O Estado de São Paulo, n. 45054, 23/02/2017. Política, p. A4

TSE vai ouvir Odebrecht na ação da chapa Dilma-Temer

Relator no tribunal decide utilizar delação e Janot dá aval para que herdeiro do grupo e outros quatro ex-executivos prestem depoimentos no processo

Por: Rafael Moraes Moura e Beatriz Bulla

 

O ministro Herman Benjamin, relator da ação que investiga a chapa presidencial de 2014 formada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e pelo presidente Michel Temer (PMDB) no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), decidiu incluir a delação da Odebrecht no processo e ouvir três exexecutivos da empreiteira. O herdeiro do grupo, Marcelo Odebrecht, e mais dois ex-diretores da empresa serão ouvidos na quarta-feira de cinzas, dia 1º de março, em Curitiba.

A ação, proposta pelo PSDB, pode gerar a cassação do mandato de Temer e a inelegibilidade do peemedebista e de Dilma. A Justiça Eleitoral investiga se houve abuso de poder político e econômico na campanha de 2014.

Diante da divulgação de notícias sobre a delação da empreiteira que envolvem a última disputa presidencial, Benjamin decidiu ouvir os ex-executivos da empreiteira.

Além de Marcelo Odebrecht, prestarão depoimento na próxima semana os ex-diretores de relações institucionais Cláudio Melo Filho e Alexandrino Alencar.

Em parecer, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deu aval para que sejam ouvidos delatores da Odebrecht pela Justiça Eleitoral e ainda sugeriu ao ministro do TSE nomes de representantes da empreiteira que prestaram informações que podem ter relação com o caso.

Foi Janot quem apontou o nome de Alexandrino Alencar, por exemplo, e também indicou que as revelações de Benedicto Júnior e Fernando Cunha Santos Reis têm relação com a investigação no TSE. No caso dos dois últimos não há data prevista para depoimento.

O Estado revelou que a Odebrecht deu, via caixa 2, cerca de R$ 30 milhões para a chapa Dilma- Temer em 2014. Os recursos, segundo os delatores, foram usados para comprar apoio de cinco partidos: PRB, PROS, PcdoB, PP e PDT. O bloco garantiu maior tempo de TV na campanha à coalizão governista.

O ministro da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Marcos Pereira, é citado na delação de Alexandrino como um dos que negociou repasse de R$ 7 milhões do caixa 2 da empresa para o PRB. Pereira nega.

Melo Filho descreveu em anexo de delação premiada um jantar no Palácio do Jaburu no qual Temer solicitou auxílio financeiro para campanhas do PMDB em 2014. O pedido foi feito, segundo o delator, a Marcelo Odebrecht, que se comprometeu com um repasse de R$ 10 milhões.

Alexandrino, além do cargo de diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, também ocupou o posto de vice-presidente da Braskem – braço petroquímico da empreiteira em sociedade com a Petrobrás.

 

Sigilo. Ao dar parecer favorável aos os depoimentos da Odebrecht, Janot destacou que os delatores podem figurar como testemunhas na Justiça Eleitoral, mas os depoimentos devem ser mantidos em sigilo. “Ao decidir colaborar com a Justiça, o colaborador está saindo da condição de criminoso e, por meio de um permissivo legal, se colocando à disposição do Estado para revelar todos os fatos ilícitos de que tem conhecimento, em troca de um benefício penal.

Essa condição de colaborador não pode se dar de forma parcial.

Vale dizer, a colaboração deve ser integral”, escreveu.

Para advogados com acesso ao caso, a inclusão da delação da Odebrecht na ação do TSE tem dois efeitos: as revelações podem complicar a situação de Temer e também adiar ainda mais o desfecho do caso na corte eleitoral. Reservadamente, aliados do Planalto consideram que a defesa do peemedebista vai trabalhar para que o caso não seja julgado em 2017, com pedido de inclusão de testemunhas para rebater a fala dos delatores. Com isso, um eventual julgamento ocorreria no último ano do mandato de Temer, o que é considerado um fator que pode sensibilizar os ministros do TSE para evitar a cassação do mandato do peemedebista.

 

Relator. Ministro Herman Benjamin, do Tribunal Superior Eleitoral, durante a sabatina de Alexandre de Moraes no Senado

 

AS CITAÇÕES

Pedido

Após perder a eleição presidencial, em 2014, com o senador Aécio Neves (MG) como candidato, PSDB entra com ação no TSE para pedir a cassação da chapa Dilma Russeff-Michel Temer.

 

Poder econômico

Ação investiga suposto abuso de poder político e econômico na disputa de 2014. Processo pode gerar inelegibilidade de Dilma e perda do mandato de Temer.

 

Foco

Até agora, foco da ação foram supostas irregularidades cometidas na contratação de gráficas pela equipe da campanha. Relator da ação no TSE vai incluir delação da Odebrecht no processo.

 

R$ 10 mi é o valor que, segundo delação do ex-executivo da Odebrecht Cláudio Melo Filho, o presidente Michel Temer teria pedido a Marcelo Odebrecht em 2014, e repassado ao atual ministro Eliseu Padilha (Casa Civil), e ao ex-assessor especial da Presidência José Yunes

 

R$ 30 mi é o valor que, segundo delação de ex-executivos da Odebrecht, como Alexandrino Alencar, a empreiteira teria doado ilegalmente à campanha da coligação “Com a Força do Povo”, que reelegeu Dilma Rousseff e Michel Temer em 2014

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Defesa da petista diz que não tem receio da decisão

Por: Rafael Moraes Moura e Beatriz Bulla

 

A defesa da ex-presidente Dilma Rousseff afirmou em nota divulgada ontem que não tem “nada a temer” com a decisão do ministro Herman Benjamin, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de ouvir delatores da Odebrecht no âmbito do processo que investiga a chapa reeleita em 2014.

Procurado, o Palácio do Planalto informou que não se manifestará sobre o assunto. A defesa do peemedebista também não se manifestou.

“Não vemos problemas na iniciativa. Não temos nada a temer, porque temos o compromisso com a verdade. A decisão proferida pelo ministro Herman Benjamin, do Tribunal Superior Eleitoral, não causa qualquer surpresa. Todos aqueles que fizeram delação premiada, já foram ouvidos no processo”, diz a nota, assinada pelo advogado Flávio Caetano, defensor da presidente cassada no TSE.

Para Caetano, tanto a defesa de Dilma quanto o TSE têm o interesse de que “a verdade seja trazida aos autos, demonstrando a lisura do processo eleitoral”.

“A posição da defesa da presidenta tem sido a de colaboração com a Justiça Eleitoral. Foi assim, por exemplo, quando demonstramos, por documentos, que o empresário Otávio Azevedo, da Andrade Gutierrez, havia mentido em seu depoimento ao TSE”, conclui a nota. / R.M.M e B.B