Valor econômico, v. 17, n. 4201, 22/02/2015. Brasil, p. A2
Por: Ribamar Oliveira
A aceitação do acordo de recuperação fiscal do Rio de Janeiro pela União só ocorrerá após a aprovação do projeto de lei que institui o novo regime pelo Congresso Nacional, informou ontem fonte credenciada. Depois disso, o governo fluminense terá que comprovar que aprovou todas as medidas de ajuste fiscal que negociou com o governo federal, inclusive a que prevê a elevação para 14% da alíquota previdenciária dos servidores ativos e inativos e a autorização para a privatização da Cedae.
Após o Rio formalizar o seu pedido de ingresso no regime de recuperação, o Ministério da Fazenda terá que verificar se as leis com as medidas de ajuste estão em vigor e terá o prazo de 15 dias para dizer se o programa apresentado cumpre os requisitos da nova lei de recuperação fiscal. Caso o parecer seja favorável, recomendará ao presidente Michel Temer que homologue o acordo.
A mesma fonte disse que, em janeiro, o governo não assinou um acordo de recuperação com o Rio, mas apenas um "termo de compromisso". Na ocasião, o governo federal assumiu o compromisso de encaminhar ao Congresso um projeto instituindo o regime de recuperação fiscal dos Estados e o governo fluminense assumiu o compromisso de encaminhar as propostas de ajuste fiscal à Assembleia Legislativa.
O trâmite previsto no projeto que cria o regime de recuperação fiscal dos Estados jogará o acordo da União com o Rio para, na melhor das hipóteses, maio, porque o governo espera aprovar o projeto no Congresso até meados de abril. Até lá, a Assembleia fluminense terá que aprovar todas as medidas previstas no programa de recuperação.
A fonte disse que as regras que valerem para o Rio serão as mesmas aplicadas a qualquer Estado que deseje ingressar no programa de recuperação fiscal. Essa sistemática só será alterada se o Supremo Tribunal Federal (STF), onde existe um pedido do governo do Rio de Janeiro para que sejam antecipados os efeitos do acordo da União, decidir de forma diferente.
Embora mantenha a essência da proposta aprovada originalmente no Senado, no ano passado, e que foi barrada pela Câmara dos Deputados, o novo projeto de lei que institui o regime de recuperação fiscal dos Estados retirou do texto pelo menos dois pontos polêmicos.
Não consta da nova versão, por exemplo, a postergação dos efeitos financeiros das vantagens, aumentos, reajustes ou adequações de remuneração de membro de Poder ou de órgão, de servidores e empregados públicos e militares já concedidos e ainda não implementados.
Para excluir esse ponto, o governo considerou parecer de sua área jurídica, segundo a qual o STF já se manifestou sobre essa questão, quando julgou uma ação impetrada contra o Estado do Tocantins. O STF considerou, de acordo com o parecer, que essa postergação não pode ser feita, pois se trata de direito adquirido dos servidores.
Além disso, foi retirado do novo projeto o dispositivo que permitia, como medida para ajustar as contas, que os Estados em situação falimentar reduzissem a jornada de trabalho de seus servidores com a diminuição proporcional de salários.
A possibilidade de reduzir jornada e salários, proporcionalmente, está prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), mas o dispositivo foi suspenso por liminar do Supremo. A ação contra esse dispositivo seria julgada, com mais seis outras ações, no dia 1º de fevereiro pelo plenário do STF.
A morte do ministro Teori Zavascki, que era o relator da ação contra o dispositivo que permite reduzir jornada e salário de servidores, terminou adiando o julgamento. Como o assunto está na pauta do Supremo, o governo avaliou que o melhor é não colocar o dispositivo no novo projeto de lei e aguardar a decisão.
Foi mantido no novo projeto, no entanto, o dispositivo que institui, na prática, um teto para as despesas obrigatórias dos Estados em situação falimentar, pois elas não poderão aumentar mais do que a inflação, medida pelo IPCA, ou mais do que a variação anual da receita corrente líquida, o que for menor. Essa restrição valerá pelo tempo em que durar o regime de recuperação fiscal do Estado.
_______________________________________________________________________________________________________
Por: Estevão Taiar e Marcos de Moura e Souza
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), classificou o projeto de recuperação fiscal dos Estados, apresentado ontem pelo governo federal, como "uma medida inteligente". Para ele, além de aliviar os caixas estaduais, a proposta pode contribuir com a retomada da economia. Já o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), demonstrou não estar totalmente satisfeito com o pacote de socorro.
"É necessário; todo mundo está em situação fiscal bastante apertada: municípios, Estados e União", disse Alckmin ontem em cerimônia no Palácio dos Bandeirantes.
"O caminho é retomar o crescimento do Brasil. Não é possível que o país tenha quatro anos de economia paralisada e até em recessão", afirmou Alckmin. "Acho que é correto haver um entendimento que, de um lado, o Estado tome medidas fiscais estruturantes, e também que o governo federal dê apoio nessa fase."
Questionado se defendia a presença das contrapartidas dos Estados no projeto de lei, principal exigência do governo federal e que vem sendo contestada pelos deputados federais, Alckmin respondeu apenas que "os Estados são os maiores interessados em sanear as suas contas".
"O Rio de Janeiro, inclusive, já aprovou o primeiro projeto de lei, que era em relação a saneamento", disse, em referência à aprovação da privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) ontem pela Assembleia Legislativa fluminense.
Fernando Pimentel criticou as contrapartidas exigidas pela União e disse que não pretende privatizar a estatal de energia elétrica Cemig ou outras empresas.
Assim com o Rio de Janeiro, Minas está em situação de calamidade financeira e tem déficit orçamentário desde 2014. Há um ano, parte dos servidores recebe seus salários parceladamente, embora sempre dentro do mês. A crise mineira é menos severa que a do Rio de Janeiro e não produziu até agora protestos ou paralisações.
Em evento com os bombeiros, Pimentel disse que o projeto de lei que define as condições do ajuste nos Estados possui "contrapartidas duríssimas para com os serviços públicos". Uma delas é a obrigação dos Estados de privatizar ativos. "Como se isso fosse uma receita milagrosa: está faltando comida em casa, então venda o fogão".
O governador citou que empresas públicas mineiras estão melhorando. E afirmou: "Cemig, Copasa (saneamento), Codemig (de participações variadas) e outras. Iríamos privatizar para quê? Qual é o objetivo dessa pressão para que o Estado venda suas empresas mais eficientes mais poderosas para resolver um problema que eu tenho certeza que nós podemos resolver ao longo do tempo se houver alguma boa vontade do setor financeiro do governo federal?"
Pimentel prometeu que vai mobilizar aliados para alterar esse projeto na Câmara.
O governador mineiro repetiu que não fará ajuste que implique redução de direitos já concedidos a servidores. E destacou os direitos de policiais militares e civis.
"Nosso compromisso não é com o Orçamento é com o povo. Nós não queremos contas públicas desequilibradas. Herdamos um déficit enorme estamos fazendo de tudo para reduzi-lo, mas não podemos e não vamos admitir a redução do déficit às custas dos serviços público", afirmou.
Numa menção ao Rio, Pimentel disse que o Estados fortes e poderosos estão "se dissolvendo à luz do dia, com serviços públicos entrando em colapso".
"Equilibrar as contas públicas é mais que necessário, é um objetivo nosso e nós estamos conseguindo equilibrar. Nós estamos reduzindo o nosso déficit a cada virada de ano, mas sem atingir nenhum dos direitos dos servidores públicos."