no longo prazo.

Ex-secretário da previdência, o consultor legislativo Leonardo Rolim afirmou que há espaço para acabar com a isenção de contribuições previdenciárias que filantrópicas de educação têm direito. "O benefício foi pensado para dar bolsas em universidades particulares. O Prouni criou sistema de bolsas muito mais justo, que depende de nota e da renda, do que da escolha da universidade. É algo a ser repensado", disse. Já outras isenções, como para saúde e assistência social, na verdade economizam recursos da União e, na opinião de Rolim, devem ser preservadas.

_______________________________________________________________________________________________________

Temer vê tentativa de imputar-lhe pecha de censor

Por: Cristiane Agostine / Andrea Jubé / Vandson Lima

 

O presidente da República, Michel Temer, reclamou ontem da tentativa de "imputar-lhe a pecha de inimigo e censor da imprensa", segundo o porta-voz da Presidência. O pemedebista, completou, tem "compromisso permanente e inarredável" com a "liberdade de imprensa".

"O presidente notou que no dia de hoje tentou-se imputar-lhe a pecha de inimigo e censor da imprensa. A vida política, profissional e pública do presidente Michel Temer é reveladora de seu compromisso permanente e inarredável com a defesa e a promoção da necessidade central da liberdade de imprensa para a democracia", afirmou o porta-voz.

As afirmações foram dadas sem a citação direta da proibição, decretada pela Justiça, de jornais de publicarem investigações envolvendo a primeira-dama, Marcela Temer. O porta-voz disse que Temer "sempre esteve em linha" com a "defesa dos princípios e valores" da imprensa, mas afirmou que "o que se discute na Justiça é tema distinto".

A proibição foi gerada em resposta a uma petição assinada pelo subchefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil, Gustavo do Vale Rocha. O juiz Hilmar Castelo Branco Raposo Filho, da 21ª Vara Cível de Brasília, proibiu os jornais "O Globo" e "Folha de S.Paulo" de publicarem a notícia sobre a primeira-dama. Os jornais consideram censura a decisão judicial.

Em abril de 2016, um hacker chamado Silvonei de Jesus Souza furtou arquivos de celular e e-mail de Marcela Temer e depois chantegeou-a. Investigado, o hacker foi identificado, processado e condenado em outubro do ano passado a cumprir pena de cinco anos e dez meses de prisão.

"O Globo" e a "Folha" publicaram parte da chantagem, o que foi proibido pelo juiz na sexta-feira. A decisão foi recebida pelos jornais na segunda-feira.

Conforme o magistrado, "a inviolabilidade da intimidade tem resguardo legal claro". Os dois veículos retiraram de seus sites a notícia envolvendo Marcela.

A "Folha de S. Paulo" recorreu da decisão na segunda-feira. A liderança do PT no Senado protocolou ontem representação na Comissão de Ética Pública da Presidência da República contra as providências tomadas pelo subchefe da Casa Civil.

"Não dá para uma pessoa estar no exercício da função pública atuando em interesses privados", protestou a líder do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR).

A intenção da ação é que Gustavo do Vale Rocha sofra uma censura pública ou mesmo seja demitido.

Entidades que representam jornalistas e empresas de comunicação criticaram a decisão judicial. Em nota conjunta, Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert), Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner) e Associação Nacional de Jornais (ANJ) a classificaram como um ato de censura prévia.