Valor econômico, v. 17, n. 4197, 16/02/2017. Política, p. A9
Lula lidera em todos os cenários, diz pesquisa
CNT/MDA indica redução da aprovação de governo de Temer e queda de presidenciáveis tucanos
Por: Cristiane Agostine / Fabio Murakawa
Em meio à queda da aprovação do governo Michel Temer, com avaliação positiva de apenas 10,3% da população, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, réu em cinco processos relacionados à corrupção, aumentou suas intenções de voto e lidera em todos os cenários a disputa pela Presidência em 2018, no primeiro e segundo turnos, segundo pesquisa divulgada na manhã de ontem pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), em parceria com o instituto MDA.
O levantamento indica também o crescimento de uma possível candidatura do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), e a queda das intenções de voto da ex-senadora Marina Silva (Rede) e dos presidenciáveis tucanos: o senador Aécio Neves (MG), que preside nacionalmente a sigla, e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin.
Em cenário para o primeiro turno com a presença do ex-ministro Ciro Gomes (PDT) e do presidente Michel Temer (PMDB), Lula tem 30,5%, mais do que os 24,8% registrados na pesquisa anterior, de outubro. Marina tem 11,8% ante 13,3% que tinha há quatro meses.
Marina está empatada com Bolsonaro, que ficou com 11,3% e cresceu em relação a outubro, quando tinha 6,5%. Aécio tem 10,1%, ante 15,7% da pesquisa anterior. Ciro tem 5% e no levantamento passado, 7,4%. Temer registrou 3,7%, também uma queda em relação aos 6,2% registrados em outubro.
Nesse cenário, a pesquisa CNT/MDA detalhou o perfil dos eleitores de pré-candidatos à Presidência em 2018. Lula tem maior intenção de voto entre os menos escolarizados, com menor renda e moradores da região Nordeste. Aécio também tem melhor desempenho entre os eleitores com menor renda e menos escolaridade, mas vai melhor na região Sudeste.
Já Marina e Bolsonaro têm maior intenção de votos entre os eleitores com ensino superior e com renda acima de cinco salários mínimos. O deputado do PSC é mais popular entre os homens e jovens entre 25 e 34 anos, do Sudeste e Sul.
No segundo cenário, com Alckmin como candidato do PSDB, Lula tem 31,8%, Marina 12,1%, Bolsonaro 11,7%, Alckmin 9,1%, Ciro 5,3% e o empresário do setor têxtil Josué Alencar (PMDB), 1%. O terceiro cenário exclui Temer e o pedetista e mostra Lula com 32,8%. Marina Silva com 13,9%, Aécio com 12,1% e Bolsonaro com 12%.
O instituto testou seis cenários para o segundo turno. Lula venceria Aécio, Marina e Temer. A maior diferença é em relação ao presidente, que seria derrotado por 42,9% a 19%. Aécio ganharia de Temer e empataria com Marina. A ex-senadora derrotaria o presidente no confronto direto. Bolsonaro não foi incluído nas simulações.
Para o presidente da CNT, Clésio Andrade, o aumento da popularidade de Lula pode ser explicado pelas "saudades" de seus dois mandatos. "A comoção pesou a favor e provavelmente alguma coisa de saudade, dos bons tempos de Lula", disse Clésio, citando também a morte da esposa do ex-presidente, Marisa Letícia, neste mês.
Clésio afirmou que com aumento das intenções de voto de Bolsonaro, o nome do deputado será testado para o segundo turno na próxima pesquisa.
O levantamento mostra uma queda da avaliação positiva do governo Temer de 14,6% para 10,3%. O percentual é próximo do menor patamar já registrado pela pesquisa, de 8%, em julho de 2015, pela então presidente Dilma Rousseff. A aprovação pessoal de Temer também teve queda, de 31,7% para 24,4%.
A avaliação negativa do governo subiu de 36,7% para 44,1% no período. Para 38,9%, a avaliação foi regular. Não souberam opinar 6,7% contra 12,5% em outubro. A desaprovação pessoal de Temer subiu de 51,4% para 62,4%. Nesse quesito, 13,2% não opinaram.
O levantamento revela também que 68,1% dos brasileiros acreditam que a Operação Lava-Jato vai reduzir em algum nível a corrupção no Brasil nos próximos anos. Mas apenas 4,9% creem que acabará com a corrupção. Ao todo, 89,3% disseram já ter ouvido falar da operação.
A pesquisa ouviu 2.002 pessoas em 138 municípios, de 25 Estados, entre os dias 8 e 11 de fevereiro. A margem de erro é de 2,2 pontos percentuais, para mais ou para menos, com 95% de nível de confiança.
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Presidente nacional do PSC, partido do deputado federal Jair Bolsonaro, o pastor Everaldo Pereira afirma que o estremecimento entre os dois ficou para trás e que "se quiser" Bolsonaro será o candidato da legenda à Presidência em 2018.
Na pesquisa CNT/MDA divulgada ontem, o deputado foi o que mais cresceu no cenário principal e quase dobrou sua intenção de voto em relação ao levantamento de outubro.
Bolsonaro aparece numericamente à frente do senador mineiro Aécio Neves (PSDB), num empate técnico em segundo lugar com o tucano e com a ex-senadora Marina Silva (Rede). O aumento absoluto de Bolsonaro foi de 4,8 pontos percentuais, mas proporcionalmente avançou 74%.
"A relação com o deputado Jair Bolsonaro é excelente, a melhor possível. É o meu candidato à Presidência da República. Quem vive de passado é museu. Águas passadas não movem moinhos", afirma Everaldo Pereira ao Valor.
O presidente do PSC, que foi candidato ao Planalto em 2014, diz que, apesar das desavenças com Bolsonaro, o partido cumprirá a "palavra única que temos com ele", de lhe assegurar a legenda. Em reunião com a bancada federal e o diretório nacional do PSC, Bolsonaro pediu a garantia de que concorrerá à Presidência, se ultrapassasse 10% das preferências, o que ocorreu neste levantamento CNT/MDA. "Ele falou que queria atingir 10%, mas eu disse: 'Se tiver em torno de 6% e você quiser sair, está garantido'. Todo mundo concordou. Na nossa pesquisa interna, no ano passado - fazemos uma a cada cinco meses - ele já tinha acima de 13%", diz.
A relação entre Bolsonaro e Everaldo Pereira chegou à tensão máxima em pelo menos dois episódios do ano passado. No primeiro, o deputado teria rechaçado aos gritos, na sede do partido no Rio, a aliança do PSC com o PCdoB, do governador do Maranhão Flávio Dino, para reeleger o prefeito da capital São Luís, Edivaldo Holanda Júnior (PDT), que ganhou a eleição. A coligação contava também com o PT, sigla do campo de esquerda do qual Bolsonaro é um inimigo histórico.
No segundo episódio, Everaldo Pereira teria repreendido Bolsonaro por impedir a ajuda da deputada Jandira Feghali (PCdoB), que é médica, quando o filho dele, Flávio Bolsonaro, passou mal durante um debate de candidatos a prefeito do Rio no primeiro turno.
"[Esse embate] é público e notório. Mas temos que olhar para frente. Estamos sempre nos encontrando, semana passada por exemplo", diz.
Questionado sobre a busca de Bolsonaro por outro partido - o parlamentar teria tido conversas com siglas como PRB, PR e DEM - Pereira é breve. "Cada um sabe da sua vida", afirma.
O dirigente diz que, em dois ou três meses, o PSC lançará um manifesto à nação, com o resultado de um trabalho de equipe para mostrar "explicitamente" o que o partido pensa. "É explicar por que é conservador, porque defende Estado mínimo, o fim do Estatuto do Desarmamento", afirma Pereira.
Ao mesmo tempo, o deputado conta que o PSC não faz investimento específico em Bolsonaro. "Ué, só receber uma pessoa e dizer que ele é pré-candidato é o maior investimento que pode ser feito", disse. Nada de recursos para viagens e palestras para divulgar o projeto presidencial pelo país, esquiva-se Pereira.
"Isso ele faz por conta própria. Não tem como disponibilizar [dinheiro]. Qualquer um tem que fazer individualmente mesmo. Colocamos as pessoas no programa partidário", diz.
Para o presidente do PSC, a população "está meio triste com o que está acontecendo no país" e prevê mais reviravoltas: "Vai acontecer algo extraordinário, de algum nome diferente, de fora [do sistema]".
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Sondagem mostra que é preciso falar sobre Bolsonaro
Por: César Felício
Pesquisa é dinâmica, e não estática, e a curva vale mais que o resultado aferido nos levantamentos. Por estas premissas são impactantes as intenções de voto para 2018 captadas pela pesquisa CNT/MDA, divulgada ontem. A sondagem indica um segundo turno entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) como um cenário possível, ainda que tenha sido uma das poucas simulações não testadas no levantamento.
Lula e Bolsonaro são os únicos citados que mostraram crescimento nas intenções de voto. O ex-presidente lidera todos os cenários, sempre com mais de 30% das indicações e com um aumento de cinco pontos percentuais, em média, em sua performance. Bolsonaro pela primeira vez ultrapasssou a barreira dos dois digitos, e, mais importante, conseguiu mais intenção de voto que Aécio Neves e Geraldo Alckmin, os hierarcas tucanos que estão em queda pronunciada no levantamento.
A ex-senadora Marina Silva (Rede) resiste em segundo lugar nas simulações, com menos de um ponto percentual de frente em relação a Bolsonaro, mas com viés de queda.
A incapacidade tucana de se firmar como opção para o antipetismo já era conhecida. Aécio perdeu em 2014 uma eleição presidencial em que o sentimento predominante no eleitorado era o de mudança. O levantamento de ontem indica algo mais: é possível que os tucanos comecem a ser contaminados pelo desgaste da administração de Michel Temer, cuja aprovação pessoal e avaliação positiva de governo, que já eram reduzidas, caíram ainda mais. Os tucanos podem estar pagando na sondagem para 2018 o preço da sociedade em um governo mal avaliado.
A perda de substância de Marina precisa ser vista com cautela. A ex-senadora gosta de jogar parada, abstendo-se pessoalmente de protagonizar o noticiário. O fato de ser de oposição, ter "recall" e não estar envolvida direta ou indiretamente no enredo da Lava-Jato pode beneficia-la adiante.
Bolsonaro subindo dá a medida do desgaste da classe política em tempos de Lava-Jato. Embora em seu sexto mandato parlamentar, o deputado é visto como um agente exterminador do sistema, um líder que virá implantar a solução final. Seu crescimento indica a desconfiança do eleitorado em relação à própria essência da democracia, que é o jogo eleitoral. Especialistas em cenários eleitorais são profundamente céticos sobre o potencial de votos de um extremista de direita como o deputado fluminense. Bolsonaro não dialoga com os desiludidos do petismo, um contingente importante. Mas a fase de considerá-lo folclórico passou. Em um cenário de alta fragmentação, o sarrafo para se passar ao segundo turno é muito pequeno. É necessário começar a avaliar a sério o crescimento de Bolsonaro nas pesquisas, discutir seus fundamentos e projetar seu desempenho em um eventual duelo contra Lula.
A fortaleza de Lula parece estar mais na economia do que na política. Há um consenso de que a nostalgia embala a recuperação de sua imagem. O pesquisado quer voltar a anos gloriosos como o de 2010, em que tudo parecia conspirar a favor do crescimento da renda da população mais pobre e de um maior dinamismo da economia movido pelo incremento do consumo. Os cinco processos em que é réu por corrupção não brecam a saudade pela Idade do Ouro.
Curioso é o protagonismo de duas candidaturas que podem não se concretizar em 2018. A de Lula corre imenso risco de ser vitimada pela lei que exige cumprimento imediato de sentença após condenação por órgão colegiado. A de Bolsonaro porque o deputado de extrema-direita depende da bondade dos estranhos. Não criou um partido para si, como fez Marina Silva, e fica nas mãos de caciques de legendas que só estão interessados no potencial do deputado para ser um chamariz de votos nas eleições proporcionais. Há notícias de que o perfil intolerante do parlamentar deve tornar difícil qualquer conversa com partidos que lhe garantam audiência mínima na televisão.