Trump aumentará deportações de imigrantes ilegais sem ficha criminal

Cláudia Trevisan

22/02/2017

 

 

Imigração. Governo endurece regras de expulsão, que na administração anterior miravam primeiro os autores de crimes e os flagrados ao cruzar a fronteira; não correm risco os que chegaram aos EUA quando crianças e alguns pais de cidadãos americanos

 

 

Donald Trump ampliou ontem o universo de imigrantes ilegais que podem ser deportados ao revogar diretrizes do governo de Barack Obama que davam prioridade aos que haviam cometido crimes graves ou sido pegos ao cruzar a fronteira ilegalmente. Os únicos grupos poupados pelas novas regras são os que chegaram aos EUA quando eram criança e alguns dos pais de cidadãos americanos ou de residentes legais no país.

As medidas expandem o uso da “remoção acelerada”, pela qual estrangeiros são expulsos do país imediatamente, sem serem ouvidos por um juiz de imigração.

O procedimento passará a ser aplicado aos que estão nos EUA de maneira ininterrupta por um período inferior a dois anos. Atualmente, a remoção acelerada é usada para os apreendidos em uma distância de até 160 km da fronteira que tenham ingressado no país nos 14 dias anteriores à detenção.

A lista das prioridades que deverão ser obedecidas pelos agentes de imigração é ampla o bastante para atingir a maioria dos que vivem nos EUA sem documentos.

Além dos condenados pela prática de qualquer delito, elas abrangem os que estão sendo julgados e os que tenham praticado atos que “podem” constituir crime. Não há distinção entre delitos graves e os de menor potencial ofensivo.

As novas diretrizes afetam ainda os que tenham praticado fraude ou dado informações falsas a agências governamentais, tenham abusado do recebimento de benefícios públicos, sejam objeto de uma ordem final de remoção do país ou representem um risco à segurança nacional, de acordo com o julgamento do oficial de imigração. Em geral, a orientação diz que todos aqueles que violem as leis de imigração estão sujeitos a prisão, detenção e remoção do país.

Cerca de 11 milhões de estrangeiros vivem de maneira irregular nos EUA. Muitos fornecem dados falsos para obter o registro de Seguridade Social, o que facilita sua contratação por empresas e permite que eles paguem impostos. O governo estima que 3,1 milhões de imigrantes sem documentos recolham cerca de US$ 12 bilhões em tributos a cada ano.

Continuará em vigor a diretriz de Obama que suspende as deportações dos que entraram nos EUA quando tinham menos de 16 anos, um programa conhecido pela sigla Daca. Essa medida tem sido renovada periodicamente e não está claro se será estendida em novembro, quando perde sua validade. A diretriz também protege de deportação adultos que sejam pais de cidadãos ou residentes legais nos EUA que tenham entrado no país após janeiro de 2010.

Com 40 anos de experiência em imigração, o advogado Carl Shusterman disse nunca ter visto medidas tão extremas. Para ele, o governo tentará realizar deportações em massa e ampliará o número de pessoas que ficam presas à espera de decisão.

Segundo ele, as novas medidas levarão à separação de famílias e à perda de empregados em fábricas, fazendas, hotéis e restaurantes.

“As leis migratórias não estão em sintonia com a realidade econômica do país”, disse.

“Os cidadãos americanos se beneficiam do trabalho de imigrantes sem documentos, que são contratados para trabalhar como faxineiros, babás e jardineiro.

É difícil ir a um restaurante em que imigrantes não estejam entre os cozinheiros ou os que servem as mesas.”

A deportação de imigrantes em situação irregular e a construção de um muro na fronteira do México foram duas das principais promessas de campanha de Trump. Quando lançou sua candidatura às primárias do Partido Republicano, ele disse que retiraria do país todos os 11 milhões de estrangeiros sem documentos.

No fim do ano passado, ele reduziu o número para algo entre 2 milhões e 3 milhões de pessoas.


PERGUNTAS & RESPOSTAS

 

  1. 1. O efeito é imediato?

A aplicação de muitas das medidas depende do Congresso, de um período de discussões públicas ou de negociações com outros países. Uma parte do plano, que manda agentes aumentarem o número de imigrantes deportados sem serem ouvidos, deve ser submetida a mais debates.

 

  1. 2. O tempo de permanência nos EUA é levado em conta?

Sim. Quem não possa comprovar ter vivido no país por mais de 2 anos está sujeito a uma “remoção rápida”. Hoje, apenas os imigrantes detidos em uma faixa próxima da fronteira que não comprovem estar no país há mais de 14 dias estão sujeitos a essa forma de deportação.

 

  1. 3. Há diferenças por países de origem?

O texto planeja devolver ao México os imigrantes não mexicanos que atravessarem para dentro dos EUA pela fronteira enquanto ainda aguardavam decisão sobre seus casos. Isso depende de parceria com o governo mexicano e não será adotado rapidamente.

 

O QUE MUDA

 

Como era com Obama

 

Nos primeiros anos de governo, Obama adotou uma linha dura em relação a deportações, na esperança de que ajudasse a aprovação da reforma migratória no Congresso

A proposta abria caminho para a cidadania de muitos que vivem de maneira irregular no país

Quando a reforma naufragou, em 2014, Obama restringiu as deportações e estabeleceu prioridades para a ação da imigração

 

O foco principal era

 

Deportar estrangeiros envolvidos em crimes ou que representassem algum tipo de ameaça à segurança nacional

Imigrantes apreendidos na fronteira que tentavam entrar ilegalmente no país

Também entraram na lista os condenados por delitos que envolveram a participação de gangues, os condenados por crimes graves, incluindo assassinato, estupro, tráfico de drogas e de armas, corrupção, roubo, exploração da prostituição

Obama suspendeu a deportação de imigrantes que entraram no país quando tinham menos de 16 anos e os pais de cidadãos ou residentes legais que ingressaram nos EUA depois de janeiro de 2010

 

Como fica com Trump

 

As novas regras dizem que nenhum grupo de imigrantes estará isento da possibilidade de deportação. Todos os que violem as leis de imigração dos EUA estarão sujeitos a detenção e remoção do país

Os únicos grupos excluídos do risco de deportação são imigrantes que entraram no país com menos de 16 anos e os pais de cidadãos ou residentes legais que ingressaram nos EUA depois de janeiro de 2010

Apesar de dizer que nenhum grupo está isento, as novas regras também estabelecem prioridades para a ação de agentes de imigração

 

O foco principal será sobre

 

Condenados por qualquer crime, os que estão sendo processados por cometer crimes e os que praticaram qualquer ofensa criminal

Os que tenham praticado fraude ou dado informações falsas na relação com agências governamentais

Os que cometeram abusos no recebimento de benefícios públicos

Os que são alvo de ordem final de remoção dos EUA

Os imigrantes que representam um risco à segurança nacional na avaliação de agentes de imigração

 
 
O Estado de São Paulo, n. 45053, 22/02/2017. Internacional, p. A10.