O Estado de São Paulo, n. 45056, 25/02/2017. Economia, p. B6

Câmara resiste a contrapartidas de Estados em acordo

 

Igor Gadelha

 

O governo enfrentará obstáculos da oposição e até da base aliada para aprovar na Câmara o projeto que cria o novo programa de recuperação fiscal para Estados. A principal resistência, segundo líderes partidários ouvidos pelo Estado, será aprovar as contrapartidas exigidas dos Estados em troca da suspensão do pagamento das dívidas com a União.

Líderes aliados e opositores argumentam que o Congresso não pode aprovar contrapartidas iguais para os Estados. Para esses deputados, se o Ministério da Fazenda insistir nesse ponto, o projeto poderá ser desfigurado na Casa. Eles defendem a aprovação de regras gerais para os acordos e uma regulamentação posterior, caso a caso, das contrapartidas.

Segundo o projeto enviado à Câmara, para fechar o acordo de suspensão do pagamento de dívida com a União por três anos, prorrogáveis por mais três, Estados terão de cumprir exigências como aprovar uma lei autorizando a privatização de empresas dos setores financeiros, de energia e saneamento.

“Não tem como trabalhar os Estados de forma igual. Engessar isso e não abrir o diálogo vai ser muito complicado”, afirmou Aureo Ribeiro (RJ), líder do Solidariedade, partido aliado. Para ele, o ideal seria aprovar apenas a parte da suspensão da dívida, “e depois regulamentar (as contrapartidas por Estado)”. A Fazenda, contudo, não abre mão de aprovar as contrapartidas com o projeto.

Segundo o líder do PP, Arthur Lira (AL), a resistência deve ser maior em contrapartidas que os deputados acreditam ser função das Assembleias, como a que exige o aumento da contribuição previdenciária dos servidores.

“Acho as contrapartidas corretas. Só tenho dúvida se precisa estar no texto da lei ou não”, disse ao Estado o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Partidos da oposição são contra, principalmente, as privatizações. “O correto é o governo renegociar a dívida estabelecendo as contrapartidas de comum acordo”, disse o líder do PT, Carlos Zarattini (SP).

Favoráveis. Na base aliada, porém, há quem defenda a medida. “A predisposição do PMDB é encaminhar favoravelmente ao projeto com contrapartidas”, disse Baleia Rossi (SP), líder da sigla na Câmara. “O governo não pode, a cada dor de barriga que os Estados tiverem, ajudar. Não pode simplesmente dar dinheiro aos Estados, sem contrapartida. Senão, em dois anos vão estar de volta”, afirmou a líder do PSB, Tereza Cristina (MS). Para o líder do PSDB, Ricardo Tripoli (SP), não tem como aprovar o projeto sem contrapartidas iguais para os Estados. Ele acredita que estabelecer regras diferentes pode levar à judicialização dos acordos.

 

Compensação

“O governo não pode, a cada dor de barriga que os Estados tiverem, ajudar. Não pode simplesmente dar dinheiro aos Estados.”

Tereza Cristina (MS)

LÍDER DO PSB NA CÂMARA

 

PROJETO

Principais contrapartidas exigidas pela União

 

-Privatização

Aprovação pelas Assembleias Legislativas de lei autorizando a privatização de empresas dos setores financeiros, de energia e saneamento

 

-Passivos

Recursos de vendas de estatais devem ser destinados para quitação de passivos dos Estados

 

-Benefícios tributários

Redução de pelo menos 20% ao ano de incentivos ou benefícios de natureza tributária em que houve renúncia fiscal do Estado

 

-Contribuição

Elevação da alíquota de contribuição da Previdência de servidores estaduais para 14%

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Lucrativa, Cedae tem potencial de atrair investidores

 

Vinicius Neder

 

Segundo Fernando Marcato, sócio da consultoria GO Associados, entre as empresas que atuam nas concessões de saneamento, o fundo canadense Brookfield (que em outubro comprou 70% da Odebrecht Ambiental por R$ 2,5 bilhões) e a Aegea (do grupo Equipav, de Campinas, em sociedade com o GIC, o fundo soberano de Cingapura, e o IFC, fundo do Banco Mundial) são consideradas as mais capitalizadas para aquisições. “Comenta-se que a Brookfield teria R$ 10 bilhões em dinheiro próprio para investir”, afirmou Marcato.

A Águas do Brasil, concessionária dos serviços de coleta e tratamento de esgoto na zona oeste do Rio, estaria posicionada para levar a Cedae, mas seus principais acionistas (as construtoras Carioca Engenharia e Queiroz Galvão, citadas na Lava Jato) podem ter dificuldade em levantar capital, disse Marcato. Corre por fora a GS Inima controlada pela construtora coreana GS.

Em 2015, a receita da Cedae foi de R$ 4,475 bilhões, com lucro líquido de R$ 249 milhões. Até o terceiro trimestre de 2016, teve receita de R$ 3,448 bilhões e lucro líquido de R$ 165 milhões. O serviço de água tratada chega a 86,95% dos moradores da área atendida, mas os índices de atendimento de esgoto (38,87%) e de perdas de faturamento (52,4%) estão abaixo da média nacional, segundo a GO Associados.

Conforme a lei aprovada na Alerj, o governo tem seis meses, prorrogáveis por mais seis, para contratar as “instituições financeiras federais” para estruturar a venda. A participação do BNDES é incerta, após divergências com o governo fluminense.