Temer recria ministério e dá foro a Moreira 
Catarina Alencastro e Eduardo Barreto 
03/02/2017
 
 
Amigo de presidente, peemedebista é citado em delação da Odebrecht; PSDB se fortalece com duas pastas

-BRASÍLIA- Empossado com o discurso da austeridade, o presidente Michel Temer, que ao assumir cortou sete ministérios, resolveu recriar ontem mais uma pasta e criar outra: o ministério dos Direitos Humanos e a Secretaria Geral. Esta última será ocupada pelo secretário-executivo do Programa Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco, que foi citado em delações da Odebrecht e agora passará a ter foro privilegiado. Em março passado, dois meses antes do impeachment, a ex-presidente Dilma Rousseff foi duramente criticada pela oposição por nomear para seu ministério o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, igualmente investigado na operação, uma vez que isso lhe daria foro privilegiado.

Para os Direitos Humanos assumirá a desembargadora aposentada Luislinda Valois, filiada ao PSDB. Ela será a segunda mulher e a primeira negra na Esplanada, sob Temer. A partir de agora, o governo passa a ter 28 ministérios, apenas quatro a menos do que o formato herdado de Dilma.

Ironicamente, horas antes de o governo anunciar o aumento do desenho ministerial, a redução das pastas foi citada na mensagem ao Legislativo enviada por Temer durante a abertura dos trabalhos do Congresso, no capítulo de “modernização do Estado”.

Temer também anunciou a ida do ex-líder do PSDB Antonio Imbassahy para a Secretaria de Governo, no lugar de Geddel Vieira Lima, que deixou o governo no fim de novembro passado, após ser acusado de tráfico de influência. O presidente só fez a nomeação horas depois de resolvida a presidência da Câmara. A nomeação de Imbassahy levou todo esse tempo para ser feita porque Temer resolveu esperar o fim da eleição na Câmara e evitar ser acusado de interferência na disputa. Imbassahy chegou a se movimentar para ser candidato à presidência da Casa. A posse dos três novos ministros está marcada para hoje.

Outra mudança anunciada é na nomenclatura do Ministério da Justiça, que passa a se chamar Ministério da Justiça e Segurança Pública, sugestão trazida no início da crise penitenciária pela bancada da bala, da Câmara, cuja recomendação inicial foi a criação de um ministério exclusivo para a Segurança Pública.

Na prática, Temer já recriou duas pastas extintas por ele prório ao assumir a Presidência (Cultura e Direitos Humanos) e uma terceira, extinta em outubro de 2015 pela petista Dilma Rousseff (a Secretaria Geral). Com a nova configuração, que será publicada no Diário Oficial de hoje, o presidente tem um governo com apenas quatro ministérios a menos do que o de sua antecessora.

Sob Temer, a Secretaria Geral, criada pelo ex-presidente Lula, abrigará, além do PPI, a Secretaria de Comunicação (Secom), o cerimonial e a administração da Presidência da República. O presidente ensaiava desde que assumiu definitivamente a Presidência, em agosto, elevar Moreira ao primeiro escalão do governo. Com o status de ministro, Moreira só poderá ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

— Suas tarefas estarão voltadas para dar apoio às ações do Presidente da República e conferir maior agilidade ao funcionamento do Palácio do Planalto em suas ações de governo e de atuação presidencial — disse o porta-voz, Alexandre Parola, sobre as novas atribuições de Moreira Franco.

Luislinda Valois comandava, desde o início do governo Temer, em junho, a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), subordinada ao Ministério da Justiça. Segundo Temer, as mudanças têm o “objetivo de aprimorar as condições de governança, buscar maior eficiência e melhorar a gestão pública”.

RESISTÊNCIA NO PMDB A FORTALECIMENTO TUCANO

A reestruturação da Esplanada muda o equilíbrio de forças partidárias do governo, fortalecendo os tucanos. O PMDB passa a ter seis ministérios, apenas um a mais do que o PSDB, com cinco. Na legenda do presidente avolumam-se reclamações de que ele resolveu entregar o governo aos tucanos. A Secretaria de Governo é considerado o centro nervoso do Palácio do Planalto, uma espécie de balcão de negócios onde se fecham cargos, indicações, liberações de emendas.

Um ministro peemedebista descreve a opção de Temer por Imbassahy como “imprudente”. Para ele, o presidente comete o mesmo erro que a ex-presidente Dilma Rousseff, de terceirizar o poder a alguém de fora de seu núcleo político-partidário.

— A jogada do presidente é imprudente. Não há tentativa de terceirização do Poder que dê certo. Para esse função tinha que escalar um dos seus. Só quem vai respeitar o Imbassahy como secretário de governo vai ser o próprio PSDB. Ninguém mais vai tratar de cargo com ele — antevê o ministro.

Diante dessas resistências, uma das teses que vêm sendo discutidas é que Imbassahy mantenha parte da equipe deixada por Geddel Vieira Lima, como o chefe de gabinete, Carlos Henrique Sobral. Outro ponto que acende o sinal vermelho entre auxiliares de Temer é que, com a entrada de Imbassahy no Planalto, o senador Aécio Neves passa a ter um gabinete no núcleo do Poder para pavimentar a sua candidatura à presidência em 2018. Esse espaço seria particularmente estratégico para Aécio neste momento em que perdeu força no ninho tucano, com o fortalecimento pós-eleições municipais de seu rival na disputa interna Geraldo Alckmin.

— O Imbassahy no Planalto é a boia de salvação do Aécio. Ele busca no Michel o contraponto ao poder que Alckmin tem neste momento — diz um aliado de Temer.

Quem são

SECRETARIA GERAL. Moreira Franco é um dos políticos mais próximos de Michel Temer. O peemedebista comandará, além do PPI, a Secretaria de Comunicação (Secom), o cerimonial e a administração da Presidência da República. Ele é citado em delação da Odebrecht

DIREITOS HUMANOS. Ministério será comandado pela desembargadora aposentada Luislinda Valois. Filiada ao PSDB, ela será a segunda mulher e a primeira negra na Esplanada. O ministério existia no governo Lula, foi extinto e, agora, recriado

SECRETARIA DE GOVERNO. O comando da pasta de articulação política com o Congresso será do tucano Antonio Imbassahy, da Bahia. Ele assume a vaga de Geddel Vieira LIma, que saiu do governo sob acusação de tráfico de influência. Imbassahy sofre resistência de setores do PMDB, dentro e fora do governo

 

O globo, n. 30496, 03/02/2017. País, p. 5