Alckmin responsabiliza governo federal por trava a investimentos

Fernando Taquari e Fabio Garner

18/02/2017

 

 

O governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), se prepara para responsabilizar a União pela queda nos investimentos realizados pelo Estado nos últimos dois anos. O governo federal, segundo documento elaborado pela Secretaria de Fazenda paulista, representa uma "trava" e um "obstáculo" ao aumento da capacidade de aportes de São Paulo. A administração estadual pressiona o Ministério da Fazenda pela revisão dos critérios para "rating" dos Estados.

A mudança de critério é uma demanda antiga de Alckmin que, cotado para concorrer à Presidência da República em 2018 pelo PSDB, trabalha para encerrar seu mandato em alta. O governo paulista queixa-se de que a metodologia adotada pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) não leva em conta a "boa situação financeira" do Estado em meio a um cenário de crise e recessão no resto do país.

"Os investimentos do governo paulista poderiam ser ainda maiores se não fosse essa metodologia heterodoxa que leva a uma visão distorcida do Tesouro Nacional. Com uma avaliação ruim, São Paulo fica sem aval para contrair novos empréstimos para tocar obras necessárias à população em áreas como infraestrutura", afirma Hélcio Tokeshi, secretário estadual de Fazenda.

Em 2016, os aportes realizados pelo governo estadual, considerando recursos de empresas estatais não dependentes, como Metrô, Sabesp e CDHU, totalizaram R$ 15,3 bilhões, menos do que os R$ 16 bilhões e os R$ 21 bilhões investidos em 2015 e 2014, respectivamente. Alckmin é um dos presidenciáveis do PSDB e conta com um ambicioso programa de investimentos em infraestrutura para se viabilizar. "O rating do Tesouro Nacional é um obstáculo para os investimentos por não ser uma régua que meça até que ponto cada Estado pode receber de financiamento", diz Tokeshi.

O tema deve ser discutido nesta terça-feira em uma reunião convocada pelo Tesouro Nacional com secretários estaduais de Fazenda, de acordo com Tokeshi. Os Estados defendem que as novas regras levem em conta a realidade fiscal dos entes federados.

"Ao contrário da metodologia adotada pelas agências internacionais, que incluem critérios quantitativos, qualitativos e projeções de médio e longo prazo, o Tesouro realiza apenas uma análise quantitativa que considera os três últimos exercícios, dando pouco peso à geração de receita e à capacidade de pagamento", argumenta o secretário.

No documento da Fazenda, a secretaria ainda afirma que o critério atual não permite que o governo paulista possa realocar recursos já contratados em outros financiamentos. "A consequência dessa postura irredutível pode causar a interrupção das obras importantes que já começaram e por isso foram priorizadas por São Paulo", diz o texto, sem especificar quais os empreendimentos estariam sob risco.

O Tesouro Nacional classifica os Estados com notas que variam de A a D e servem como referência para operações de crédito. A concessão de empréstimos, por exemplo, fica restrita aos entes cuja nota seja A ou B. Pela metodologia usada hoje, São Paulo aparece na categoria C -, usada para entes que apresentam alto risco de inadimplência. Tokeshi, no entanto, cita a agência de risco Standard and Poor's como argumento para defender a revisão dos critérios.

A S&P classificou o Estado como BB + em seu último relatório, divulgado no último dia 10. A nota está acima do teto do Brasil, que é BB. Na ocasião, a agência ressaltou que São Paulo mantém um desempenho forte, apesar da recessão no país, e que o Estado paulista teria melhor resultado em sua avaliação se não fosse limitado pelo rating nacional.

A assessoria do Ministério da Fazenda disse que o período de consulta pública para o novo modelo de classificação de risco para concessão de garantias do Tesouro começa em março e deve durar 30 dias. Essa proposta para um novo sistema, destaca a Fazenda, é para todos os Estados e vai considerar também a experiência internacional sobre o tema. A pasta lembra ainda que a renegociação da dívida com todos os Estados no ano passado deu para São Paulo um alívio de R$ 18,7 bilhões para um período de 24 meses.

No final do ano passado, a secretária do Tesouro, Ana Paula Vescovi, disse que a consulta pública para a mudança no critério de rating sairia em janeiro. Uma das ideias que estariam na proposta era premiar Estados que fazem ajuste fiscal, dando um bônus na concessão da nota. Um dos problemas que atrasou o processo, segundo fontes da área técnica, foi o agravamento da crise do Rio de Janeiro e as decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) impedindo a execução das contragarantias nas operações em que a administração fluminense deu calote e o Tesouro foi forçado a honrar.

A decisão elevou muito o grau de incerteza sobre o sistema de garantias, já que o STF, por meio de liminar, estava impedindo a execução de um contrato em vigor. Com isso, o Tesouro deixou o tema da reformulação do sistema de garantias interrompido até ter um encaminhamento mais claro sobre a discussão com o Rio e o STF. Na última quinta-feira, o órgão anunciou que pretende dar garantia de até R$ 17 bilhões em operações de crédito a Estados e municípios.

 

 

Valor econômico, v. 17, n. 4199, 18/02/2017. Política, p. A6.